09 novembro 2014

IMI. Proprietários à beira de um ataque de nervos


Há famílias e senhorios a pedir empréstimos para pagar o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) e estes casos não são os mais dramáticos. Há pior: pessoas que estão a ser alvo de processos de execução fiscal e a perder a casa onde moram por deverem às Finanças o imposto que lhes é cobrado pelo imóvel.


O Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI) antecipou esta realidade, em 2012, ao pedir na Assembleia da República a suspensão das vendas coercivas de habitações próprias permanentes (avaliadas até €175 mil) por dívidas de IMI. "Apercebemo-nos que o fim de isenções e a avaliação geral do património iam colocar cada vez mais pessoas em dificuldades, quando estes casos já estavam a aumentar", lembra Paulo Ralha, presidente do STI. 

Não tiveram sucesso. E hoje o panorama agudizou-se. "Há muitas famílias com grandes dificuldades para pagar o IMI e são cada vez mais também os processos de execução que culminam com a penhora da casa", refere o dirigente sindical, acrescentando que não tem números sobre o incumprimento no IMI e das penhoras de habitações por dívida do imposto porque a tutela não os disponibiliza. Contactada pelo Expresso, a Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais não forneceu estes dados até ao final da edição. 

Questionado sobre a hierarquia dos bens que são penhorados em caso de dívidas fiscais, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, garante que a lei é cumprida. E esta estipula que "só no final" e "não havendo outros bens" é que se executam imóveis, de preferência rústicos e que não sejam afetos à habitação. O problema, diz Paulo Ralha, é que "em dívidas a partir de €150 os processos são automáticos e muitas vezes os chefes (nos serviços de Finanças) não têm tempo para analisar os casos". A outra face da moeda é que, por vezes, os únicos bens que essas famílias têm são as casas onde vivem.

Tanto Luís Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários, como António Frias Marques, presidente da Associação Nacional de Proprietários, falam em situações de quem teve de pedir dinheiro emprestado para liquidar a fatura do IMI. E casas penhoradas por dívida do imposto? "Não faltarão casos e vão aumentar em 2015", concordam. 

O fim, em 2015, da cláusula geral de salvaguarda que impede subidas o abruptas do IMI é mais uma acha para uma fogueira com uma dimensão considerável. Em 2011 foram criadas três cláusulas de salvaguarda para amortecer os efeitos da reavaliação de 4,9 milhões de imóveis. Vai cair a cláusula geral aplicável a todas as pessoas cujos imóveis foram reavaliados em 2012 e que impedia que o IMI aumentasse mais de €75 por ano. E permanecem duas proteções, sem limite temporal: a cláusula especial para as famílias no primeiro escalão do IRS (até €7.000 brutos por ano), que impede que o aumento do IMI ultrapasse os €75 por ano e que deverá abranger um milhão de famílias, segundo o Governo; e a cláusula para os senhorios com rendas antigas, em que o IMI não pode ser superior ao valor da renda recebida. 

A pressão por receitas do lado das autarquias não ajuda o cenário. Frias Marques lembra que, segundo o anuário dos municípios de 2013, 60,5% da receita fiscal das câmaras é IMI. "Sobretudo Lisboa e Porto cobram IMI por lojas e escritórios vazios que não geram qualquer rendimento, porque por causa da crise não se arrendam", lamenta Frias Marques, acrescentando que muitos imóveis estão a ser classificados como devolutos porque os proprietários não têm dinheiro para pagar obras e as autarquias passam a poder cobrar o triplo do IMI. 

A receita de IMI em 2004, um ano após reforma da tributação do património, ascendia a €576 milhões e as previsões para 2015 são de €1.632 milhões, 2,8 vezes mais. Vasco Valdez, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de Manuela Ferreira Leite e responsável pela 'criação' do IMI, não considera que a carga fiscal atual sobre o património seja excessiva: "Em termos relativos não é, tanto mais que as receitas do IMT (Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis) tiveram uma queda muito acentuada dada a conjuntura económica". Mas identifica uma perversidade: "Os prédios urbanos quando não arrendados - não geram proveitos, pelo que o imposto poderá tornar-se incomportável para os proprietários, transformando-se num verdadeiro imposto sobre o capital e forçando-os a vender os imóveis". 

Sobre a ausência de proteção dos contribuintes face ao aumento do IMI, o secretário de Estado refere que "no Orçamento do Estado (OE) para 2012 o Governo reforçou a isenção permanente de IMI, abrangendo cerca de 300 mil agregados que hoje não pagam este imposto". E lembra que no OE para 2015 se alargou esta isenção permanente para agregados com rendimento bruto anual até €15.295, estimando-se em mais 50 mil famílias abrangidas. 

Quanto ao fim da cláusula geral, Paulo Núncio salienta que estas pessoas passam a estar "em igualdade de circunstâncias com todas aquelas que compraram imóveis a partir de 2003 e que já pagam o IMI de acordo com o valor patrimonial atualizado".

Mude-se o cálculo do IMI 
Para o urbanista e professor da Universidade de Lisboa, Sidónio Pardal, "o Imposto Municipal sobre Imóveis está desligado do rendimento e ignora completamente a capacidade contributiva associada ao prédio. E tudo o que seja tributar de forma desligada do rendimento é desumano, violento". Sidónio Pardal é autor do estudo de 1996 feito na Universidade Técnica de Lisboa que propôs o 'valor de base territorial' como base de incidência da tributação do património. Em 1999, este estudo teve da parte do então ministro das Finanças, Sousa Franco, o reconhecimento como um modelo que "baseado no valor de base territorial consegue colher esse elemento comum, consistente na determinação de espaços territoriais iguais, em localização e em áreas, indutor de tratamento igualitário dos proprietários". O urbanista defende que o Estado "devia definir o imposto com base na capitalização do rendimento real ou presumido, com elevado grau de probabilidade, ou então adotar o valor de base territorial, o qual se presta a ser regulado com base numa política de solos".

Fonte: Expresso

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