13 julho 2014

Rendas: Deco mostra como negociar com o senhorio


A atualização das rendas antigas gerou fortes conflitos entre proprietários e inquilinos, mas os números do inquérito da Dinheiro & Direitos provam que vale a pena negociar: um terço dos senhorios aceitou a contraproposta do arrendatário.
Senhorios e inquilinos padecem dos mesmos males: atualização das rendas, desacordo sobre a realização de obras no imóvel e sobre o pagamento de algumas despesas, como quotas do condomínio e IMI (geralmente, a cargo dos proprietários), estão entre as principais preocupações de quem se encontra de cada um dos lados da barricada. 

Quando, na base da discussão está dinheiro ou, neste caso, o aumento da renda, ter um contrato antigo ou um contrato posterior a 1990 parece fazer toda a diferença. Segundo o inquérito que a Dinheiro & Direitos realizou junto de mais de 1.760 inquilinos e senhorios, para 60% dos contratos antigos, a atualização da renda gerou discórdia.

Aos contratos anteriores a 1990, pertencem as chamadas rendas antigas, em regra, muito baixas. Para a atualização destas, a nova lei, em vigor desde Novembro de 2012, estabelece um mecanismo de negociação entre senhorio e inquilino. Com isto, pretende-se que as pequenas rendas sejam revistas até se aproximarem dos atuais valores de mercado, praticados nos contratos mais recentes. Não é, assim, de estranhar que mais de metade dos inquiridos com arrendamentos anteriores a 1990 tenha recebido pedidos de atualização por parte do senhorio. 

Em contrapartida, os contratos mais recentes não só contemplam preços mais elevados, como são alvo de atualização anual com base num índice publicado todos os anos pelo Instituto Nacional de Estatística. Talvez por isso se tenha assistido, em alguns destes contratos, a um fenómeno inverso ao dos contratos antigos - foram revistos a pedido dos inquilinos. Os resultados da Dinheiro & Direitos indicam que um em cada cinco arrendatários com contratos recentes tentou negociar um "desconto" nos últimos três anos. Destes, dois em cada cinco acabaram por ser bem-sucedidos, com uma redução média na casa dos 20%. 

Dos 170 aos 360 euros por mês 

A esmagadora maioria dos inquilinos opta por arrendar a casa vazia. Em média, os inquiridos pagam 250 euros todos os meses. Desagregando os resultados, verifica-se que quem arrendou antes de 1990 suporta rendas bastante mais baixas: em média, desembolsa 168 euros por oposição aos 355 euros pagos por quem arrendou depois daquela data. 

Quase metade dos inquilinos considera justo o preço do seu arrendamento. Mas, tendo em mente o tamanho, a qualidade e a localização da casa, quase 20% dos arrendatários com contratos posteriores a 1990 julgam-na demasiado cara, sentimento partilhado por apenas 10% de quem tem urna renda antiga.

Proprietário e inquilino têm liberdade para estipular quem paga as despesas extra, como as quotas do condomínio, a água, a luz e até o imposto municipal (IMI). Tendo em conta os resultados do inquérito da publicação da Deco, que apontam esta questão corno uma das mais problemáticas - referida por quase 30% dos inquilinos e 15% dos senhorios -, o mais prudente é deixar por escrito a quem cabe o pagamento do quê. Ainda assim, quase 40% dos proprietários assumem o pagamento deste tipo de despesas. Quando nada fica definido no contrato, as regras são as seguintes: as despesas com o fornecimento de energia eléctrica ou térmica, água, gás, limpeza e segurança são da responsabilidade de quem mora na casa; os encargos com a administração, conservação e fruição de partes comuns do edifício, bem como os seguros e serviços de interesse comum, correm por conta do senhorio. 

Caução e IRS: duas estratégias para precaver danos e atrasos 

Três em cada cinco senhorios afirmaram exigir caução ao inquilino corno garantia, caso tenham de suportar, no final do contrato, despesas inesperadas com água, luz, limpeza e reparação de danos. Assim, aquando da celebração do contrato, é comum pedir-se o correspondente a um mês de renda, ainda que possa ser acordado outro valor. 

