
José Luís Pinto Basto é CEO do The Edge Group, um dos grupos com mais sucesso na área do imobiliário. Além de investimentos neste setor, sobretudo na recuperação e reabilitação urbana, são várias as áreas em que a holding aposta. Recentemente, comprou as marcas Majora e Labrador, relançando-as na economia nacional. Passou mais de uma década, concretamente 13 anos, e o The Edge Group não parou de crescer e de se afirmar como um grupo coeso. Uma das principais áreas de negócio é o setor imobiliário, mas o grupo liderado por José Pinto Basto gere outras áreas de investimento.
Depois de uma crise que atingiu o setor em força de 2006 a 2013, considera que o ano 2014 foi um ano de viragem no setor?
Foi um ano de viragem no setor, não na sua generalidade, mas em algumas áreas especificas, nomeadamente a área residencial. Há uma procura crescente por parte de estrangeiros, sobretudo nas zonas metropolitanas do país - Porto e Lisboa. Os investidores estrangeiros procuram o mercado nacional na busca por boas oportunidades de investimento, de edifícios que estejam arrendados e que lhes dê um bom rendimento sobre os capitais investidos.
Será 2015 um ano melhor em termos de negócio para o setor imobiliário?
Neste ano iremos continuar a sentir a pressão da crise, sobretudo nas áreas do imobiliário, concretamente nos edifícios de rendimento. Estamos a sentir um reforço de liquidez, que o próprio Banco Central Europeu irá iniciar em termos de 'injeção' e, no fundo, de tentar estimular a economia, é necessário aplicar liquidez à economia, Permitirá abrir caminho a investidores que procurem oportunidades de investimento que dê rendibilidade acima daquilo que são os depósitos a prazo ou as obrigações. Pela primeira vez estamos a ver situações de taxas de juro negativas. Em alguns casos já aconteceu ver a EURIBOR a um mês ser negativa. Algo que há uns anos atrás seria impensável.
Mas será este o ano em que o investimento imobiliário vai voltar a ser tão atrativo como foi no passado? Ou será que esses tempos já não regressam?
Em alguns aspetos podemos dizer que este ano o setor imobiliário poderá ser tão atrativo como foi no passado. Em determinadas áreas vai continuar a existir um stock de imobiliário que não se vai resolver tão cedo, ou, num caso extremo, talvez nunca chegue a resolver-se. Considero que foram cometidos exageros em algumas áreas - fundamentalmente a área do turismo -, que poderão não ser resolvidos no futuro. Podemos pensar em situações mais concretas, mais direcionadas, como o caso do imobiliário urbano e a própria renovação urbana. Como dificuldade podemos referir que nos últimos anos os bancos tem estado fechados ao setor imobiliário.
Tendo em conta a disponibilidade dos bancos e a atual conjuntura económica do país aconselharia o investimento no setor imobiliário?
Os bancos não têm investido no setor, mas esta é uma área que precisa de muito financiamento. No entanto, estes valores raramente podem ser feitos recorrendo a capitais próprios. Sem dúvida que o imobiliário é uma das classes mais seguras para se investir. Também foram cometidos exageros na área financeira. Na verdade o imobiliário também sofreu exageros, tendo que ser sujeito a uma correção. O dinheiro não desapareceu, só vai circulando por classes de ativos e por zonas geográficas, influenciados pela perceção da oportunidade de retorno. Houve uma fuga de capitais no setor imobiliário por via do rebentamento da crise financeira. De forma tentada os capitais começam a olhar para o setor [nesta fase] de um modo muito seletivo. Sem dúvida que é uma classe de ativos tão interessante ou ais que outras classes, nesta altura bastante firme e segura. O imobiliário tem retorno. Nesta altura quem tenha dinheiro para investir, deve fazê-lo. As obrigações de determinadas empresas estão a dar 1% ou 2 %, e a dívida pública está a dar 2,3%. Quem comprar um edifício que renda 6% ou 7%, é de facto um investimento muito interessante.
O investimento na reabilitação urbana é uma tendência a aumentar?
