09 maio 2016

Imobiliárias estimam subida de 40% nas rendas em Lisboa


No arrendamento tradicional as taxas de rendimento são da ordem de 4% ao ano, no alojamento turístico chega-se facilmente aos 10%, diz a ERA. Proprietários e mediadores imobiliários - nomeadamente a APEMIP, que representa as agências de todo o país, e a ERA, uma das maiores mediadoras do sector -, garantem que os preços das rendas habitacionais em certas zonas de Lisboa dispararam entre 30% a 40%, desde que as plataformas online para reserva de casas começaram a ser mais utilizadas em 2014.


Alfama, Graça, Baixa/Chiado ou Príncipe Real estão no centro das atenções dos turistas que chegam a Lisboa sobretudo em voos de baixo custo, dispostos a não gastar dinheiro em hotéis. O recurso a plataformas de reserva de casas como o Airbnb, Wimdu ou 9Flats é cada vez mais frequente e os lisboetas já compram e recuperam casas nos bairros históricos com um único objetivo: colocá-las no arrendamento local ou de curta duração. A razão é simples: “Enquanto no arrendamento tradicional se consegue uma taxa de rendimento da ordem dos 4% ao ano, no arrendamento turístico chega-se facilmente a taxas de 10% ou até mais”, frisa Miguel Poisson, presidente executivo da ERA. Explica que em Alfama, por exemplo, já se vendem pequenas casas a mais de €4.000 por metro quadrado, para recuperar, exclusivamente para aquele fim, quando o valor médio da habitação usada em Lisboa ronda os €1.900/m2.

Ricardo Guimarães, gestor do Índice Confidencial Imobiliário, confirma que naquele bairro de Lisboa já se atingiram, inclusivamente, preços máximos da ordem dos €4.700/m2, sendo que em média se situam nos €3.700/m2.

Miguel Poisson nota que não se pode generalizar, mas diz que “há cada vez mais relatos de casos como o de Alfama. No entanto, há uma grande disparidade de preços mesmo dentro das zonas mais procuradas”.

Preços altos afastam jovens do centro de Lisboa

"Atualmente ninguém Consegue arrendar um apartamento T1, no centro de Lisboa, por menos de €800 por mês. Ora, como é óbvio, por estes valores, nunca se irá conseguir atrair gente jovem para morar no centro da capital", sublinha Luís Lima, presidente da Associação Portuguesa de Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), que esta semana apresentou um estudo comparativo dos preços do arrendamento em Portugal. 

O líder da APEMIP defende mesmo que o Estado e as autarquias intervenham rapidamente - não na formação dos preços, mas pela disponibilização de imóveis ou terrenos para construir e arrendar a custos controlados - pois só assim se conseguirá pôr termo à escalada de preços que "irá continuar".

Pelo menos enquanto a procura turística da capital portuguesa não diminuir "é garantido que o alojamento local vai continuar a aumentar. Resta saber até quando essa tendência se manterá e, pior ainda, o que acontecerá depois", refere o mesmo responsável.

O alerta de Luís Lima surge na mesma semana em que a cidade de Berlim, capital da Alemanha, anunciou multas até €100 mil a quem ali arrendar casas a partir daquelas plataformas online. O Expresso tentou contactar responsáveis da câmara e do Turismo de Lisboa sobre este tema, mas não houve disponibilidade até ao fecho da edição. A própria Airbnb tem tido uma atitude cooperante com a autarquia de Lisboa, tendo aceite o pagamento das taxas turísticas associadas a reservas feitas através do seu site, em pé de igualdade com os hotéis, o que entrou em vigor a 1 de maio.

"É evidente que o recurso à Airbnb e outras aplicações do género relançou o mercado do arrendamento, sobretudo em Lisboa, Porto e Algarve. Só que não se trata de arrendamento para quem ali quer passar a viver. Estamos a falar de turistas mais ou menos low cost, de fim de semana, e que estão a fazer com que os preços fiquem completamente inacessíveis para eventuais futuros moradores nesses locais".

