26 setembro 2012

C&W: Lei das rendas – Um novo ciclo


Por Luís Rocha Antunes*

Há duas semanas, fui visitar um projeto novo em Lisboa, que apresentava a um investidor privado. O prédio brilhava e, na parte de trás, tinha um pátio amplo, arejado, que, apesar de ainda estar em obras, deixa adivinhar o fantástico espaço que ali pode ser criado.

Pequeno senão: o edifício está circundado por cinco prédios com fachadas decrépitas, entre a ruína e o vazio, a decadência e má ocupação. Comentário imediato do investidor: "O que se passou aqui? Parece que estamos em Havana!". Assim é na verdade.


Olhemos para as nossas cidades. Estes edifícios decrépitos representam uma imensa massa de capital e de poupança das famílias, caixas de previdência, Estado, seguradoras e outros investidores, que deveriam render entre 3 a 8%, e que geram valores próximos de zero, além de representarem um perigo público. São casas no centro da cidade, património de senhorios, que estão longe de se assumirem como espaços condignos e competitivos para os cidadãos habitarem, criarem impostos para o Estado, empregos para quem iria manter, gerir, limpar, trabalhar com estes ativos.

Esta é uma das mais gritantes perdas de valor acumuladas dos nossos tempos, que se acentuou com o surgir da inflação na década de 1970. São 40 anos de degradação do património e ausência de crescimento do PIB.

Agora que temos uma nova lei do arrendamento, há oportunidade para um novo fôlego e para que se faça algo de estruturante no setor. Não precisamos de programas públicos de milhões de euros. Precisamos de programas privados, com bom senso económico, operacional e realista no que se refere ao urbanismo, licenciamento e melhor uso. Quarteirão a quarteirão, prédio a prédio. Com uma disciplina financeira e económica que reflita a realidade de hoje. E a partir daí ajustar os valores de terreno a uma realidade dura: estes valores caíram. Massivamente.

Ficar com terrenos ou prédios parados nos próximos dez anos significa perda contínua de rendimento, acumular de despesas e menos valia de capital. Vivemos tempos difíceis e cinzentos, próprios de um fechar de ciclo. O novo período que se inicia tem de passar por ganhos de competitividade no setor, de que já ouvimos falar há anos, mas que agora cada um de nós tem de colocar em prática. Senhorios, inquilinos e investidores têm de se ajustar a um novo paradigma e, em conjunto, construir soluções em que todos ganhemos.

É tempo de o setor privado reconquistar os centros de cidade e devolver a dignidade e força económica perdidas nas últimas décadas. A escassez de financiamento obriga a pensar em cenários de parceria e de partilha de resultados. E, idealmente, no emergir de fundos especializados em arrendamento habitacional. Este é o tempo de fechar um ciclo focado no crescimento desregrado da mancha urbana. E de focar no parque consolidado, nos centros da cidades. Temos de olhar para a demografia, admitir a quebra de poder de compra e escassez de financiamento. E, a partir daí, construir cenários sustentáveis e competitivos. É vital refundar bases sólidas para uma nova economia, assente na poupança e não apenas no crédito; no rendimento e não apenas na valorização especulativa.

A alteração da lei das rendas pode e deve ser um catalisador deste novo ciclo.

* Partner, diretor de investimento da Cushman & Wakefield

Fonte: OJE

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