08 abril 2013

10% das dívidas aos condomínios já não são recuperáveis


Dívidas acumulam-se, dos bairros sociais aos condomínios de luxo. Representantes do sector estimam que valores vencidos ascendam a "várias centenas de milhões de euros" e que entre 5% e 10% sejam já irrecuperáveis.

Famílias afectadas pelo desemprego, imóveis penhorados pela banca, proprietários que fecham a porta de casa e vão trabalhar para o estrangeiro.

Os exemplos são muitos e justificam, no período de crise que o País atravessa, o facto de os condomínios registarem um número cada vez maior de dívidas incobráveis, cujos valores já muito dificilmente conseguirão reaver. Pelas contas da Associação Portuguesa de Empresas de Gestão e Administração de Condomínios (APEGAC), entre 10% a 15% dos condóminos não paga atempadamente e neste momento há "várias centenas de milhões de euros de dívidas acumuladas". Destas, entre 5% e 10% estarão já dadas como incobráveis.

Se é certo que os atrasos dos condóminos são desde sempre habituais, a crise financeira veio "agravar substancialmente essa realidade", porque "em caso de necessidade, o condomínio é uma das primeiras coisas que se deixam de pagar", refere Vítor Amaral, presidente da direcção da APEGAC. E agora, em muitos casos começa mesmo a ser impossível recuperar de todo as dívidas vencidas. O problema é transversal, ou seja, "tanto o detectamos em bairros sociais, como em condomínios de luxo", afirma o responsável.

Luís Carvalho Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), acrescenta que se é certo que há incumprimento na área habitacional, o fenómeno começa a acentuar-se ainda mais nos condomínios de comércio e serviços, onde se acumulam as lojas e escritórios fechados. "Os proprietários perdem os seus rendimentos e deixam de poder pagar o condomínio, é um círculo vicioso", explica.
Em caso de necessidade, o condomínio é das primeiras coisas que se deixam de pagar. 10% a 15% não pagam atempadamente. Vítor Amaral Presidente da APEGAC O não pagamento do condomínio não acarreta consequências imediatas, ou seja, "nem a luz, nem a água, nem o elevador deixam de funcionar, por isso os proprietários vão deixando arrastar", diz Vítor Amaral.

Em 6.500 condomínios, dois milhões de euros em atraso

A empresa de Vítor Amaral, que opera nos distritos do Porto e Aveiro, representa cerca de 300 condomínios, o correspondente a 6.500 condóminos. Neste universo, regista "qualquer coisa como dois milhões de euros de dívidas vencidas, das quais mais de metade só se consegue recuperar em tribunal".

Transpondo esta realidade para as 180 empresas associadas da APEGAC, "mesmo admitindo que em média cada uma tem um milhão de euros de pagamentos em atraso, já seriam 180 milhões", estima o responsável. Por outro lado, há a ter em conta o facto de haver muitas outras entidades a fazer gestão de condomínios, nomeadamente contabilistas, advogados e solicitadores ou mesmo mediadores imobiliários. Relativamente a estas não há números concretos, o que faz supor que os valores em causa possam ser bastante mais elevados dos que estão referenciados pela APEGAC, conclui Vítor Amaral.
Os proprietários [do comércio e serviço] deixam de receber as rendas e não pagam o condomínio. É um ciclo vicioso. 

A esta realidade junta-se agora o aumento de valores já irrecuperáveis, "ainda mais preocupante", diz o responsável, que "em 20 anos de actividade", quase nunca teve incobráveis. Em muitos casos, as pessoas simplesmente desaparecem, as casas são vendidas ou penhoradas e o novo dono, por lei, não "herda" a obrigação de pagar as dívidas. 

Perante o incumprimento, e na ausência de resposta às solicitações para pagar, a solução é o tribunal. Ou para um julgado de Paz, onde geralmente o que se consegue é um acordo de pagamento, ou directamente para uma acção executiva de cobrança de dívidas, onde a fase final poderá ser a penhora do imóvel.

O aumento de dívidas, lembra Vítor Amaral, tem depois consequências na própria manutenção e conservação dos edifícios. Se os condóminos nem sequer têm dinheiro para as despesas correntes, "ainda menos o terão para obras". A lei manda que seja constituído um fundo comum de reserva equivalente a 10% do orçamento de despesas correntes, mas cada vez menos condomínios o podem fazer, sendo que a lei nada prevê em termos sancionatórios. "Nem em termos de bonificações, como chegou a acontecer no IRS e era um incentivo", remata.

E se o seu condomínio tem dívidas, o que pode fazer? Que acontece quando um condómino deixa de pagar?
Entra em incumprimento e a administração do condomínio pode avançar para tribunal. Tem cinco anos antes de a dívida prescrever, mas antes, aconselha a Associação Portuguesa de Empresas de Gestão e Administração de Condomínios (APEGAC), é conveniente tentar chegar a acordo e estabelecer com o devedor um plano de pagamentos. Mesmo que este não seja integralmente cumprido, há sempre uma parte da dívida que ainda se consegue recuperar. 

Qual o tribunal a escolher
Os conflitos de condomínios podem ser dirimidos nos Julgados de Paz, mais rápidos e mais baratos que os tribunais comuns. Neste caso, o que o juiz consegue normalmente é estabelecer um plano de pagamento para as dívidas em atraso. Se não houver acordo ou se surgir depois um incumprimento, a acção executiva em tribunal será o último recurso. 

Como se processa a cobrança executiva?
O primeiro passo é conseguir que o juiz valide a acta do condomínio onde está descrita a situação de dívida. Os tribunais podem demorar a emitir este despacho liminar, alguns até mais de um ano, sendo que entretanto a dívida continua a acumular-se mas para os novos valores será preciso nova acção executiva. Por isso, diz o presidente da APEGAC, o melhor é conseguir logo o acordo de pagamento porque, diz a lei, este dispensa o despacho liminar do juiz e permite passar logo à acção executiva.

Quem faz a cobrança?
Esta é entregue a agente de execução que avança com a cobrança. Em regra começa por penhorar salários ou pensões. Se não existirem, então serão nomeados automóveis ou outros bens móveis, tendo sempre em conta que os bens essenciais para a economia doméstica são impenhoráveis.

A casa pode ser penhorada?
Pode, mas em regra é a última opção, até por uma questão de proporcionalidade. Havendo uma hipoteca ao banco a ser executada, esta tem, em regra, um valor superior ao do prédio e como o banco é credor privilegiado, o condomínio dificilmente consegue reaver algum dinheiro por esta via. 

Fonte: Negócios

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