14 abril 2014

Contestação: Edifícios reabilitados sem reforço sísmico


Entrou esta semana em vigor a lei low cost para a reabilitação. 
A pressão da opinião pública será fundamental para fazer o Governo retroceder na sua decisão de não tornar obrigatório o reforço sísmico nas obras de reabilitação urbana, algo que permitirá que se mantenha o cenário de "mortandade e destruição em larga escala" em caso de um novo terramoto em Lisboa. Um alerta lançado pelo engenheiro sísmico Mário Lopes, a propósito do normativo que entrou em vigor na passada quarta-feira e com o qual o Governo permite que as operações de reabilitação urbana possam estar dispensadas de cumprir certos requisitos legais (desde a eficiência energética às acessibilidades, passando por instalações de gás, áreas mínimas de habitação, isolamento térmico e acústico, entre outros). 


"É dada luz verde às pessoas para irem habitar um imóvel que, sendo vendido como estando reforçado, será o túmulo dos seus ocupantes em caso de sismo, pois não deixou de estar em elevado risco de desabar", salientou ao Mário Lopes.

Com um período de vigência de sete anos, o pacote de medidas foi rotulado corno low cost por permitir, segundo estimativas do Executivo, baixar os custos da reabilitação entre 30 a 40%. 

Já quanto à segurança sísmica, merece um parágrafo: o artigo 9°, sobre "Salvaguarda estrutural", estipula que "as intervenções em edifícios existentes não podem diminuir as condições de segurança e de salubridade da edificação, nem a segurança estrutural e sísmica do edifício". Um argumento "falacioso", dizem os críticos.

"Se uma casa tiver uma capacidade de resistência de 10% do que deveria ter e se for reabilitada de maneira a que simplesmente essa percentagem não diminua, as pessoas vão morar para lá sem saberem, como qualquer consumidor deve saber ao comprar um qualquer produto, do perigo de morte que a mesma representa", contesta Mário Lopes, professor no Instituto Superior Técnico (IST).

O teto não cai na Assembleia da República 

Os críticos da nova legislação alegam que a mesma faz tábua rasa das recomendações que os peritos de sismologia e o próprio Parlamento têm feito no sentido de ser garantida a "obrigatoriedade de segurança estrutural antissísmica nos programas de reabilitação urbana existentes ou a criar". 

Uma exigência baseada em sucessivos alertas sobre a especial vulnerabilidade a sismos de maior intensidade das malhas urbanas da Grande Lisboa (incluindo bacias do Tejo e do Sado), mas também Alentejo e Algarve. Receios que levariam, aliás, a Assembleia da República a mandar realizar, em 2009, com caráter de urgência, obras de reforço sísmico no edifício de São Bento, protegendo os deputados da Nação no seu local de trabalho. 

Para aquele especialista, além de "moral e eticamente inaceitável", a medida é economicamente errada. "Depois de feita a reabilitação sem acautelar estes aspetos fulcrais, mais tarde, quando quiser corrigir essas lacunas, o Estado já vai pagar muito mais porque quando se faz uma obra de reabilitação executa-se uma série de trabalhos que depois será preciso destruir para fazer o reforço sísmico". 

E não se trata de uma questão de fundamentalismo, salienta Mário Lopes: "Até pode ser positivo que se baixe a fasquia da qualidade em algumas vertentes da reabilitação urbana, como pretende o Governo, de forma a incrementar esse tipo de obras; mas não se pode colocar no grau zero a segurança dos edifícios".

Como exemplo de postura "não extremada", o engenheiro sísmico salienta a proposta apresentada há cerca de um ano, em que um grupo de 25 especialistas, depois de visitarem e analisarem as melhores práticas em países mais avançados nesta matéria (EUA, Itália, Nova Zelândia e Japão), sugeriu o cumprimento de um, rácio mínimo de 75% da capacidade de resistência sísmica que é exigida no caso da construção nova.

Poupança de €20 por m2 

O argumento de que o reforço sísmico poderia ser demasiado caro, ao ponto de inviabilizar muitas obras de reabilitação, também é refutado.

"A experiência demonstra que, na maioria dos casos, os acréscimos de custos variam entre 20 a 100 euros por m2, sendo o valor dos bens a proteger - o edifício a reabilitar e mais o seu recheio - normalmente de 700 euros o m2 ou mais", explica o engenheiro.

Estes e outros argumentos foram aduzidos numa carta aberta enviada, em meados de março, ao Presidente da República, da qual Mário Lopes foi o primeiro subscritor entre 13 especialistas (na sua maioria professores do Técnico, mas também de outras universidades, e especialistas do LNEC).

O objetivo da carta aberta era que Cavaco Silva vetasse o diploma, o que não viria a suceder. "Agora é importante que a opinião pública tome posição e pressione o Governo a ter outra postura", frisa Mário Lopes.

A realidade atual do país não se compadece, porém, com o que seria ideal. Este foi o tom de algumas das reações públicas de governantes da tutela a propósito das reivindicações de engenheiros e arquitetos especialistas nesta área.

Nesse sentido, o ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e da Energia, Jorge Moreira da Silva, afirmou, aquando da aprovação do RERU em Conselho de Ministros de 20 de fevereiro, que "na prática, e de acordo com os cálculos feitos, este diploma vai permitir reduzir o custo da construção entre 20% a 40%".Um valor significativo só possível de atingir pelo baixar de exigências a vários níveis na obra de reabilitação.

Fonte: Expresso

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