Acima de tudo é necessária a reabilitação urbana. Se olharmos para o centro de Lisboa e do Porto, há muito para se fazer em termos de reabilitação. Nesta fase em que o financiamento é seletivo, será difícil obtê-lo. O esforço para se fazer um projeto de raiz é sempre maior do que o de recuperar um edifício que já existe. A previsibilidade de um projeto de reabilitação é muito maior do que um projeto onde se tem de comprar um terreno e licenciá-lo, o que em Portugal se traduz numa incógnita o que tempo que demora o processo. Construi-lo de raiz, demora no mínimo 2 anos. O passo seguinte é colocá-lo no mercado e depois encontrar inquilinos e ocupantes para o edifício. Este ciclo, efetivamente é mais longo, tornando o próprio investimento mais arriscado e exigindo um investimento maior. O imobiliário está a recuperar de uma crise forte que afetou o setor e em que os bancos começam a estar abertos - de forma seletiva - a apoiar projetos. As oportunidades estão, de facto, na reabilitação urbana. Há uma necessidade renovar a cidade - de Lisboa e de reabilitar uma série de edifícios. Nós acreditamos mais na procura por parte de estrangeiros do que na procura nacional. Esta procura interna está bastante condicionada, uma vez que as pessoas perderam poder de compra. Quem beneficiou de empréstimos no 'tempo das facilidades', comspreads abaixo de 1% - correspondendo a uma grande percentagem da população - tem neste momento taxas ridiculamente baixas, ainda com as taxas EURIBOR perto de zero. Na prática o que acontece é que essas pessoas estão a ser subsidiadas. Os empréstimos que estão a pagar das suas casas, praticamente traduzem-se entre a EURIBOR e o spread, que em muitos casos não chega a 1%. Portanto as pessoas que tem esses empréstimos não vão largá-los e sabem que no dia em que trocarem de casa, a entidade bancária lhes irá subir o spread e eventualmente estará disponível para conceder um novo empréstimo, mas com taxas diferentes. Por outro lado, a questão do arrendamento para jovens, e o modo como estes encaram o mercado de trabalho e a mobilidade. Estes entendem que hoje estão a trabalhar em Lisboa, mas amanhã já podem estar em Madrid ou Luanda. A motivação para comprar casa já não é a mesma. Os jovens procuram mais o arrendamento do que a aquisição de imóveis. O que, de facto, irá atrasar as transações imobiliárias de compra e venda de casas. O grupo Edge aposta na recuperação de edifícios, os chamados commercial properties, que são edifícios de escritório e retalho. Essa é também uma maneira de apostamos na recuperação da economia portuguesa.
Em que se traduz a recuperação das Twin Towers?
Traduz-se num misto de comércio e escritórios. Nós desenhámos um conceito designado 'small', que no fundo tenta recuperar o comércio tradicional de bairro, mas dando as facilidades e a conveniência a que as pessoas já estão habituadas nos centros comerciais. Prevemos uma superfície de retalho alimentar, algumas lojas de conveniências. Haverá uma replica do edifico que já funciona na galeria das Amoreiras. O grupo está sempre a olhar para novos projetos. Apresentamos uma proposta por semana. A verdade é que somos exigentes na forma como compramos e nem sempre as propostas são aceites. Aliás, a maior parte das nossas propostas não são aceites, mas não deixamos de avaliar as oportunidades e de oferecer o que nós consideramos que é o valor adequado. O grupo é conservador na forma como investe, pois o ciclo imobiliário é longo, com muitos riscos, sobretudo de licenciamento e da própria promoção e construção, que podem acontecer a qualquer momento. Somos sobretudo calculistas na forma como fazemos os nossos investimentos, pois não estamos pressionados a fazê-los. Há critérios de investimento que devem ser respeitados. Os participantes dos fundos têm pressão de investimentos e pressão de desinvestimento no momento em que as pessoas querem resgatar as participações. Este ciclo imobiliário veio demonstrar e obrigou a repensar as regras dos fundos imobiliários. As regras permitem que os participantes dos fundos liquidem as suas participações com pré-avisos muito curtos, que permite a quem aplicou dizer "eu quero o meu dinheiro de volta".Isto acontece quando as pessoas se assustam com o imobiliário nas crises. E é exatamente nessas alturas que é difícil vender o imobiliário, portanto como é que estes fundos conseguem prometer uma liquidez imediata, quando na realidade são compostos por ativos que não são líquidos nesses momentos de crise?
Quais os investimentos mais importantes do grupo no setor imobiliário?
