Nos últimos seis meses, foi aprovado e publicado um conjunto de medidas legislativas destinadas a dinamizar o mercado de arrendamento, cuja rigidez é desde há muito apontada como uma das causas do sobreendividamento dos particulares, por excessivo recurso ao crédito imobiliário.
Essas alterações iniciaram-se com a Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, que procedeu à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano na sua versão de 2006.
Entre as medidas instituídas pela referida Lei, destaca-se a criação do procedimento especial de despejo (PED), com o objetivo, nas palavras do legislador, de permitir a rápida desocupação do imóvel através do despejo do arrendatário incumpridor e a recolocação daquele no mercado de arrendamento. Este procedimento é criado como o meio adequado para tornar efetiva a cessação do arrendamento quando o arrendatário não desocupe o locado na data em que deveria fazê-lo e pode ser utilizado em diversos casos de extinção do arrendamento, nomeadamente, no caso de caducidade pelo decurso do prazo ou de resolução do contrato por não pagamento de renda por mais de dois meses.
O procedimento inicia-se com a apresentação de requerimento de despejo, que, verificados determinados pressupostos, é convertido em título para a desocupação do locado. À semelhança do que se verifica com as injunções, havendo oposição do arrendatário ao requerimento de despejo, o processo é remetido para decisão judicial.
Através da Lei n.º 31/2012 foi também criado o Balcão Nacional do Arrendamento (BNA), com a natureza de secretaria judicial e ao qual foi atribuída competência exclusiva para a tramitação dos PED em todo o território nacional. O BNA foi declarado instalado já em 2013, através do Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, que aprovou as regras de funcionamento do Balcão e concretizou alguns aspetos do PED. Essa concretização veio ainda ser realizada através da Portaria n.º 9/2013, de 10 de janeiro, que regulamenta algumas matérias mais específicas do PED.
O PED constitui assim uma espécie de injunção do arrendamento, que pode efetivamente permitir aos senhorios, de forma mais célere, voltarem a dispor dos imóveis arrendados e obterem o pagamento de rendas em atraso. É também visível que houve uma preocupação por parte do legislador em conciliar os objetivos da celeridade e da proteção do mercado de arrendamento com os problemas sociais que podem surgir com os despejos. Neste sentido, o regime consagra algumas reservas e exceções que, apesar de compreensíveis, podem no entanto dificultar a aplicação prática das novas regras. É o que sucede com a possibilidade de o Tribunal diferir a desocupação do imóvel por razões sociais imperiosas, remetendo-se para o "prudente arbítrio do tribunal" a decisão sobre se a falta de pagamento de rendas se terá ficado a dever à "carência de meios do arrendatário" e se tal justifica o diferimento do despejo.
A criação do BNA constitui igualmente uma medida bem-intencionada e que pode também contribuir para a vitalidade do mercado de arrendamento. No entanto, não podemos deixar de nos interrogar se, ao instituir um mecanismo semi-jurisdicionalizado deste tipo (e o BNA não é caso único), não estará o legislador a reconhecer a incapacidade do sistema judicial tradicional para responder de forma eficiente às exigências da nossa sociedade e da nossa economia.
Este é um problema mais vasto e profundo, cuja solução não passa apenas por transferir processos dos Tribunais para balcões, mas sim pela reforma e modernização do sistema judicial.
Por Miguel Lorena Brito, Sócio FCB&A, Direito Público, Administrativo e do Ambiente
Fonte: OJE
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