22 novembro 2014

Investimento estrangeiro estava a subir 641% até à crise dos vistos gold


A entrada líquida de investimento direto estrangeiro (IDE) estava a crescer 641% antes de rebentar o escândalo dos vistos dourados (gold). Em apenas 12 meses, de setembro de 2013 a igual mês deste ano, entraram, em termos líquidos, na economia portuguesa 5891 milhões de euros em IDE, diz o Banco de Portugal.


Parte do valor reflete a entrada de verbas via vistos dourados, que o vice-primeiro-ministro calcula em mais de 1100 milhões de euros desde que o regime foi criado, em 2012.


O valor acumulado retido de janeiro a setembro de 2014 ia em 6809 milhões de euros, segundo dados publicados anteontem pelo banco central, quase oito vezes mais do que no mesmo período do ano passado.

O regime dos vistos gold foi criado em agosto de 2012 pelo governo PSD/CDS, mas num despacho de janeiro de 2013 Paulo Portas e Miguel Macedo, ex-ministro da Administração Interna, deram mais facilidades aos investidores que pretendam requerer o estatuto.

O dinheiro foi canalizado, essencialmente, para o imobiliário, sobretudo casas e prédios de luxo (valor mínimo de meio milhão de euros).

Dos quase 1775 vistos de investimento gold já concedidos entre outubro de 2012 e igual mês deste ano, 1681 foram para aquisição de imóveis, 91 foram transferência de capitais e apenas três para criação de, pelo menos, 10 postos de trabalho, diz uma nota do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Em 2013, no despacho conjunto, Portas e Macedo reduziram o número mínimo de empregos a criar com os investimentos gold, de 30 para 10 postos de trabalho; relaxaram o tempo de permanência no território requerido ao cidadão estrangeiro de 30 para sete dias no primeiro ano; e permitiram que em vez de um depósito bancário de um milhão de euros (mínimo) sejam aceites instrumentos financeiros de igual valor.

Segundo a base de dados do Banco de Portugal, depois da primeira metade de 2013 ter sido pobre em retenção de novo IDE (houve inclusive drenagem de valor entre fevereiro e agosto desse ano, como se vê no gráfico), a partir desse último mês a captação de dinheiro estrangeiro recuperou e com especial força a partir de maio último.

Em todo o caso, recorde-se que, no início deste ano, o Estado e a CGD venderam 85% da Caixa Seguros aos chineses da Fosun por mais de mil milhões de euros. Mais tarde, os CTT foram alienados na totalidade a vários investidores institucionais e fundos por quase mil milhões de euros. As duas operações influenciaram certamente as estatísticas divulgadas anteontem.

Cerca de 95% do IDE retido este ano até setembro (ou seja, descontando já drenagens de valor como desinvestimentos, repatriamento de lucros, etc.) diz respeito a "títulos de participação no capital de empresas", mostra ainda o Banco de Portugal. O resto, 306 milhões de euros, é aplicação de verbas em "instrumentos de dívida".

O labirinto

Na sequência da Operação Labirinto, que descobriu um círculo de ligações perigosas envolvendo altos funcionários públicos e levantou suspeitas de corrupção, branqueamento de capitais, tráfico de influência e peculato, a medida dos vistos gold será "melhorada", garantiu anteontem Paulo Portas, que não a rejeitou porque, "além de 1107 milhões de investimento em Portugal, os chamados vistos gold, em dois anos, terão rendido 105 milhões de euros em impostos diretamente resultantes deste investimento estrangeiro". O dirigente do CDS nunca disse quantos empregos foram criados, apesar da insistência de vários deputados da oposição. Mas prometeu várias vezes melhorar o regime.

Os representantes do setor imobiliário é que ficaram apreensivos com a crise dos vistos. "Este programa não pode ser posto em causa por questões de natureza judicial, as quais devem ser cabal e rapidamente esclarecidas pelos tribunais e, muito menos, por disputas de natureza política", disse a Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário (CPCI), dirigida por Manuel Reis Campos.

Estes vistos têm tido "efeitos positivos comprovados" e a figura do visto gold "existe em muitos outros países". Mas é preciso evitar agora que os investidores optem por outros destinos depois do que aconteceu, acrescenta.

Luís Lima, da Associação de Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária (APEMIP), lamenta que "o percurso normal de um caso de polícia esteja a ser transformado num injustificado e injusto ataque a programas de captação de investimento estrangeiro, que têm tido, entre outros, o mérito de relançar o mercado imobiliário".

Fonte: Dinheiro Vivo

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