13 novembro 2016

A reabilitação urbana e as plataformas de reservas digitais


É sabido que o aumento da rentabilidade no mercado do arrendamento de imóveis se tem assumido como um fator chave da reabilitação urbana. Na verdade, após décadas de estagnação do mercado do arrendamento, em que uma legislação protecionista dos interesses dos inquilinos, em conjunto com processos inflacionistas, determinou que os proprietários, incapazes de obter qualquer rendimento relevante dos seus imóveis, se vissem forçados a assistir à sua lenta e penosa degradação, à vista de todos, foi finalmente possível, sobretudo nos últimos 10 anos, assistir ao relançamento do mercado do arrendamento.


No caso português, entre outros fatores, a almejada rentabilidade tem sido alcançada, por um lado, por via de alterações legislativas muito relevantes, mormente ao nível do Regime Jurídico do Arrendamento Urbano, que visam permitir uma maior flexibilidade do mercado do arrendamento. Por outro lado, tem-se assistido a um aumento exponencial da procura ao nível do arrendamento para fins turísticos (de muito curta duração), levada a cabo não só por operadores turísticos organizados em modelos mais ou menos tradicionais, mas também por particulares proprietários de imóveis. 

Ora, esta segunda vertente tem sido fortemente incrementada pelas plataformas de reservas digitais que, de uma forma simples, intuitiva e global permitem a qualquer particular promover o arrendamento de um ou mais imóveis à escala mundial, convertendo-o num pequeno empresário e sobretudo complementando o seu orçamento familiar. 

E não nos deixemos enganar quanto ao impacto, nas economias das cidades, destas plataformas de reservas. Em Lisboa, no ano de 2015, cerca de 450 mil turistas terão pernoitado na cidade, recorrendo a maior plataforma de reservas do mundo para alojamento em casas particulares, duplicando os cerca de 213 mil do ano anterior. Lisboa tem, de resto, estado no TOP 10 dos destinos mais procurados na dita plataforma. Às dormidas acresce todo o demais negócio, de resto de valor muito superior, gerado nas cidades pelos visitantes que usam as ditas plataformas, designadamente gastos no comércio local, como restaurantes, mercearias ou lojas. Existem estudos que indicam mesmo que os visitantes que recorrem às ditas plataformas ficarão mais tempo e gastarão mais dinheiro nas economias locais. Trata-se de uma verdadeira mudança de paradigma, os turistas pretendem conviver e viver como os locais, dormindo onde estes dormem, comendo onde estes comem e frequentando os sítios de lazer que estes frequentam. 

Sucede que este novo paradigma, que se assume como um fator relevante no impulsionamento da reabilitação urbana, tem igualmente externalidades negativas ao nível do mercado de arrendamento tradicional, com o aumento exponencial do valor das rendas e com a indisponibilidade de casas, no mercado, para arrendamento de longa duração. Em Berlim, a solução encontrada foi a proibição, a partir do dia 1 de maio, de arrendamento de apartamentos por inteiro a turistas, sendo que quem desrespeitar a nova lei habilita-se a pagar até 100.000 euros de multa. 

Ora, se é certo que se compreende a necessidade de regulamentar o mercado, até para se permitir uma melhor concorrência e evitar a descaracterização das cidades (que se podem ver rapidamente despojadas dos seus residentes locais, cujo estilo de vida os turistas tanto procuram apreender), não nos convém, a nós portugueses, que temos um tecido urbano a precisar ainda de intensa reabilitação, esquecer as más experiências passadas ao nível da introdução de regras protecionistas que, por muito bem-intencionadas que sejam, conduziram a resultados desastrosos. Como em tudo, haverá que encontrar um equilíbrio …

Por Frederico Perry Vidal, Sócio de PLMJ, e Joana Brandão, Associada Sénior de PLMJ
Fonte: Público Imobiliário

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