18 maio 2012

Opinião: Algumas ideias para a sustentabilidade do valor imobiliário

Por João Rosa*

Nos difíceis dias por que passa a nossa economia, com impacto relevante no mercado imobiliário, algumas das questões importantes são, qual é o valor dos bens imobiliários, como se pode dinamizar as fracas vendas existentes atualmente, no fundo como se podem resolver os enormes problemas que hoje se colocam aos diversos agentes do mercado.

Promotores, construtores, projetistas, mediadores e todos os outros agentes do mercado imobiliário, estão hoje à deriva, procurando um rumo, uma luz que os oriente de volta a caminhos mais estáveis e posteriormente ao sucesso.

Hoje o mercado está profundamente desequilibrado, quer na questão da dimensão e qualidade da oferta do produto imobiliário vs a necessidade real desse produto, bem como a capacidade dos potenciais utilizadores de pagar pela posse ou fruição desse mesmos bens.



Acresce que a banca que teve um papel preponderante no crescimento do mercado, com a função de financiamento, vê-se hoje na posse de um volume cada vez mais crescente de património, distorcendo a sua função de financiador, para a de proprietário com papel relevante, em concorrência com o restante mercado.

Parto da premissa que existem consumidores para parte da oferta existente, e é um facto, pois apesar da crise as pessoas vão continuar a apaixonar-se e por vezes a casarem-se, vão continuar a aborrecerem-se e por vezes a divorciarem-se, as empresas vão continuar a procurar ter sucesso e por vezes a crescerem, vão continuar a arriscarem e por vezes a falharem, ou seja, o curso normal da vida vai continuar, mesmo que com muitos mais constrangimentos.

A vida continua, as famílias e as empresas vão continuar a existir e a necessitar de património para a sua atividade. Assim uma componente importante da resolução do problema centra-se no binómio valor adequado vs financiamento.

Com o valor adequado há procura, há maior capacidade de honrar os compromissos por parte do utilizador, logo há mais sustentabilidade, menor risco no longo prazo, maior confiança no mercado.


Mesmo nos segmentos mais baixos do mercado com menor capacidade aquisitiva, desde que o preço esteja adequado, existe mercado, como demonstram os leilões imobiliários que mensalmente decorrem em Portugal.

Do lado da procura não há duvida que a questão se resolve muito por esta via. Acrescente-se à solução, flexibilidade e a confiança aumenta. Em imobiliário, isto quer dizer mais arrendamento vs menos vendas.

Do lado da oferta para esta equação ter uma resolução positiva importa distinguir dois tipos de atores.

Os atuais detentores de património em excesso, apanhados na voragem desta crise, para os quais a aplicação das receitas tradicionais do passado não vão resolver o problemas. Foram também essas receitas que contribuíram para o atual estado do mercado, ou seja, não curam, são parte da doença.

Neste caso são necessárias soluções novas, abordagens realistas que permitam maximizar o valor dos ativos imobiliários e com isso na maior parte das vezes minimizar os prejuízos que esta crise acarreta.

Neste modelo as potenciais vendas ou arrendamentos têm de estar ajustados à realidade do mercado. No caso de se optar por venda, a menos valia é assumida no imediato. No caso do arrendamento é possível ganhar mais-valias num futuro próximo, através do ajustamento progressivo de rendas mais baixas para rendas de mercado, quando a situação melhorar.

Com esta abordagem, diminui-se a desocupação dos imóveis, melhora-se no mercado a imagem do imóvel, que deixa de estar desocupado.

Acima de tudo, ganha-se valor face à situação atual de desocupação ou baixa ocupação. Na abordagem ao mercado podem-se considerar condições diferenciadas em função de taxas de ocupação crescentes.

No caso de investimento novo, é necessário mais conhecimento, qual dimensão do mercado, em que segmento de mercado está o imóvel ou fração, quais os valores sustentáveis calculados com recurso a métodos mais sofisticados de avaliação, de preferência com tratamento estatístico.

É também necessário melhorar o risco do mercado. No arrendamento para que o sucesso exista é necessário dinamizar o mercado com arrendamentos por valores adequados à capacidade das famílias, mas mais indispensável é existir uma lei do arrendamento que suporte o mercado e permita caracterizar o risco com um mínimo de rigor.

Para isso é necessário que em caso de incumprimento, o proprietário tenha mecanismos para resolver a situação num espaço de tempo curto, de preferência por negociação, mas se tal for de todo impossível, por despejo rápido é fácil. É que nunca como hoje, tempo é dinheiro e tempo sem receber, deteriora muito os cash flows de um investimento e torna-o pouco atrativo.

