27 junho 2016

Contrato-promessa de compra e venda da mesma fracção anteriormente celebrado pelo proprietário


Depois de ver os apartamentos num edifício recentemente concluído, o que mais me agradou já tinha sido objeto de promessa de venda. Depois de decidir comprar outro apartamento no mesmo empreendimento, disseram-me que, se quisesse, poderia ficar com o apartamento que me tinha agradado mais porque o comprador não se importava de ficar com outro mais pequeno.


A ideia agradou-me muito mas a pessoa que ia comprar o apartamento já tinha um contrato assinado e receio vir a ter problemas por causa disso. Receio que, depois de pagar, o anterior comprador me possa impedir de fazer a escritura. O que devo fazer? 

Apesar de nos terem garantido que iriam formalizar a revogação do CPCV celebrado entre ambos, devemos exigir algum documento que comprove a anulação do negócio? Isto é, sendo realizada a escritura em nosso nome, poderá no futuro existir algum problema caso o anterior promitente-comprador viesse reclamar algum “direito de preferência”?» 

A resposta à questão colocada depende do tipo de contrato que poderá ter sido celebrado entre o promotor do empreendimento e o outro promitente-comprador. Isto porque, em princípio, um contrato tem eficácia meramente obrigacional, ou seja, só vincula quem o celebra, pelo que só produz efeitos em relação a terceiros, ou seja, em relação ao leitor, nos casos e termos especialmente previstos na lei. 

Precisamente, um dos casos previstos na lei, em que o contrato-promessa passa a produzir efeitos relativamente a terceiros, é o que a lei designa como promessa com eficácia real. 

Não obstante os interessados raramente celebrem contratos-promessa com eficácia real, o certo é que, este tipo de contrato, precisamente por ser oponível a terceiros, confere mais garantias ao promitente-comprador mas só pode incidir sobre bens imóveis ou móveis sujeitos a registo e torna-se eficaz perante terceiros, no caso de o seu objeto ser um imóvel, se for celebrado por escritura pública ou documento particular autenticado, mediante declaração expressa nesse sentido e inscrição no registo predial. 

Mesmo que o contrato-promessa não seja celebrado com a referida eficácia real, se as partes apenas pretenderem dar conhecimento do mesmo a terceiros, poderão registá-lo na Conservatória do Registo Predial. 

Ainda que, nestes casos, o registo fique feito provisoriamente, o certo é que o mesmo poderia provocar constrangimentos à celebração da escritura de compra e venda e até a todo o processamento de eventual financiamento bancário. 

Assim sendo, se o contrato celebrado anteriormente pelo promotor imobiliário era um contrato-promessa sem eficácia real e não registado, o então promitente-comprador não poderá opor ao leitor o contrato por ele celebrado, a não ser através do registo de ação judicial de execução especifica baseada no incumprimento do contrato, devidamente registada. 

Por tudo o exposto, será conveniente que o leitor se certifique de que o proprietário do imóvel revogou o contrato anteriormente celebrado e recomenda-se, até, a consulta da descrição de aquisição do imóvel e respetivas inscrições, no registo predial dado que, efetivamente, o registo do contrato poderia provocar algum constrangimento à própria realização da escritura e até ao processamento de eventual financiamento bancário, caso o leitor pretenda a ele recorrer.

Por Maria dos Anjos Guerra, Legal & Imobiliário, Gabinete de Advogados
artigo publicado no Suplemento Vida Judiciária do Vida Económica n.º 1644, de 23 de junho de 2016

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