O grande problema desta nova lei é que prevê um período transitório de cinco anos que protege os idosos, deficientes e carenciados, ou seja, a maior parte dos inquilinos que beneficiam de rendas congeladas. Passando estes cinco anos, ninguém sabe o que vai acontecer a estes inquilinos quando forem obrigados a pagar pelo arrendamento o valor de mercado, ou quando forem despejados das suas habitações.
A ministra terá dado a Cavaco garantias de que o Governo assegurará a protecção social dessas pessoas daqui a cinco anos e o Presidente da República, com base nessa "garantia", promulgou o diploma. O problema é que daqui a cinco anos nem Cavaco e, muito provavelmente, nem Cristas estarão nos respectivos cargos para resolver o problema que estão agora a criar. É o que se chama na linguagem popular empurrar o problema com a barriga. E não é por acaso que António José Seguro propôs um regime de transição de 15 anos, já que a probabilidade de lá estar daqui a cinco anos é alguma, e a probabilidade de ficar com a batata quente daqui a 15 anos é nenhuma.
Para se perceber o problema do arrendamento em Portugal é preciso recuar a 12 de Novembro de 1910, quando houve a primeira intervenção legislativa relacionada com congelamento das rendas. Depois veio o Estado Novo que dinamizou os bairros sociais (hoje zonas nobres da cidade), em que Salazar facilitava aos proprietários a construção dos prédios, mas obrigava-os a colocar um tecto nas rendas. A inflação das décadas de 70 e 80, muitas vezes acima dos 20%, rapidamente tratou de provocar um grande desfasamento entre o valor das rendas e os valores de mercado.
Os sucessivos governos foram adiando a resolução do problema, conseguindo não mais do que medidas avulsas e transitórias. O RAU em 1990 veio acrescentar uma pálida eficiência, deixando o mercado funcionar de novo, mas apenas para os novos arrendamentos. E já com Sócrates, tentou-se uma actualização gradual das rendas antigas com o NRAU, mas tal era a burocracia que apenas três mil rendas antigas foram actualizadas.
Com a chegada dos homens de negro os governos deixaram de poder usar a estratégia da avestruz já que a ‘troika' impôs que se resolva de uma vez por todas o problema. A nova lei de actualização das rendas antigas começou a ser preparada pelo governo socialista e coube a Assunção Cristas terminar a tarefa.
A lei tem muitos pontos positivos, nem que seja o esforço de tentar, mais uma vez, resolver o problema. Mas não é aceitável que o diploma agora promulgado não preveja, na própria lei, uma solução legislativa para aqueles que vão ser despejados ou obrigados, sem o poder, a pagar rendas a preços de mercado daqui a cinco anos. O Governo transforma assim um problema entre inquilinos e proprietários num problema entre inquilinos e a Segurança Social. Se calhar Assunção Cristas acha que daqui a cinco anos os idosos vão rejuvenescer, os deficientes vão readquirir as suas capacidades e os carenciados vão enriquecer. É preciso ter muita fé!Pedro Sousa Carvalho, Subdirector
Fonte: Económico
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