17 janeiro 2015

Os particulares como motor da reabilitação urbana


A reabilitação urbana tem sido, ultimamente, tema recorrente tanto em termos de legislação como em termos objeto de análise e comentários, o que é justificável por aí residir uma convergência de interesses. Mas para reabilitar não chega publicar legislação e reduzir alguns formalismos em termos de licenciamento. O envolvimento dos particulares proprietários dos imóveis na tarefa de reabilitação é decisiva para tornar os projetos de reabilitação numa verdadeira e sustentada atividade económica nos próximos anos. 

Pouco se tem feito de concreto para incentivar os particulares a investirem na reabilitação. Para criar confiança nos investidores e a responsabilização dos mesmos no âmbito do dever de reabilitar o seu património edificado, terá que haver uma articulação e coordenação entre as várias entidades intervenientes.

Atente-se no caso das situações em que um proprietário enquanto está a aguardar o licenciamento para obras de reabilitação, ou mesmo após o licenciamento, mas, enquanto não inicia os trabalhos de construção, vê o seu imóvel declarado com o estatuto de "prédio devoluto" e como tal com o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), agravado em 200%! 

Se, não vejamos: o proprietário teve custos com todo o processo de licenciamento para alteração, reabilitação e recuperação de um prédio e teve ainda que encontrar e custear alojamento alternativo para os inquilinos que aí habitavam há mais de 50 anos - sendo que, nos termos da lei, foi necessário negociar com os inquilinos o realojamento, o que também demora. Nesse decurso e já após ter sido pago e levantado o alvará de licenciamento, recebe uma notificação nos termos da qual a edilidade manifesta a intenção de declarar o prédio como devoluto, pelo facto de o mesmo não ter em vigor contratos de fornecimentos de serviços durante um ano, nos termos do artigo 2.°, n.° 2, do DL 159/2006. 

Para ultrapassar essa situação, o particular continua o seu calvário e terá que reclamar em fase de audiência prévia e não lhe sendo dada razão (como habitualmente sucede) terá que recorrer à via judicial, com os inerentes custos e perda de tempo. 

Situações como estas, em que as câmaras fazem uma leitura cega da lei sem atentar nos objetivos da mesma, são recorrentes, pelo que urge reformar a lei. Da leitura do preâmbulo do DL 159/2006 resulta claro que o que a lei visa penalizar são os prédios devolutos, totalmente abandonados, cujo proprietário nada faz para "assegurar qualquer função social ao seu património". Contudo, lamentavelmente, muitas câmaras fazem uma leitura meramente literal da alínea b) do artigo 3.° do Decreto-Lei 159/2006, que refere que "não se considera devoluto o prédio urbano ou fração autónoma durante o período em que decorram obras de reabilitação, desde que certificadas pelos municípios"(sublinhado nosso). 

Para evitar equívocos, a alínea b) do artigo 3.° do Decreto-Lei 159/2006, terá que prever que "não se considera devoluto o prédio urbano ou fração autónoma durante o período em que decorra o processo de licenciamento ou as respetivas obras de reabilitação" (sublinhado nosso). 

É fundamental criar um clima de confiança no potencial investidor desta área de atividade económica. Caso contrário, o investidor privado, que se move por critérios de ponderação económica e custo-benefício, não vai ter qualquer incentivo a reabilitar. E não é com medidas sancionatórias que vamos ter cidades sustentáveis!

Por Anabela Pouseiro, Jurista na EPRU
Fonte: VidaEconómica

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