Esta situação acaba por distorcer o mercado e, segundo Luís Lima, só há duas maneiras de ajudar a resolver o problema, pelo menos no imediato: agravar rapidamente a fiscalidade sobre o alojamento local ou baixar consideravelmente os impostos sobre o arrendamento convencional. "Bom, ou então, uma mistura das duas". Isto além da intervenção no mercado, por parte do Estado, disponibilizando oferta a baixos preços.

O presidente da APEMIP lembra que a Câmara Municipal de Lisboa já anunciou a colocação de apartamentos no mercado a rendas que rondam os €300/mês. "Com esses valores já vai ser possível atrair novos moradores para o centro da cidade. Mas, se assim não for, Lisboa continuará apenas disponível para turistas, pois são quem tem mais poder de compra neste domínio."

Curiosamente, a boa imagem de que atualmente goza Portugal no exterior está a atrair cada vez mais investidores estrangeiros para o segmento habitacional e, pela primeira vez, segundo Luís Lima, "os franceses estão na frente desde janeiro". Muitos deles já não compram só para uso próprio mas também para arrendar a terceiros, acrescenta o líder da APEMIP. 

Hotéis alertam para "bolha gigantesca" no alojamento local

Criar regras mais restritivas ao chamado alojamento local, que inclui o arrendamento a turistas em apartamentos particulares, é uma das bandeiras da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), face ao rápido crescimento desta oferta, sobretudo em Lisboa, mas também no Porto, em particular desde 2014.

"Portugal teima em negar que existe um problema: está-se a criar uma bolha gigantesca no alojamento local, o que é mau não só para a hotelaria, mas para toda a cidade", sustenta Cristina Siza Vieira, diretora executiva da AHP, chamando a atenção para o "sobredimensionamento" que esta oferta atingiu nas cidades, onde "foram descarregados no mercado de alojamento para turistas milhares casas e apartamentos que era suposto serem destinados a habitação".

Há cerca de um ano estavam registados em Portugal 7,9 mil unidades de alojamento local e hoje já são 26.9 mil. "E isto só os registados, o alojamento local 'debaixo de água', nem sabemos o que significa", frisa Cristina Siza Vieira. A oferta de alojamento local já quase equipara, em volume, à dos hotéis classificados: em todo o país há 1165 hotéis e 136 Pousadas, totalizando 192,8 mil camas, e segundo as contas da AHP o alojamento local já atinge 146,2 mil camas. 

Este "crescimento desmesurado" é notório sobretudo em Lisboa, onde segundo a associação há 39 mil camas em hotéis e 27 mil em alojamento local."Isto foi fundamental para a reabilitação, a Baixa lisboeta estava a morrer, e também trouxe autoemprego a muita gente", reconhece a responsável da AHP, frisando que o problema está na dimensão que atingiu e já está "a ser gravoso para a cidade e a afastar os residentes", além de inflacionar preços, uma vez que é mais rentável ter um edifício para vender noites a turistas do que arrendar para habitação - algo que é alimentado por gigantes mundiais em plataformas de reservas, à cabeça a Airbnb. 

Segundo Cristina Siza Vieira, o alojamento local também já assume um peso de 42% na oferta de camas turísticas no Porto, onde as autoridades camarárias "estão preocupadas com o disparar de pedidos de licenças para reabilitação de edifícios na Baixa portuense. "Sob a capa de habitação, está-se a viciar o fim a que se destina a reabilitação", faz notar. 

Apesar do Algarve concentrar a maioria do alojamento local no país, "trata-se sobretudo de rentabilizar segunda habitação, um suplemento que até faz sentido em períodos em que a capacidade hoteleira não é suficiente", refere Siza Vieira. "O que mais nos preocupa é a carga que este alojamento alternativo está a criar nos centros urbanos", salienta a responsável da AHP, lembrando que, além de Berlim, também Barcelona decidiu avançar com um plano fortemente limitativo, em que não é possível abrir mais alojamentos turísticos em zonas históricas", à semelhança de medidas restritivas lançadas em várias outras cidades, como Madrid, Amesterdão ou Paris. 