Para a oferta que provavelmente não terá mercado é necessário aceitar a realidade de que no paradigma atual, na perspetiva de uso continuado, o imóvel não tem valor ou tem um valor tão baixo, que é inviável a sua venda. É por isso vital pensar em outro uso, o uso alternativo e a necessidade de maior investimento para mudar o uso atual.

Também no caso de projetos novos, de reabilitação urbana estamos em presença de investimentos avultados, hoje mais difíceis devido à escassez de financiamento e/ou à crise do mercado imobiliário.

No entanto apesar do mercado estar numa fase menos feliz, há sempre mercado para produtos bons. Produtos bons em imobiliário são produtos bem pensados, bem desenhados, com uma probabilidade grande de terem clientes identificados por estudos de mercado, com valores de venda sustentados no próprio mercado, amigos do ambiente e com baixo consumo de energia. E muito mais se poderia dizer sobre projetos bons.

Como fazer projetos bons dá trabalho e custa muito dinheiro, é necessário criar um novo paradigma de diluição de risco pelos vários intervenientes do projeto, pois a figura tradicional do promotor, que corre todos os riscos, que os passa para a entidade financiadora, têm hoje mais dificuldade de materialização e a manter-se, constituirá um grande entrave à recuperação do mercado. Apenas os grandes grupos económicos tem hipótese de manter este modelo.

Ficar à espera de incentivos e apoios do estado ou organismos oficiais, é uma atitude sebastianista, cujo resultado é muito previsível e será quase de certeza insuficiente para alavancar o mercado a partir do atual estado de quase paralisia, especialmente para as PME´s que representam uma parte significativa do tecido empresarial de Portugal.

A área da construção e o mercado imobiliário, não são hoje apostas das políticas públicas, com exceção da reabilitação urbana e de políticas de arrendamento e terão de reinventar-se se quiserem manter-se em atividade.

Para projetos imobiliários de reabilitação ou construção nova, propomos um modelo de partilha de risco pelos vários intervenientes, proprietário do terreno ou imóvel a reabilitar, futuros investidores e os outros intervenientes no projeto. No fundo que sejam parceiros de negócio, uma espécie de acionistas daquele projeto/empresa.

Este modelo diminui a exposição ao mercado dos investidores, é mais atrativo, aumenta as hipóteses de financiamento e congrega esforços de vários agentes do mercado, hoje com baixa ocupação, que podem ter acesso a uma remuneração superior, de retorno mais longo mas superior e mais sustentado.

Neste modelo de atuação a componente de financiamento à construção ou à promoção poderia ser parcialmente substituído por investidores ou ainda por financiamento dos futuros ocupantes dos imóveis, com uma partilha de risco e uma maior aderência às necessidades do mercado.

Seja qual for a metodologia, penso que a necessária sustentabilidade do mercado, passa por um profundo conhecimento do mercado, isto quer dizer oferta e procura, nível de valores e caraterísticas dos imóveis valorizadas pela procura. Passa também pela diluição do risco do projeto, o que quer dizer ação conjunta dos vários intervenientes do projeto, com postecipação de resultados, mas mais sustentados e muito provavelmente de maior dimensão no longo prazo.

No fundo o que é necessário é o regresso aos fundamentais do mercado, única garantia de sucesso no longo prazo em qualquer sistema.

Há muito que a humanidade sabe que casa construída sobre rocha é solida. O conhecimento e a humildade para não nos desviarmos desse conhecimento da realidade, sem tentar subverte-la pensando que a nós nada nos acontece, só aos outros, são regras indispensáveis para o sucesso.

Criatividade e inovação, crescimento pelo saber são a chave do sucesso. Ilusão da realidade, tentar persistir nos erros do passado, é o caminho para um futuro ainda mais incerto e negativo.

*Diretor do Departamento de Imobiliário e Energia da UON Consulting, Eng.º Civil, MRICS, Perito Avaliador inscrito na CMVM, Perito Avaliador da Direção Geral de Impostos, Perito Regulador da CNPR, Perito Qualificado SCE-RCCTE e RSECE e Docente na Escola Superior de Atividades Imobiliárias (ESAI)

Fonte: Artigo produzido para o Blog ImoNews Portugal

1 comentário:

  1. Fui aluno do Prof João Rosa na ESAI.
    Estou de acordo com tudo o que está escito.
    Quero acrescentar que seja qual for a alternativa ou solução, NINGUEM com juízo perfeito, investe ou põe em prática as soluções teoricamente defendidas, enquanto o sistema juridico deste país não for alterado.A justiça tem que ser rápida,eficiente e eficaz.Qualquer justiça que demore mais 5 minutos do que o aceitavel,como por exemplo(?) ou por sistema (!), anos ou uma década,para ser resolvido, NUNCA É JUSTO,e empurra as organizações e pessoas para o "POÇO".Não brinquemos mais ao faz de conta.O país está amarrado ao fundo pelo sistema de justiça implantado.

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