Neste momento temos 8 projetos entre produtos já desenvolvidos e produtos em desenvolvimento. O maior deles é o Norte Center, em Matosinhos, um projeto a longo prazo onde nós nos propusemos a construir o primeiro Bussiness Park , do grande Porto. O terreno situa-se numa localização estratégica, entre o aeroporto e o Porto de Leixões, com proximidade a zonas comerciais. Temos uma estratégia entre projetos de rendimento e desenvolvimento, apostando numa diversificação de projetos a curto, médio e longo prazo. Mais uma vez observamos durante esta crise económica, que muitas empresas imobiliárias que tinham essencialmente projetos de longo prazo, a terem graves problemas de tesouraria. O esforço que é necessário fazer para um projeto de longo prazo, e que se vai investido ao longo de muitos anos para se ter um retorno, traduz-se, em esforços mal calculados. O caso típico são os resorts. O desenvolvimento de um resort demora em média, sem ilusões, vinte anos. Estes projetos requerem um reforço financeiro muito significativo. O custo de capital que é inicialmente aplicado, depois da compra do terreno ao desenvolvimento das infraestruturas, pesa de tal forma, que ao longo dos anos, que os torna de difícil rentabilidade. Nesse sentido, o grupo foi mais pragmático. Não nos assustam os projetos de longo prazo, caso disso é o Norte Center, mas achamos importante que as empresas não estejam unicamente focadas neles. Não deixem de os fazer, pois o tempo passa de qualquer maneira, portanto vale a pena continuar a trabalhar neles, mas ao mesmo tempo, podem ir fazendo projetos mais rápidos, que permitem ter uma geração de cash flow, mais regular.
O grupo, além do setor imobiliário, tem investimentos em outras áreas. Em 2014 adquiriu a Majora, por exemplo. O que cativou a compra de uma marca com 75 anos e sobretudo o seu relançamento no mercado após esta ter sido entregue ao Montepio?
A Majora é um desafio que nos pareceu interessante, tal como a marca Labrador. Fomos abordados por um banco, talvez por via da crise e das dificuldades que as anteriores empresas que geriam essas marcas sentiram. A marca Majora foi entregue ao banco [Montepio] e a partir daí houve contacto connosco por parte da entidade bancária, no sentido de nos perguntar se tínhamos interesse em fazer o desenvolvimento da marca, recuperando-a. Olhamos para este projeto com muito entusiasmo. Durante o ano de 2014 algumas burocracias obrigaram o grupo a aguardar que se resolvessem determinadas questões relacionadas com antigos empregados, atrasando o processo. O ano de 2015 será o ano de relançamento da marca, para contentamento nosso e de muitos portugueses.
Então não podemos falar numa evolução da marca, pelo menos para já.
Neste momento é cedo, mas temos já planos muito ambiciosos para relançar a marca, não só na sua área tradicional de jogos de tabuleiro, mas também para a área digital. Este mercado online foi timidamente tentado no passado, mas nós achámos que o momento adequado é agora. Há que capitalizar o valor da marca no mercado digital, até porque os tempos mudaram. Queremos transportar os valores e os clássicos da Majora, adaptando-os ao meio digital. Temos mais ideias para o projeto, capitalizando a marca em novas áreas (perfumes, vestuário), pensando no público infantil. Mas queremos internacionalizá-la. A Majora já é conhecida nos PALOP, mas nunca antes teve uma projeção internacional, mas queremos mudar isso.
Recentemente o grupo também investiu na Labrador. A empresa que a geria passou por um processo de insolvência em 2011, sendo vendida em hasta pública. Como se recupera uma marca que esteve quase na falência?
A avaliação que fizemos foi de que a marca não tinha falido, ou seja, a marca continuava a ter os seus clientes, tinha procura e tinha prestigio e simplesmente a empresa que a geria, por razões essencialmente financeiras e de desequilibro de capitais, tornou-se insustentável, levando à situação de insolvência. Os seus clientes ficaram defraudados, ou seja, eles continuaram a querer e a procurar os produtos da marca, mas a empresa que geria a marca não teve capacidade para lhe dar continuidade e foi isso que nos fez acreditar na marca e dar-lhe continuidade. Criamos uma nova empresa com estrutura de capitais adequada, não correndo riscos. Avaliamos desde o início dar continuidade ao posicionamento da marca e à qualidade [segmento de mercado à qual esta se dirigia]. Se mudássemos isso, não estaríamos a representar o valor da marca e a sua história. Nesse sentido desafiamos um dos ex-sócios da marca para se juntar ao grupo, incorporando-o neste novo projeto. Foi uma espécie de 'juntar a marca com o seu criador'. Neste momento temos 90% dos antigos colaboradores da Labrador. Ficámos com a loja que a marca tinha nas Amoreiras e, no ano de 2014 a loja abriu no Porto, no mesmo sítio onde estava situada antes de fechar. No final do ano, comprámos a uma instituição bancária o antigo armazém da marca, que já estava adaptado às necessidades. Construímos peça por peça uma empresa que teve a sua época áurea de crescimento e que acabou por desaparecer.
