21 dezembro 2012

A competitividade do licenciamento (ii)


O País está convocado à formulação de políticas dirigidas à produção, ao desenvolvimento da economia, suporte incontornável ao bem-estar social e à sustentabilidade distributiva. Confronta-se o País - dirigentes e elites - com a tarefa irrenunciável de estimular as iniciativas em ambiente institucional favorável e sério. Mais do que batalhas verbais inúteis, interessa-nos a disponibilidade de lidar com os factos. É urgente o abandono da tendência de lidar com problemas verbais ao invés de lidar com os problemas reais.

O País estabeleceu uma Rede Nacional de Áreas Protegidas e uma Rede Natura 2000 (território europeu onde prevalece a conservação da natureza) que atinge uma dimensão muito significativa da geografia e território portugueses. E, sumariamente, as redes foram estabelecidas com fundamento no reconhecimento de territórios onde se relevavam paisagens de enorme valor estético, paisagens resultantes da produção cultural dos portugueses, elaborando territórios agrários, mosaicos de expressão múltipla, florestas produtivas e de acompanhamento, património edificado de valor arquitetónico reconhecível e sistemas urbanos de proximidade de textura amável, de observação e fruição enriquecedoras.

Ocorre, porém, que os sucessivos planos de ordenamento de áreas protegidas - e de planos de ordenamento de orla costeira - se fundamentaram em princípios de conservação extensiva e obsessiva, renunciando à economia do território, e, de tal modo, que os ativos territoriais se confrontam agora com o abandono, a degradação progressiva, a progressão de espécies infestantes, liquidando a diversidade, o mosaico de encantamento e, pior, ignorando a presença cultural do homem europeu (do homem português) como fator de valorização e conservação real das geografias e texturas culturais atrativas (e produtivas).

Suportados em fraude científica, na renúncia ao trabalho apurado e sério, na observação e confrontação com os factos e, sobretudo, em obsessão de impor institutos jurídico-administrativos de formação e reforço de tutelas (captura de renda) sobre as iniciativas e comunidades, as políticas de conservação da natureza não só se constituíram como adversárias factuais da valorização de extensos territórios - e portanto da real e útil conservação - como se indisponibilizaram a participar na aventura coletiva de formular e reforçar políticas dirigidas ao desenvolvimento atrativo e duradouro.

O País, agora convocado à renúncia da armadilha do crédito fácil, à renúncia da ausência de trabalho produtivo e à necessidade de construir cadeias de valor diferenciadoras e, de modo particular, convocado à necessidade de renunciar a políticas e Estado consumidor das energias dos portugueses, tem de afirmar presença e estímulo à construção de políticas públicas dirigidas à valorização dos recursos territoriais disponíveis, dos ativos estratégicos territoriais, estimulando as iniciativas compagináveis, estimulando a atuação do capital humano e empresarial disponível e tecnicamente capacitado.

A teia e malhas de capricho que persistem em setores abrangentes (e específicos) da administração pública portuguesa - mais favorável à manutenção de interesses corporativos institucionais do que à reforma e mudança - inibem a formulação de corretas políticas públicas dirigidas à valorização do território, persistem no estado de negação do empobrecimento promovido, permanecem na indisponibilidade de reconhecer a iniciativa como parceira incontornável da tarefa do desenvolvimento, da empregabilidade e do retorno à formulação adequada de cadeias produtivas - na agricultura, na floresta, no agroindustrial, no turismo, no repovoamento, no estímulo demográfico.

Mais excessivos do que as diretivas comunitárias que suportaram a origem da estratégia nacional de conservação da natureza - que, no dizer de George Steiner, na Europa, é de produção cultural - e, sobretudo, renunciando ao dever ser dos programas de gestão articulados e coordenados em função da economia e bem-estar social, o setor específico da administração pública traduz, hoje, uma das mais sérias componentes de necessidade de mudança e reforma do Estado português. O desafio ao setor do ordenamento do território e urbanismo - onde deve prevalecer a dimensão económica e social - é, em Portugal, um vetor de urgência e, sobretudo, de confrontação e rutura com práticas do passado cujos resultados - à vista - se traduziram em empobrecimento, degradação, desertificação económica e despovoamento dramático.

O País sério exige, no setor, uma mudança na política (e prática) significativa; mudança atenta, dura e exigente à alteração do percurso de favorecimento do empobrecimento; em benefício da valorização territorial (quando?), da eliminação da fraude científica e administrativa, do estabelecimento de domínios económicos duradouros, atrativos e expoentes da identidade das comunidades: mudança e rutura a prosseguir em prejuízo de interesses institucionais não fundamentados e a bem dos portugueses.

A legitimidade democrática obriga à consideração urgente de políticas públicas distintas, estimuladoras à estabilização e geração de oportunidades à iniciativa das famílias e empresas, tarefa maior do bom Governo.

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Por Carlos Lourenço Fernandes, Pg Ciência Política, IEP/UCP
Fonte: Oje

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