18 outubro 2014

As novas tendências do mercado imobiliário - Parte II


Na Parte I desta “crónica” tentei traçar o actual panorama do sector imobiliário em Portugal Continental, identificando os factores e os segmentos que têm contribuído para a forte retoma do mesmo. Importa agora, transpô-los para a realidade regional.

A crise que assolou o sector imobiliário deixou marcas profundas na Madeira, que os dados estatísticos relativos aos anos “negros” de 2008 a 2013 bem evidenciam.

Com efeito, enquanto no ano de 2007 foram celebradas 9.165 escrituras de compra e venda, no ano de 2013 foram celebradas apenas 3.084. No que diz respeito a valores transaccionados, passou-se de Eur 35.462.000 (2207) para Eur 9.996.000. Finalmente, o número de edifícios licenciados desceu de 1.019 (2007) para 265 (2013).

Muito embora ainda não existam dados estatísticos fiáveis, segundo os testemunhos de vários intervenientes do sector, a partir do ano de 2014 esta tendência começou lentamente a inverter-se. No entanto, tudo indica que a retoma do mercado regional tem sido feita essencialmente à custa do segmento habitacional médio-baixo, e de algum investimento estrangeiro pontual e não “sistematizado”, sendo certo que as 4 “vagas” (emigrantes, turistas recorrentes, CINM e construção civil) que potenciaram o desenvolvimento do sector imobiliário regional parecem estar tendencialmente esgotadas.

Ora, este perfil de investidores e de investimentos não será, à partida, suficiente para assegurar a retoma do mercado imobiliário regional, designadamente em termos que permitam perspectivar um futuro risonho para o mesmo. Em concreto, os mesmos não garantem um número e/ou um montante de transacções que permitam o saneamento bancário/financeiro dos promotores imobiliários regionais, e abrir plafonds para realização de novos investimentos, pelo que a Madeira corre o sério de ficar, a curto prazo, sem promotores e/ou sem activos que se enquadrem nos “desejos” dos investidores.

Assim, é fundamental entrar no mercado chinês, potenciar o (já expressivo) mercado russo, “atacar” os alvos preferenciais do regime fiscal do residente não habitual e colocar a Madeira no radar de actuação dos fundos de investimento. E é também necessário ajustar a oferta, encontrando (ou “criando”) activos que se enquadrem – em número e em tipologia – na procura, ou seja, os segmentos habitacional médio-alto, do retalho “prime” e do turismo.

Para tanto, há que promover externamente, e sem complexos de insularidade e de ultraperiferia (o que representa uma hora e meia a mais de avião para um chinês?) a Madeira, não só como destino turístico, mas como o potencial “Hawai da Europa”, ou seja, uma localização – quase – perfeita para a realização de investimentos imobiliários por reformados ou expatriados, ou por quem apenas procura uma 2.ª habitação, para férias ou residência sazonal.

Mas para o fazer eficazmente, é fundamental que os promotores e os mediadores imobiliários, conjuntamente com as associações e entidades públicas competentes, unam esforços – abdicando de rivalidades e egocentrismos – quer no sentido de criar um portfolio relativamente volumoso e coerente de activos a apresentar aos potenciais investidores, quer no sentido de identificar e trazer à Madeira quem os representa e poderá estabelecer as indispensáveis “pontes”.

De igual forma, e para tornar os activos atractivos, é necessário não só encontrar formas de garantir que os mesmos são susceptíveis de gerar rendimentos (exigindo-se arrojo e criatividade aos respectivos proprietários), mas também assegurar a disponibilização e sistematização dos dados (financeiros e jurídicos) relativos aos mesmos, superando-se uma certa tendência dos promotores e dos activos para a “opacidade”.

E no que diz respeito ao sector público, seria essencial (re)pensar seriamente aquilo que efectivamente se pretende quer em termos de “diplomacia económica” e de relacionamento com a diáspora portuguesa (e não só madeirense), quer em termos de política para o sector de turismo, fomentando, por um lado, a entrada de investidores estrangeiros, por contraposição a uma tradição de proteccionismo, e, por outro, a eventual revisão do dogma da aposta no “turismo geriátrico”.

Para além do mais, e para que – passe a publicidade – o Hostel Santa Maria e o Armazém do Mercado não constituam os únicos (bons) exemplos de sintonia entre a oferta e a actual procura, designadamente em termos de activos turísticos e comerciais, e de intervenções em zonas históricas/tradicionais, é imperioso que a Câmara Municipal do Funchal defina uma verdadeira estratégia de reabilitação urbana para a Zona Velha e para a Baixa do Funchal, assim criando o enquadramento legal e fiscal que permita aproveitar as oportunidades (únicas) que a reabilitação da frente-mar do Funchal irá criar.

Em suma, as potencialidades inatas do mercado imobiliário regional são muitas e podem enquadrar-se nas actuais (e verdadeiramente relevantes/estruturantes) tendências da procura, sendo certo que as oportunidades estão mesmo aqui ao lado. Cabe às entidades (privadas e públicas) do sector decidir se preferem “comer as migalhas ou o bolo inteiro”.

Veja a Parte I deste artigo

Por Gonçalo Maia Camelo, Advogado da SRS Advogados
Fonte: DN

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