Para este ano espera um crescimento da cadeia de supermercados Brio?
Claramente. Nós anunciamos a abertura de 5 lojas para este ano. Neste momento estamos em campo a fechar contratos com as localizações dessas novas lojas. Temos como objetivo dobrar o tamanho da cadeia. Hoje já somos a maior cadeia de distribuição biológica em Portugal. Queremos dobrar o tamanho, passando de cinco, para dez lojas. Estamos financiados neste momento para isso. E isso irá permitir que estendamos as lojas geograficamente, saindo da grande Lisboa. Esperamos abrir duas lojas no centro do país -eventualmente em Coimbra, Leiria - uma no Porto e na zona do Algarve e da grande Lisboa.
Na lista de projetos da empresa há espaço para uma possível internacionalização da marca? Haverá espaço para isso, mas a empresa terá de ser mais sólida no mercado nacional. Nós temos o desafio de internacionalizar as marcas, pois o mercado nacional é pequeno. Face ao esforço que é necessário para internacionalizar uma empresa, nunca é suficiente capaz de aguentar uma internacionalização que não seja bem feita e, portanto, para o ponto de partida, a empresa terá de ter a confiança do mercado nacional. A estratégia é a consolidação da marca no mercado nacional.
Em que ponto se encontra o projeto cidade Belenenses?
Temos um acordo assinado com o clube. O Belenenses teve eleições no final do ano passado. É um projeto ambicioso para ambas as partes. Digamos que estamos a conversar no sentido de dar continuidade ou não a este projeto, nos moldes em que estavam desenhados ou eventualmente diferentes. É um projeto que tem um cariz essencialmente social, não é um puro projeto imobiliário.
Quais os projetos do grupo a nível internacional?
Já estudamos projetos em vários pontos do mundo, incluindo o Brasil e a Polónia. De facto o que aconteceu foi que esta crise dos últimos cinco anos fez-nos repensar a nossa estratégia de internacionalização, e virar-nos novamente para o nosso país. Por duas razões essenciais: havendo uma correção sobre os valores especulativos de mercado, voltaria a tornar-se interessante para investimento (acreditamos muito no investimento em contra circulo). Por outro lado por um espírito de missão de fazer um esforço para estimular a economia numa altura em que ela precisa de ser estimulada. [Obrigação dos empresários nacionais em contribuir]. Nós não deixamos de estar ativos nestes últimos cinco anos de crise, não só na área do imobiliário mas também na área do capital de risco. Houve necessidade de criar alternativas de emprego as jovens, e mesmo assim penso que se podia ter feito muito mais. Fizemos a nossa parte mas no geral o país não foi capaz de reagir a esta crise. Deixamos fugir muito talento. Nós investimos e apoiamos muito o empreendedorismo jovem durante esta fase.
Quais os principais projetos para este ano?
Vamos apostar na reabilitação urbana de edifícios comerciais, como já estamos a fazer. Há de facto uma grande procura deste tipo de edifícios, e portanto temos de criar mais produto disponível. Estamos a olhar para alguns projetos de turismo residencial. Acreditamos muito na recuperação de um país e da economia. Apesar de estarmos num ano de eleições onde vai haver alguma incerteza e, de alguma forma os investidores internacionais irão parar para pensar e depois das eleições podem ou não investir, dependendo ou não das mudanças políticas. Mas vamos continuar a investir naquilo que é a nossa atividade principal, o imobiliário.
Tendo em conta a atual conjuntura económica e política do país, acha melhor o investimento em ações ou no setor imobiliário?
Sou suspeito, porque nós investimos em imobiliário. Com isto não quero dizer que o mercado de capitais não seja atrativo, é também uma questão de vocação e de conhecimento. Nós sentimo-nos seguros a investir no mercado imobiliário porque conhecemos bem e identificamos os riscos, tendo controlo nos investimentos que fazemos. No mercado de capitais há uma certa impotência por parte dos acionistas, principalmente quando se trata de grandes empresas. Há situações que nos fazem pensar se não devemos de facto aplicar os nossos recursos em investimentos que temos controlo. Se eu fosse acionista da PT e tivesse sofrido o descalabro que foi a gestão da PT dos últimos anos, eu estaria muito revoltado. Situações como essa afastam as pessoas do mercado de capitais. Casos como este fazem-nos pensar 'que sentido é que faz aplicar os nossos recursos em coisas que não sabemos o que se está a passar lá dentro.
Fonte: Dinheiro Vivo
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