23 fevereiro 2014

Manuel Reis Campos: "Vai haver falta de casas daqui a quatro ou cinco anos em Lisboa e Porto"


"Vai haver falta de casas daqui a quatro ou cinco anos em Lisboa e Porto"
As necessidades de reabilitação para habitação chegam, diz a Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário (CPCI), a 26 mil milhões de euros.

Em entrevista Manuel Reis Campos, presidente da confederação, reclama linha de financiamento a particulares e incentivos ao arrendamento.

Quase um ano depois de a CPCI ter assinado com o Governo o Compromisso para a Competitividade Sustentável do Sector da Construção e do Imobiliário, está desiludido com o ritmo de implementação das 52 medidas?
Foi muito importante termos assinado o compromisso, mas acho que devia ter andado mais depressa. O Ministério da Economia tem sido mais célere do que o do Ambiente.

Quantas medidas já foram implementadas?
Até agora avançaram nove ou dez. Estamos à espera que avancem mais umas doze. Já dissemos ao secretário de Estado das Infraestruturas e ao ministro da Economia que algumas medidas são muito mais importantes do que outras, são essas que vão dinamizar o setor. Estamos a falar de alocar ao setor dinheiros do QREN que terminou em 2013, que são 2,8 mil milhões de euros. e da criação de um novo programa de financiamento de particulares para reabilitação integral de edifícios para habitação destinados a arrendamento.

Vê esse programa como essencial para dinamizar a reabilitação?
Depois da lei do arrendamento, do regime jurídico da reabilitação e da taxa liberatória, o que ainda não está implementado é a criação desse programa. Em 2014, em relação ao ano passado, já há quase mais 30% de pedidos de habitação. Sabemos que no ano passado foram construídos cerca de 6.700 fogos e, das 93 mil transações, 29 mil são de habitações novas. Ou seja, foi-se ao Stock' buscar 23 mil habitações. Calcula-se que o número de habitações novas para venda seja cerca de 120 mil, quando ainda há pouco tempo se falava em 180 ou 200 mil.

Está relacionado com os "vistos gold”?
Também. Há um conjunto de situações que tem permitido um escoamento dos ‘stocks' da habitação que tínhamos a mais: a banca já tem nos objetivos para este ano voltar a financiar; estamos a verificar que há uma correria à compra de habitações para reabilitar; e o investimento por via dos "vistos gold" já vai em 430 milhões de euros e pode chegar este ano aos 600 milhões. A reabilitação precisa hoje da criação deste programa de financiamento a particulares, que nos tinham prometido até ao fim do ano.

O Governo diz pretender elevar o peso da reabilitação na construção' em Portugal para os níveis médios europeus. O que significa isso para o sector?
A reabilitação urbana lá fora é de 36% do volume e em Portugal é de 6,7%. Se estamos a falar de 9 mil milhões de desempenho da construção, 6,7% não é nada Quando falamos em 36% é falar em 2 mil milhões de euros. Em Portugal, o que calculamos que é necessário em termos de reabilitação para habitação são 26 mil milhões de euros. Estamos afalar de 1,5 milhões de fogos que precisam de obras de reabilitação, que são 29% dos que existem. Temos reabilitação para 12 anos, a níveis interessantes para o setor, que colmatavam o investimento público que não temos.

O que é preciso para chegar aos 36%?
Precisávamos da linha de financiamento a particulares e que houvesse alguns incentivos ao arrendamento. E preciso que o arrendamento seja mais barato. É preciso que este mercado aumente e os preços desçam. Quase posso afirmar, atendendo à situação que ternos hoje no imobiliário, que daqui a quatro ou cinco anos vai haver falta de casas em determinadas zonas do país.

Porquê?
Estamos a construir muito menos: no ano passado construímos 6.700, em 2012 foram 7.900. quando em 2000 estávamos a construir 118 mil fogos por ano. O mercado de arrendamento precisa de 60 mil fogos e neste momento os 120 mil fogos que existem são essencialmente nas periferias de Porto e Lisboa. Pergunto: as pessoas querem ir para lá? Estamos condenados a que haja falta de habitação no Centro de Lisboa e do Porto. Por isso é importante que a reabilitação avance. Até porque é consensual. Não há ninguém no país que seja contra.

Que efeito teria no emprego?
Calculamos que se houver medidas na área da reabilitação e o arranque de projetos de infraestruturas, o setor possa retomar cerca de 70 mil trabalhadores. Um estudo que fizemos mostra que o dinheiro que o Estado está a pagar em subsídios a esses trabalhadores dava para fazer reabilitação.

O envolvimento da CPCI no grupo de trabalho para as infraestruturas de elevado valor acrescentado (IEVA) era outra das reivindicações... 
Essa era outra das medidas que entendemos essenciais, como também o é a internacionalização.

Ficou satisfeito com a mudança de discurso do Governo?
Tínhamos defendido o adequado planeamento e calendarização das infraestruturas e entendíamos que o país devia ultrapassar de uma vez por todas estas indefinições. Há um ano não se falava sequer em construção, hoje o trabalho das IEVA é um passo importante para que o Governo possa rapidamente tomar decisões e preparar adequadamente o novo quadro comunitário de apoio. O investimento em Portugal – que no ano passado não foi além de 1,3 mil milhões - pode ter neste momento um novo fôlego. O grupo de trabalho apontou 30 obras prioritárias, no valor de 5,1 mil milhões, mas o relatório tem 89 obras, de 13 mil milhões de euros. É importante o reconhecimento público do Governo de que no país existe um défice de infraestruturas e se assuma a necessidade de o colmatar.

O setor já fez a reestruturação?
No fim do ano passado, curiosamente, os números são menos negativos. Conseguimos diminuir ao número volumoso de desempregados 15 mil nos últimos meses. Em termos de falências, contra os 13 mil encerramentos de 2012, em 2013 calculamos que tenham encerrado 7 mil.

Já houve inversão da tendência?
Sim, o que não significa que os números sejam animadores. Vivemos uma conjuntura contraditória, os indicadores positivos anunciados ainda não se traduziram em realidades visíveis para o setor. Além do conjunto de obras que o Governo assumiu que é altura de fazer, temos números do imobiliário mais animadores. Tínhamos um ‘stock’ brutal, não tínhamos financiamento. Neste momento temos a banca a voltar a financiar, os ‘stocks’ vão baixando e há uma procura acentuada.

Fonte: Negócios

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