Reabilitação e investimento estrangeiro são os vectores do futuro do imobiliário em Portugal. Após seis anos de forte contracção, o sector já vê a luz ao fundo do túnel.
Com o final da "travessia no deserto" do mercado imobiliário nacional, é tempo de tentar perceber o que correu mal e o que pode correr melhor. Luís Lima, que representa as empresas e os profissionais do imobiliário em Portugal, é o primeiro a reconhecer que se cometeram excessos no passado, mas diz sem rodeios que "o culpado é quem cria as condições, ou seja, o próprio Estado".
Quando o mercado imobiliário começou a corrigir, há alguns anos, disse que se tratava de um ajustamento saudável. Mantém essa opinião?
Não, acho que foi demais. Tinha de existir um ajustamento no sector da construção e imobiliário, mas foi doloroso demais. E sinto, assim como os meus colegas da confederação da construção e imobiliário, que fomos vistos nos últimos anos como os culpados do que aconteceu de mal ao país. Se calhar fizeram-se demasiadas auto-estradas, demasiadas obras, mas a verdade é que alguém as mandou fazer. E a culpa é de quem as mandou fazer. E acho que nós é que fomos vistos como os culpados, nomeadamente culpados da dívida do país.
Está a falar da actuação política. E a actuação dos bancos? Acha que o sector foi vítima de má gestão das carteiras de crédito dos bancos?
Sim, na área do imobiliário confesso que sim. Alguém incentivou a que 74% dos portugueses tenham hoje casa própria. Não são as pessoas as culpadas, elas tiveram condições para isso. Foram incentivadas: o Estado incentivou com benefícios fiscais e o crédito era barato. E hoje metade dos detentores de casa própria têm dificuldades em pagar a prestação ao fim do mês. A verdade é que se cometeram muitos erros, começando por nós imobiliárias que também vendemos as casas, mas criaram as condições e nós trabalhámos o mercado que existia então. Mas eu não me considero culpado. O culpado é quem cria as condições, ou seja, o próprio Estado.
O Estado podia ter feito mais para apoiar o sector imobiliário?
Podia. Repare, este Governo não tem um ministério das Obras Públicas. Ninguém pense que isso é inocente. Isso é um sinal de que o sector da construção e imobiliário não era estratégico para o país.
Mas se não existia dinheiro para investir neste sector...
Desde Janeiro vemos que Portugal tem potencial para cativar investimento estrangeiro. Sempre disse que o sector da construção e imobiliário podia ser um dos sectores que poderia ajudar à recuperação da economia. E isso está a provar-se desde Janeiro.
Mas isso agora é verdade porque existiu primeiro um ajustamento, que era necessário.
Mas foi demasiado violento. Quando metade dos desempregados são do sector da construção e imobiliário alguma coisa não está bem. Devia ter-se ido à procura de parceiros estrangeiros que nos ajudassem a capitalizar as empresas portuguesas. Para as PME criaram-se alguns fundos, que foram para meia dúzia de empresas, para as maiores.
No auge da crise conseguia captar investimento estrangeiro?
O imobiliário é diferente da construção. O país não tem dinheiro para continuar a construir auto-estradas e novos aeroportos, temos é de aproveitar o que temos. Temos de apostar na reabilitação. Temos um potencial enorme na área da reabilitação porque, ao contrário de Madrid ou de Paris, está tudo por fazer. Mas há anos que ouvimos falar na questão da reabilitação...
E tanto quanto julgo saber existiam verbas para isso, porque sempre ouvi que existiam fundos que queriam investir nisso, mas era preciso criarem-se condições.
E que condições seriam essas?
O Governo anterior, quando caiu, divulgou um programa, nos qual aliás participámos, para apoiar o arrendamento e a reabilitação. Andamos três anos a negociar essa lei com o Governo, que tinha benefícios fiscais para o sector do arrendamento e para a reabilitação. E quando o Governo caiu , caiu tudo. Voltámos a estar mais dois anos em negociações com o novo Governo, e só há cerca de um ano é que saiu uma nova lei para dinamizar o mercado de arrendamento, e que não tem o que considero necessário. E só agora é que o programa de reabilitação está a ser finalizado. Passaram mais três anos e nesses três anos muitas empresas desapareceram.
Diz que a nova lei do arrendamento não tem o que considera necessário. O que é que falta a esta lei?
Para o mercado de arrendamento ter sucesso não se devia colectar os impostos sobre a posse, mas antes sobre o rendimento, e devia existir dedução no IMI. Desde que a pessoa declarasse esse rendimento em sede de IRS, aquilo que paga pela posse de IMI devia ser dedutível. Enquanto não fizerem isso garanto-lhe que nunca vai existir um mercado de arrendamento dominante. Já dissemos isto ao Governo e sei que muita gente concorda. Mas não é fácil, tudo o que mexe com receitas fiscais e com o Ministério das Finanças não é fácil.
Fonte: Diário Económico
0 comentários:
Enviar um comentário
Obrigado pelo seu comentário.