Em regra, quando o negócio é feito por intermédio de uma imobiliária, esta fica sempre com um mês de caução, pelo menos, a título de pagamento do serviço. Quando o contrato é assinado diretamente entre proprietário e inquilino, a caução nem sempre é exigida. Só em dois terços dos casos os inquiridos dizem ter havido lugar ao pagamento desta garantia. 

A lei permite que as partes possam acordar a antecipação do pagamento da renda até ao máximo de três meses, pelo que, na prática, um inquilino pode ter de desembolsar de uma só vez o correspondente a quatro rendas (três, acrescidas da caução). 

As dificuldades e os atrasos nos pagamentos são as principais preocupações dos senhorios quando assinam um novo contrato de arrendamento. Para tentar precaver esse problema, cerca de um quarto exigiram que o inquilino comprovasse a sua capacidade financeira, sendo que estes números se mostraram mais expressivos quando o negócio foi concretizado com o recurso a uma agência imobiliária O recibo do último salário e a declaração de IRS mais recentes correspondem aos documentos mais solicitados. Outra possibilidade é a exigência de um fiador como garantia, o que aconteceu a um terço dos inquilinos. 

Ainda hã casas para a vida 

Embora a maioria dos arrendatários tenha encontrado casa através de um familiar ou de um amigo, a internet tem vindo a ganhar peso na pesquisa. Nos últimos cinco anos, quase um quarto dos inquiridos encontraram casa por esta via. 

Do mesmo modo, o recurso a intermediários tem vindo a aumentar. Estes foram responsáveis por cerca de um terço dos arrendamentos desde 2008. Nestes casos, é necessário pagar a comissão, que, à partida, fica a cargo do senhorio.

Cerca de 15% dos inquilinos do inquérito da Dinheiro & Direitos não fizeram o contrato de arrendamento por escrito, algo que a nova lei prevê combater. Até Novembro de 2012, todos os contratos com duração igual ou inferior a seis meses não precisavam de ser escritos. Era o que se passava, sobretudo, com o arrendamento para habitação não permanente, por exemplo, em zonas balneares ou noutros locais de lazer. Mas, desde Novembro de 2012, todos os contratos têm de ser celebrados por escrito, seja qual for a sua duração. 

Até 2012, era possível arrendar um imóvel para habitação permanente por um prazo certo ou por duração indeterminada, nunca inferior a cinco anos nem superior a trinta. Com a nova lei, senhorio e inquilino podem estipular livremente a duração, não havendo um prazo mínimo. Se nada ficar definido, considera-se que foi celebra-do por dois anos (ao invés de assumir-se que é por duração indeterminada, como acontecia antes). 

Mais de um quarto dos contratos dos inquilinos inquiridos goza de um prazo de cinco anos. Mas a maioria, cerca de 60%, ainda pertence aos chamados "arrendamentos para a vida", ou seja, tem duração indeterminada. 

De acordo com os senhorios, cerca de 90% dos contratos foram inscritos nas Finanças, percentagem corroborada pelos inquilinos. 

Obras, para que vos quero? 

A lei é clara: em regra, todas as obras cabem ao senhorio, salvo se as partes definirem por escrito o contrário. E, se, por falta de obras da responsabilidade do senhorio, a habitabilidade do imóvel ficar comprometida, o inquilino tem direito a terminar o contrato. Algo que, em teoria, não levanta dúvidas é, afinal, razão para muitas disputas, como demonstram os resultados do inquérito. Mais de 15% de todos os inquilinos que participaram no estudo afirmaram já ter tido desavenças como senhorio sobre obras no imóvel. 

Por seu turno, o inquilino só pode fazer obras se o contrato o previr, com autorização escrita do senhorio ou em situações de urgência (fuga de água, por exemplo). Relativamente a estes dois casos, pode constar do contrato uma cláusula que impossibilita o inquilino de pedir urna indemnização por eventuais obras que faça, mesmo que autorizadas pelo senhorio. O inquilino não está, no entanto, impedido de introduzir pequenas alterações para seu conforto, como furos que permitam instalar um aparelho de ar condicionado, montar armários ou pintar as paredes. Ainda assim, e a menos que tenha acordado algo diferente, deve restituir o imóvel no estado em que lhe foi entregue.

