Otimista mas cauteloso. Esta é a postura de Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP) quando analisa o estado do sector imobiliário nacional. Acredita que a retoma está no bom caminho, mas apela à estabilidade económica e política para que o crescimento seja consolidado.
Que análise faz deste último ano para o sector imobiliário?
Previa que 2014 seria o ano da retoma e correu ligeiramente melhor do que aquilo que pensei. A partir do segundo semestre tivemos noção que o mercado estava a crescer. O primeiro semestre de 2015 também foi bom. Houve mais transações que no ano passado. O que faz com que este ano eu preveja um aumento de 25%, o que é bom. Estou a ser um pouco cauteloso porque com toda a questão política, com as eleições, não sei o que vem aí. Tenho receio que o segundo semestre não acompanhe o crescimento do primeiro. E tenho a noção de que se não houver uma acalmia a seguir às eleições isso pode ter repercussões. O sector imobiliário depende muito da saúde do sector financeiro.
Há muitas variáveis em jogo...
Há muitas variáveis que nós não controlamos. Ninguém controla. E o mercado imobiliário é muito emocional. De repente há qualquer coisa e muda tudo. Por exemplo: o mercado está muito ligado ao turismo. Se houver um problema no turismo, e espero que não, isso tem um significado muito grande para o próprio imobiliário. Estamos muito dependentes do turismo das dormidas, mas não só. De todo o investimento que vem juntamente com o turismo. Hoje em dia o turista é também aquele que adquire uma casa e vem muito bom. para cá, ficando por cá. E isso é muito bom.
O que é que impulsionou esta retoma?
Nesta recuperação a que estamos a assistir o grande motor foi sem dúvida o investimento estrangeiro. Foi o que criou este ambiente propício. E isso contaminou positivamente o mercado interno, criou confiança. E também fez com que os próprios Bancos começassem a conceder crédito à habitação. Porque além de terem disponibilidade financeira, também acreditam que o ativo tem credibilidade. Porque nenhum Banco, independentemente de ter dinheiro, vai investir se não acreditar que o ativo que está a vender vai ter futuro, vai valorizar-se. Qualquer economista percebe que hoje o imobiliário está com uma credibilidade muito grande. Disponibilidade de dinheiro cria confiança às famílias e houve muitas que não contraíram empréstimos com receio, não foi só porque os bancos não concediam empréstimos. A incerteza e o receio também funcionaram aqui.
O cenário está a mudar então...
O que acho fabuloso e o que para mim é muito gratificante é o sinal que hoje em dia damos ao investidor estrangeiro, principalmente ao investidor médio, porque o grande investidor ainda continua a fazer ofertas a um valor que não deviam oferecer o que faz com que alguns negócios não se consigam fazer porque ainda vêm com a ideia de comprar tudo em saldos, porque estávamos muito fragilizados. E não é verdade. Posso dizer que neste momento, o sector financeiro tem ativos que não vai vender porque tem noção que aquilo vai valer muito mais dinheiro. Não há necessidade de precipitação. O investidor médio/alto já aceita comprar porque sabe que se comprar hoje está a comprar localização. Ainda vão ganhar dinheiro. Isso é um sinal positivo de um investidor que sabe que vale a pena investir em Portugal.
E de onde vem esses investidores? Continuamos a ter o mesmo perfil?
O primeiro investidor que continuou a comprar nestes primeiros cinco meses é o inglês, 95% se não for mais, no Algarve onde está muito fidelizado. Acho que o segundo já não vai ser o chinês mas sim o francês.
Esse é um fenómeno interessante...
O mercado francês não teve escândalos, não teve atrasos na concessão dos vistos... Ainda nas recentes missões que a APEMIP fez a França vê-se que estão a comprar. Por isso, acho que o segundo investidor imobiliário vai ser o francês e não o chinês. Mas isto tem a ver com uma estupidez nossa porque os processos de atribuição dos vistos estão parados. O que eu sei é que no mês de abril tivemos 80 e tal vistos e em maio passou para 6. Parou completamente. Tenho imensa pena e acho que isto é um crime lesa-pátria. Estão a travar a entrada de dinheiro que nos faz muita falta. E digo mais, isto tem de ser resolvido antes das eleições porque se não for, pode entrar mesmo em colapso.
Porquê?
Porque os chineses estão no limite. Eles preferem comprar cá, mas se chegarem à conclusão que isto não tem solução então vão-se mesmo embora. E acho que o pais não se devia dar ao luxo disto. Outro fator de crescimento são os brasileiros. Continuam a investir e acho que com uma grande tendência para crescer. Nos últimos anos, com tudo o que se passa nesses países, nos temos vindo a aproveitar. Isso acontece com os franceses que passavam férias e tinham residência nos países do Magrebe. A instabilidade nesses países acabou por ter efeito em Portugal. Tivemos muita sorte nesta questão do imobiliário. Portugal foi o país da Europa que mais cresceu em atracão de investimento Isto é fabuloso e revelador da dimensão que podemos ter. Nunca fomos um país que tratasse isto como um grande negócio, ao contrário de Espanha que tinha uma máquina de vendas de segunda habitação. Nós nunca tivemos essa dimensão. Mas em percentagem fomos o país da Europa que mais cresceu.
