01 abril 2012

Oportunidades (e pontos fracos) dos hotéis portugueses


Grupos consolidados terão mais condições para resistir à crise. Mas os hotéis demasiado alavancados terão os dias contados
A hotelaria está a viver um cenário de dificuldades que se reflecte nas baixas taxas de ocupação das unidades e, consequentemente, no emagrecimento das receitas. Não admira, por isso, que este seja um dos sectores a sofrer uma profunda reestruturação, que poderá passar pela fusão entre cadeias e pela venda de unidades a investidores e a cadeias internacionais com maior ‘know how’. A banca terá um papel activo em grande parte dos processos de reestruturação. “As fusões entre as empresas serão promovidas pela banca, que controla grande parte dos activos”, antecipa o vice-presidente da Confederação do Turismo Português, Elidérico Viegas, ao Diário Económico.

Sabendo-se que os investimentos estão alavancados pela banca, são conhecidos vários casos de grupos portugueses que entraram em incumprimento, inclusive em processo de insolvência, por força das exigências impostas pela ‘troika’. Num trabalho feito nos últimos meses, a consultora imobiliária Worx estudou cerca de 70 hotéis de quatro e de cinco estrelas em Portugal, num total de 7.500 quartos. Para o director do departamento de avaliação da consultora, José Covas, “infelizmente, a maioria das unidades que analisámos não se encontra bem gerida ou preparada para o futuro”. Embora destaque que “existem ‘players’ melhor preparados que outros”, José Covas tem consciência de que “se assistirá a mais falências no sector”.
O especialista adverte que um dos aspectos relevantes para a viabilização dos empreendimentos turísticos prende-se com o peso do financiamento bancário e defende que até podem surgir oportunidades de negócio. “Uma estratégia sempre válida serão as fusões, procurando ligar-se a uma cadeia internacional para ter novos canais de distribuição”, explica o presidente da Hoti Hotéis, Manuel Proença, representa no país a cadeia espanhola Meliá.
Esta semana, aliás, foi divulgada a fusão entre os grupos Lágrimas e Alexandre Almeida, cadeias que actuam num segmento de mercado de charme, em locais como Coimbra, Bussaco, Curia, Porto e Lisboa. Embora na primeira fase a operação se traduza apenas numa fusão operacional e não de propriedade, o presidente do grupo Lágrimas, Miguel Júdice, adianta que “a gestão conjunta do portefólio permitirá reduzir os custos operacionais em 10%”. Para o gestor, o relevante desta operação é tornar “a empresa mais sólida, permitindo ganhos de escala para afirmar a cadeia a nível exterior”.
As duas cadeias passam a gerir oito hotéis, com um total de 700 quartos, sendo que em 2011 ultrapassaram um volume de receitas de 20 milhões de euros.
Ganhar a dimensão necessária
A notícia da fusão Lágrimas/Alexandre Almeida desencadeou uma reacção de outros empresários, que se mostraram interessados em propor negócios de venda de hotéis. “Fui contactado, quase de imediato, por dois empresários a propor negócios de venda de unidades”, revela Miguel Júdice. Na sua opinião, este facto não significa que as unidades estão a ser “mal sucedidas”, sendo apenas situações pontuais de hotéis que se encontram a ser “geridos por profissionais ligados a outros negócios e que nesta altura preferem vender”.
No seu caso, a proposta de fusão, agora anunciada, “cria propostas de valor para que outros hotéis se juntem à nova cadeia”, prevendo que possam “rapidamente aumentar os activos em 50%”.
Já para Manuel Proença, “há sempre lugar para hotéis que se posicionem em nichos de mercado, em novos conceitos e experiências”. Basta dar com exemplo do hotel Vila Joya, no Algarve, que actua num mercado muito exclusivo. Contudo, o panorama do sector em Portugal pode ser mais complexo e até apresentar situações de incapacidade de gestão de muitos líderes de empresas. “Existem poucos hoteleiros com capacidade para gerir”, salienta Manuel Proença.
Quatro factores de desvalorização
À excepção dos grandes grupos que estão consolidados, ou que se internacionalizaram, como o Pestana ou Vila Galé, ou de alguns grupos familiares que pouco dependam da banca, todos os restantes passarão por grandes dificuldades, admite Elidérico Viegas, que recua três anos (até 2009), para afirmar que desde essa data que o turismo tem vindo a perder competitividade.
São quatro, pelo menos, os factores para essa perda de valor: “Primeiro, há uma baixa produtividade no sector, traduzido pelo facto de metade dos funcionários não terem o ensino secundário. Segundo, a fiscalidade elevada, a qual tem trazido perda de competitividade da economia portuguesa. Terceiro, a dificuldade de acesso ao crédito. E, em quarto lugar, a ausência de políticas de transporte aéreo e aeroportuário competitivas, traduzidas por elevadas taxas aeroportuárias”, confere Elidérico Viegas.
O seu diagnóstico incide ainda sobre a “degradação da promoção turística, fora de moda, mais do mesmo, a gastar muito dinheiro e sem avaliação dos resultados, disperso por várias entidades do turismo regionais”, que no entender de Viegas traduz-se igualmente pela perda de competitividade do destino Portugal.
Retrato de um sector em transformação
1 – CS negoceia dívida
Com 11 hotéis e aparthotéis em funcionamento, entre o Algarve, Alentejo, Lisboa, Douro e a Madeira, a cadeia CS, do empresário Carlos Saraiva, é um dos exemplos de um grupo fortemente alavancado em instituições financeiras. Numa estimativa feita em 2008, Carlos Saraiva previa a abertura de 18 unidades e investimentos de 1,4 mil milhões de euros. Hoje, o empresário negociea as dívidas com a banca e assumiu o atraso de salários a trabalhadores e a fornecedores.
2 .- Insolvência da Imocon
O grupo Imocom, que trouxe a cadeia Hilton para Portugal, chegou a anunciar a construção de um Hilton Conrad de seis estrelas no Algarve, mas pediu a insolvência da ‘holding’ e de, pelo menos, duas participadas, em Julho passado. O pedido de insolvência visou a recuperação do negócio, devido aos prejuízos de 48 milhões de euros e capitais próprios negativos. Contudo, ficou em risco a continuidade dos projectos acordados com o gigante norte-americano.
3 – Cadeias em fusão
A fusão operacional dos grupos Lágrimas e Alexandre Almeida é uma das primeiras operações do género em 2012. Especialistas, contactados pelo Diário Económico, acreditam que esta será uma forma de sobreviver à recessão do mercado. Miguel Júdice (Lágrimas) salienta que a fusão de propriedades pode vir a acontecer. Todavia, neste momento, dadas as características diferenciadas das diferentes unidades, essa opção ainda não foi concretizada.
Fonte: Económico

0 comentários:

Enviar um comentário

Obrigado pelo seu comentário.