Um dos relatos que nos chegou, pela mão de um leitor, merece ser destacado pela natureza das incorreções, pela abundância delas, e por ser ilustrativo do impacto que um erro numa variável pode ter no imposto final a pagar de 2013 em diante.
Cada coeficiente, cada erro
Olhando para a notificação inicial e para a que o proprietário obteve depois de reclamar, verifica-se que o Fisco enganou-se em 3 dos 5 factores que compõem a fórmula de cálculo do valor fiscal do prédio. Só a área e o coeficiente de afectação (que reflecte o fim a que o imóvel se destina) se mantiveram iguais.
1. Idade do prédio passa do 8 para o 80: O Fisco atribuiu oito anos de idade a uma casa que tinha 85. De facto, o ano de inscrição da matriz, que consta da caderneta predial, regista o ano de 2003 como a idade de construção do prédio, mas essa informação não corresponde à realidade.
O proprietário ainda está para saber como se deu a troca, mas, na reclamação que apresentou nas Finanças, teve de juntar a cópia do contrato de compra e venda da casa. Deram-lhe razão, o que implicou uma alteração do coeficiente de vetustez (que depende da idade do imóvel) de 0,90 para 0,40.
2. Coeficiente de conforto ignora condições: o conforto e a qualidade construtivas são elementos que integram o cálculo do valor patrimonial tributário, e quanto melhores forem as características de um imóvel, mais o “preço fiscal” sobe. Ora, como a avaliação geral é feita a correr, sem deslocação dos peritos aos locais, as características particulares de cada casa acabam por ser ignoradas. Neste caso, depois de o proprietário ter reclamado que a casa tinha vários minorativos, o coeficiente passou de 1 para 0,85 (casos haverá em que o facto de não haver deslocação ao local acaba por ser benéfico aos proprietários, uma vez que o Fisco não tem condições para verificar se a casa tem aquecimento e outros confortos).
3. Coeficiente de localização trocado: os coeficientes de localização servem para distinguir o valor dos prédios em função da zona em que estão implantados (em Lisboa, por exemplo, as zonas estão avaliadas entre 1,2 e 3) e quanto mais alto for o coeficiente, mais elevado será o valor do imóvel e o IMI a pagar. Esta informação está do lado das Finanças, e encontra-se inclusivamente disponível na página electrónica da autoridade tributária e aduaneira.
Neste caso concreto, os peritos classificaram com 1,2 um prédio que estava numa zona 1,1, tendo obrigado o proprietário a apresentar simulação disponibilizada pelas próprias finanças onde provava que o coeficiente de localização estava errado.
Estes três erros em conjunto fizeram com que o valor patrimonial tributário do imóvel tivesse passado de 49.050 euros para 16.990 euros, quase três vezes menos do que a avaliação inicial. Num município que venha a fixar a taxa pelo máximo admitido por lei, 0,5%, é a diferença entre pagar 245,5 euros por ano ou pagar apenas 89,95 euros.
Simular o valor patrimonial
Várias conclusoes se retiram daqui. O primeiro erro mostra que as bases de dados do Fisco podem estar desactualizadas. O segundo erro mostra que o método usado nesta avaliação geral até pode garantir mais celeridade ao processo mas descura o rigor e mesmo a garantia de que prédios iguais são avaliados da mesma forma. O terceiro erro lembra que o inexplicável acontece – mesmo quando o Fisco dispõe dos elementos correctos, há variáveis que podem sair trocadas.
Por tudo isto, os proprietários devem olhar com atenção para a avaliação que receberem em casa e verificar se os indicadores que lá estão correspondem à descrição do imóvel. A lei admite que quem esteja insatisfeito com a avaliação reclame, mas o Estado só paga as custas se o proprietário tiver razão. Se pedir uma avaliação cujo resultado aponte para um valor patrimonial tributário igual ou até superior ao inicial, o proprietário tem de pagar, pelo menos, 204 euros (duas unidades de conta). As custas elevadas acabam por funcionar como elemento dissuasor à reclamação, mas, em caso de dúvida, pode sempre fazer uma simulação indicativa no portal das finanças, para saber se vale a pena arriscar a reclamação. Os passos são simples. Entrar em www.portaldasfinancas.gov.pt, seleccionar “serviços tributários”, escolher “simular” e, por fim, “avaliação de prédio urbano”. Aí encontrará o coeficiente de localização, e, mediante a introdução dos indicadores pedidos, simular o valor fiscal do prédio.
Reclamação (clandestina?) resolvida em tempo recorde
No caso concreto do proprietário desta história, a reclamação foi resolvida em tempo recorde. A notificação inicial data de 24/07/2012, o pedido de reavaliação foi entrege a 08/08 e dois dias depois, a 10/08, já estava decidido favoravelmente nuns coeficientes (os 3 acima referidos) e rejeitada noutros (a área, que o proprietário também contestou).
Tal como nunca chegou a perceber como ocorreram os erros iniciais, o proprietário ficou igualmente sem saber porque é que o Fisco acreditou nele quando descreveu os elementos de qualidade e conforto que o prédio não tem (até porque ninguém se deslocou ao local para os verificar). Também não percebeu porque é que, inversamente, não lhe deram razão na área que reclamava.
Curiosamente, a nota de reavaliação que recebeu não menciona que se trata de uma segunda avaliação - foi preenchida como se de uma primeira avaliação se tivesse tratado. No meio de tanta confusão, desponta ainda a dúvida sobre se, formalmente, a reclamação terá ficado registada enquanto tal.
Mais dados sobre o processo de reavaliação em curso podem ser encontrados aqui mesmo, no Massa Monetária.
Fonte: Negócios
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