E o mercado angolano?
No caso de Angola, que era outro país investidor, é público que há uma questão de transferências e isso fez com que houvesse alterações. Esperemos que não se mantenha por muito tempo. Com os chineses é que tenho muito receio por todas estas questões burocráticas até porque eles compram ativos de maior dimensão. O sector imobiliário está a ajudar a economia, é um dos grandes responsáveis pela sua dinamização. Um euro que entra destes investidores é multiplicado por três ou quatro. Este investimento é a maior exportação que podemos ter.
Até na questão do escândalo dos vistos gold isto foi mal visto. Este é o melhor negócio e o mais controlado. O ativo fica em Portugal. Portanto se houver um problema o ativo vai estar sempre cá. Para alem de que quem compra vai gastar em decoração, paga impostos cá, alimentação, etc., etc.... Vai tentar trazer um amigo. E isso criou um clima de que Portugal esta na moda e estamos com uma imagem muito positiva.
Qual o papel do turismo nesta revitalização?
O turismo está a ter um papel fundamental. Durante muitos anos, andamos separados, mas acho que isso foi mau. Esta união resultou. O imobiliário faz com que o turismo seja mais duradouro porque as pessoas quando adquirem uma casa ficam cá com uma raiz muito maior do que vir só passar ferias. Vão ter de voltar nem que seja porque tem uma coisa que é delas.
É uma tendência para continuar?
Esta a crescer. Mas neste momento temos uma questão a resolver: a reabilitação. É o futuro, mas temos de ter a coragem de ver que em algumas zonas, até em Lisboa, não há recuperação possível, e deitar abaixo e construir de novo. Neste momento, desde que haja quem procure, já devíamos estar a construir, para a saúde do mercado imobiliário.
Vamos assistir a uma revitalização da construção civil?
Já esta a acontecer, a construção civil ligada ao imobiliário. E por isso é que o sector financeiro olha muito para a questão do sector imobiliário que sem dúvida esta a ajudar a própria recuperação do país. Está a trazer muitas divisas e esta interligação entre turismo e imobiliário está a ajudar. Mas o Governo esta a falhar nesta parte final.
Em que aspeto?
Na questão dos processos de atribuição dos vistos. Acho que está tudo cheio de medo do que aconteceu. Mas quem não cometeu erros não tem de ter medo. O excesso de zelo é terrível, nem 8 nem 80. Espero que as eleições venham rapidamente e que haja estabilidade porque este sector, tal como todos os outros, precisa de estabilidade. E acho que este ano há um potencial enorme.
E a questão do arrendamento? É um aspecto positivo para o sector?
Eu sou um adepto fervoroso do mercado do arrendamento. Nunca fui muito bem compreendido pelos meus associados, mas acho que alguns já o percebem. Acho que é o futuro. É bom para todos a dinamização do mercado de arrendamento. Mas o grande inimigo deste mercado é a carga fiscal. Enquanto tivermos a carga fiscal que temos, nunca vamos ter um mercado de arrendamento.
E o imobiliário de luxo continua em alta?
Sim, essencialmente por causa do investimento estrangeiro. O grande comprador é o investidor estrangeiro e está associado a localização. Continua a ser a Expo, Lisboa centro e o Algarve.
Que tendências vê para o sector?
A continuação do investimento estrangeiro. Acho que vai acentuar ainda mais porque Portugal tem todas as condições. Depois a recuperação do mercado interno. Está a acentuar-se, os bancos estão a emprestar dinheiro, mas com cuidado. Emprestam 80% mas as pessoas têm de ter dinheiro para as despesas. As pessoas pensam muito mais hoje em dia. Têm de pensar a longo prazo, porque a Euribor não vai ser sempre a mesma. Por arrasto vai influenciar outros sectores ligados ao imobiliário como é o caso da construção. Acho que imobiliário pode ser a grande ajuda para a construção. Depois, dependendo da conjuntura, vamos ter mudanças politicas. Mas que seja uma mudança que crie estabilidade na sociedade em geral e que a economia comece a reagir bem e que resolva alguns problemas. Temos de passar uma mensagem de cautela e moderação. Este sector é muito importante, somos responsáveis pela entrada de muito dinheiro no país. E o Estado não precisa de gastar um tostão nisso.
artigo publicado na Revista Exame n.º 376 de Agosto de 2015
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