Como é evidente, a questão nem sempre é pacífica. Aquilo que o inquilino considera uma melhoria pode ser visto como uma deterioração pelo senhorio. Cerca de 60% dos senhorios queixaram-se de danos na habitação após a saída dos inquilinos. No entanto, apenas um em cada quatro lesados acionou a caução ou exigiu o pagamento dos custos da reparação. Em média, a despesa traduziu-se em cerca de 1.100 euros, quase nunca recuperados na totalidade pelos proprietários. 

Nos casos em que a caução não foi acionada, a maioria dos senhorios reteve-a como forma de pagamento do último mês de renda.

Relação termina a bem... ou a mal 

Os contratos de arrendamento podem terminar por diversas razões: por ter sido atingido o prazo, por vontade das partes, por circunstâncias da vida do inquilino ou do senhorio, por contingências do imóvel e por actos contrários à lei. 

A principal razão para os inquilinos porem fim ao contrato de arrendamento é a necessidade de uma casa maior ou mais confortável, razão partilhada por 45% dos inquiridos, ou por precisarem de viver noutro local, motivo indicado por 20%. 

Precisarem do imóvel para si ou para um membro da família foi a justificação avançada por 15% dos senhorios que decidiram pôr fim ao contrato, algo que está previsto na lei. 

Nos casos em que a relação terminou mal, a falta de pagamento da renda foi quase sempre a principal responsável: um quarto dos senhorios admitiram já terem sido obrigados a despejar um inquilino. Na sua origem, estiveram sempre rendas em atraso (86% dos casos). Um quarto dos inquilinos notificados abandonaram a casa ao fim de dois meses, mas cerca de 40% demoraram entre três meses e um ano. Um em cada sete ainda não tinha saído quando a Dinheiro & Direitos realizou o estudo, sendo que a maioria já tinha sido notificada há, pelo menos, dois anos. Mesmo nas situações em que o processo de despejo correu em tribunal, mais de metade dos inquilinos precisou de três a seis meses para cumprir a ordem. 

Na esmagadora maioria dos casos em que houve despejo, os senhorios nunca conseguiram recuperar as rendas atrasadas e perderam, em média, 2.870 euros. Apesar disto, apenas 47% tentaram reavê-las pela via judicial, ainda que sem resultados práticos até ao momento em que responderam ao questionário da Dinheiro & Direitos.

DINHEIRO & DIREITOS ACONSELHA 
  • É obrigatório fazer o contrato por escrito, qualquer que seja a duração do arrendamento. As partes devem ser identificadas, pelo menos, através do nome e dos números de identificação civil e de contribuinte. 
  • É também necessário identificar o imóvel: localização, certificado energético e licença de utilização, se houver. Não existindo, deve ser feita uma referência à declaração das Finanças confirmando que o imóvel é anterior a 1990. Deve ainda constar do contrato se o imóvel se destina ou não a habitação. Há que ter em conta o título constitutivo da propriedade horizontal, para saber se pode ser arrendado, por exemplo, para escritórios. 
  • O contrato deve mencionar a renda e o regime de actualização, a duração e questões que possam diferir do previsto na lei, como as obras ficarem a cargo do inquilino. 
  • Alguns arrendamentos incluem mobília ou serviços, como segurança ou limpeza. Nestes casos, o mais habitual é acordar-se uma única renda. Mas as partes podem fixar dois montantes, um para o imóvel, outro para os móveis, por exemplo. De qualquer modo, deve ser anexada uma lista dos bens incluídos e o seu estado de conservação. 
  • O contrato deve ser registado nas Finanças. De contrário, inquilino e senhorio não podem aceder aos benefícios fiscais e, em caso de incumprimento, o senhorio fica impedido de recorrer ao balcão nacional de arrendamento (https://bna.mj.pt), o processo mais rápido para despejar um inquilino e recuperar o imóvel. 
Fonte: Diário Económico

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