02 novembro 2014

Imobiliário espelha as mudanças sociais


da autoria de Sandra Marques
A investigadora Sandra Marques Pereira analisou 155 anúncios de imobiliário publicados no semanário Expresso entre 1973 e 2001. Mais do que passar em revista 30 anos de publicidade de imobiliário, o livro "Visite o Andar Modelo - 30 Anos de Publicidade de Imobiliário" da autoria de Sandra Marques Pereira, recentemente editado pela Caleidoscópio, retrata a evolução da sociedade portuguesa entre 1973 e 2001. Através de 155 anúncios publicados no Expresso durante este período, referentes à região de Lisboa, a investigadora do Dinâmia CET-IUL e professora convidada do ISCTE-IUL mostra como se passou de uma fase ideológica no imobiliário para o culto da personalidade do arquiteto.

Na altura em que estava a elaborar a sua tese de doutoramento sobre os modelos de habitação privada em Lisboa, Sandra Marques Pereira recolheu mais de 600 anúncios de imobiliário. Um material que não incluiu na publicação da sua tese em 2012, pois queria escrever um livro mais curto e menos académico sobre esta matéria que se converteu agora no "Visite o andar modelo" e onde apresenta uma amostra de 155 anúncios. 

Conta que "o Expresso era a referência sobretudo a partir de um certo momento em que começa a ter um caderno de imobiliário autónomo, com vários anúncios de grande formato". O estudo começou em 1973, data da criação deste semanário e terminou com a entrada do século XXI. "A explosão da publicidade de imobiliário concentrou-se sobretudo nos últimos 15 anos do século XX, quando se dá o nosso boom. Hoje deslocou-se muito para a internet, para os sites de mediadoras e promotores. O livro é também o legado de um tempo em que a imprensa escrita era o grande veículo da publicidade de imobiliário", frisa a investigadora. 

30 anos de história

Na prática esta obra é uma história recente da sociedade portuguesa vista através dos anúncios. Sandra Marques Pereira divide o período em análise em três momentos. "Um primeiro, entre 1974 e o início dos anos 80, em que a publicidade é muito contaminada pelos valores da revolução", explica. O imobiliário torna-se um assunto político e surgem nos anúncios frases como "o direito à habitação" e "uma casa para cada família". Num anúncio de J. Pimenta, de dezembro de 1974, por exemplo, fala-se em "Uma habitação completa de 2 em 2 horas - um ritmo novo para um novo Portugal. Podemos fazê-lo". Era o espírito da época. 

Segundo a autora em 1975 assistiu-se a uma explosão atípica de anúncios. A explicação é simples: "tratou-se de uma estratégia defensiva dos agentes do sector num contexto de grande hostilidade face à iniciativa privada", revela. Em 1985 dá-se a viragem para o segundo momento que a autora designa de "fase do luxo", onde a entrada de Portugal na Comunidade Europeia tem um papel central e proliferam anúncios relativos a isso, como do Parque Europa ou do Edifício Bruxelas. "É uma fase de mudança pai uma economia de mercado, marcada pela generalização do acesso à propriedade e em que a casa e o edifício, em particular, se tornam um dos mais poderosos veículos e símbolos de distinção social", salienta. Valores como o luxo e privado imperam e em termos arquitetónicos os edifícios tornam-se ostensivos. 

O terceiro momento começa no fim da década de 90 e a investigadora intitula-a de prenúncio da crise. "Surgem então dois dos principais elementos que marcam o imobiliário da atualidade: o arquiteto como imagem de marca e a reabilitação", finaliza. Dá como exemplo um anúncio do empreendimento Terraços de Bragança, em Lisboa, da autoria de Siza Vieira.

Fonte: Expresso

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