11 dezembro 2013

Novamente as bolhas imobiliárias


Existe um consenso generalizado de que o rebentar de uma série de bolhas do mercado imobiliário desencadeou a crise financeira mundial de 2008-2009, juntamente com a grave recessão que se seguiu. Ainda que os Estados Unidos sejam o caso mais conhecido, a combinação de regulação e supervisão ambíguas para os bancos e uma política de baixas taxas de juro alimentou bolhas semelhantes no Reino Unido, Espanha, Irlanda, Islândia e Dubai.
Agora, cinco anos depois, os sinais de espuma, se não de bolhas não formadas, estão a reaparecer nos mercados imobiliários na Suíça, Suécia, Noruega, Finlândia, França, Alemanha, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e, agora um regresso, no Reino Unido (bem, Londres). Nos mercados emergentes, as bolhas estão a aparecer em Hong Kong, Singapura, China e Israel e, nos principais centros urbanos na Turquia, Índia, Indonésia e Brasil.


Os sinais de que os preços das casas estão a entrar em território de bolha nessas economias incluem a subida rápida dos preços das casas, rácios entre os preços e os rendimentos elevados e em crescimento e elevados níveis de dívida hipotecária em percentagem de dívida das famílias. Na maior parte das economias avançadas, as bolhas estão a ser inflamadas por taxas de juro de curto e longo prazo muito baixas. Tendo em conta o crescimento anémico do PIB, o elevado desemprego e a baixa inflação, o grande volume de liquidez criado pelas decisões de política monetária convencionais e não convencionais estão a impulsionar os preços dos activos, a começar com os preços das casas.

A situação é mais diversa nas economias dos mercados emergentes. Algumas que têm elevados rendimentos per capita – por exemplo, Israel, Hong Kong e Singapura – têm baixa inflação e querem manter políticas de baixas taxas de juro para prevenir a valorização das taxas de câmbio contra as principais moedas. Outras são caracterizadas pela elevada inflação (mesmo acima da meta do banco central, como na Turquia, Índia, Indonésia e Brasil). Na China e na Índia, as poupanças estão a ser destinadas para a compra de casas, porque a repressão financeira deixa as famílias com poucos activos diferentes que proporcionem um bom refúgio contra a inflação. A rápida urbanização em muitos mercados emergentes tem também impulsionado os preços das casas, com a procura a superar a oferta.

Como os bancos centrais – especialmente nas economias avançadas e nas economias emergentes de elevados rendimentos – se mostram cautelosos na utilização das taxas de juro para combater as bolhas, a maior parte dos países recorrem à regulação e supervisão macro-prudenciais do sistema financeiro para conduzir os mercados imobiliários efervescentes. Isso significa que os rácios entre crédito e o valor mais baixos, normas mais estritas na subscrição de hipotecas, limites no financiamento da segunda casa, almofadas de capital anti-cíclicas mais elevadas para empréstimo imobiliários, encargos de capital permanentes dos empréstimos mais elevados e restrições do uso dos fundos de pensões para o pagamento da entrada da compra de casas.

Na maior parte das economias, estas políticas macro-prudenciais são modestas, devido aos constrangimentos políticos das autoridades: famílias, promotores imobiliários e os responsáveis políticos democraticamente eleitos protestam ruidosamente quando o banco central ou a autoridade de regulação responsável pela estabilidade financeira tenta eliminar o volume de liquidez. Queixam-se amargamente sobre a “interferência” dos reguladores no mercado livre, direitos de propriedade e o ideal sacrossanto da propriedade de casas. Assim, a economia política de financiamento imobiliário limita a capacidade dos reguladores de fazerem a coisa certa.

Para ser claro, as restrições macro-prudenciais são necessárias; mas têm sido insuficientes para controlar as bolhas imobiliárias. Com as taxas de juro de curto e longo prazo tão baixas, as restrições do crédito à habitação parecem ter um efeito limitado nos incentivos para endividar-se para comprar uma casa. Além disso, quanto maior foi o diferencial entre as taxas de juro oficiais e os juros mais elevados no crédito hipotecário como resultado das restrições macro-prudenciais, maior é o espaço que existe para arbitragem regulatória.

Por exemplo, se os rácios entre o crédito e o valor são reduzidos e as entradas para a compra de casa são mais elevados, as famílias podem ter um incentivo para pedir emprestado aos amigos e família – ou aos bancos na forma de empréstimos pessoais sem garantia – para financiar o pagamento da entrada. Acima de tudo, embora a inflação dos preços das casas tenha abrandado de forma modesta em alguns países, os preços das casas ainda estão a aumentar no geral nas economias onde se recorre às restrições macro-prudenciais no crédito hipotecário. Enquanto as taxas oficiais – e, assim, as taxas de juro de longo prazo do crédito – permanecem baixas, algumas restrições não são tão eficazes como seriam de outra forma.

Mas, as novas bolhas imobiliárias da economia mundial podem não estar prestes a rebentar ainda, porque as forças que as seguram – especialmente o dinheiro fácil e a necessidade de se proteger da inflação – continuam a funcionar plenamente. Além disso, muitos sistemas bancários têm almofadas de capital maiores do que no passado, habilitando-os a absorver perdas relacionadas com uma correcção nos preços das casas; e, na maior parte dos países, o património líquido das famílias com as suas casas é maior do que era durante a bolha do “subprime” nos Estados Unidos. Mas, quanto mais os preços das casas sobem, mais irão descer – e maior será o prejuízo económico e financeiro colateral - quando a bolha esvaziar.

Em países onde os empréstimos sem responsabilidade indirecta de terceiros permitem aos credores abandonar uma hipoteca quando o seu valor excede o da sua casa, a crise imobiliária pode levar a incumprimentos massivos e crises bancárias em grande escala. Em países (por exemplo, Suécia), onde os empréstimos com responsabilidade indirecta de terceiros permitem o confisco do rendimento das famílias para satisfazer o pagamento das obrigações hipotecárias, o consumo privado pode cair, ao impedir os pagamentos de dívidas (e eventualmente subida das taxas de juro) e de qualquer despesa discricionária. De qualquer maneira, o resultado seria o mesmo: recessão e estagnação.

O que estamos a testemunhar em muitos países parece uma reprodução em câmara lenta do último descarrilamento do mercado imobiliário. E, como da última vez, quanto maior as bolhas se tornam, mais desagradável será a colisão com a realidade.

Nouriel Roubini é presidente da consultora global de macroeconomia Roubini Global Economics e professor de Economia na Stern School of Business da Universidade de Nova Iorque.

Copyright: Project Syndicate, 2013.

Tradução de Raquel Godinho

Fonte: Negócios

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