Proprietários querem trazer melhorias aos residentes 

O diploma do alojamento local vai ser revisto pelo Governo no segundo semestre, e a AHP já avançou com um conjunto de propostas para melhorar e corrigir "excessos" da anterior legislação. "Não consideramos que proibir seja a solução, mas restringir sim", sustenta Cristina Siza Vieira, referindo que o objetivo da lei inicial, de 2008, era "acomodar uma realidade existente, sem obrigar a muitos requisitos, pois era suposto o alojamento local ser uma oferta residual e alternativa à hotelaria, mas hoje evoluiu para outro patamar". A 'grande revisão' da lei foi em agosto de 2014, sobretudo com o foco no tema da fiscalidade, e em abril de 2015 foi novamente revista, segundo a AHP "sem qualquer justificação" e numa perspetiva "demasiado liberal". 

A Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP) está aberta a cooperar nas melhorias à legislação. "A nossa bandeira é a legalização. A quem é que os ilegais afetam mais? Os primeiros são os próprios operadores de alojamento local que têm de cumprir as obrigações todas", salienta Eduardo Miranda, presidente da ALEO, frisando que o objetivo "não é fazer caça às bruxas, mas um trabalho de sensibilização para trazer os operadores à legalidade". 

Eduardo Miranda chama a atenção para o facto de Portugal ter sido "o primeiro país na Europa a ter uma legislação de alojamento local, em 2008, quase legislou antes de existir mercado", e de hoje até ser um caso de estudo para muitos países europeus interessados em criar um enquadramento de arrendamento de curta duração, "um fenómeno novo, ainda sem uma legislação própria, que cresceu muito num ambiente de economia paralela". "É incrível como Portugal foi pioneiro nisso, criar uma lei é um trabalho moroso e aí estamos num processo avançado, o pais é caso único também ao nível do enquadramento fiscal desta atividade, foi o primeiro a fazer a equivalência do alojamento local em termos de impostos e como atividade empresarial", sublinha. "Esta lei pode não ser a ideal, mas estamos na vanguarda, sabemos para onde queremos ir e podemos dar contributos a outros países para definir caminhos". Ao contrário de outros casos, como Berlim, onde por falta de enquadramento se tomaram "medidas de reação imediatas e extremas, que estão muito na mão dos políticos". 

Não é por aí que deve seguir o caminho, defende a ALEP, lembrando o contributo do alojamento local na reabilitação de edifícios em Lisboa. "Em 2012, cerca de 50% dos imóveis na zona histórica precisavam de obras e 30% estavam vagos ou em grande degradação. Andando na Baixa, parecia tudo ao abandono. O alojamento local veio ocupar muito desse espaço dos imóveis vagos e ajudou a criar um mercado mais dinâmico".

Segundo Eduardo Miranda, a questão em Lisboa, ao contrário de outras cidades, está na concentração destes alojamentos sobretudo numa freguesia, a de Santa Maria Maior (inclui zonas da Sé, Castelo, Baixa e Chiado). "O efeito é muito na zona histórica, e não há dúvida que os moradores estão a sofrer os impactos", reconhece o presidente da ALEP, frisando que "não estamos fechados, mas abertos a soluções, e há muitas possíveis". A associação de alojamento local assume-se disposta ao diálogo com a câmara e outros operadores para olhar o futuro e planear uma nova fase. 

"A zona histórica de Lisboa ganhou outro atrativo com a reabilitação feita pelo alojamento local, e agora é altura de nos sentarmos todos e encontrar soluções de crescimento sustentado de turismo envolvendo os próprios moradores", conclui Eduardo Miranda.

Berlim lança bomba 
A polémica associada ao disparar do alojamento local estende-se a várias cidades na Europa, mas chegou ao rubro em Berlim, que foi notícia ao decretar medidas radicais: desde 1 de maio, quem arrendar apartamentos em plataformas digitais como a Airbnb fica sujeito a multas que podem ir até €100 mil. Trata-se de uma lei aprovada há dois anos, e que entrou agora em vigor, integrando um pacote de medidas na área da habitação cujo foco é atacar um problema na cidade alemã que teve um grande crescimento populacional nos últimos anos e onde é cada vez mais difícil arranjar casa. Cerca de 85% dos habitantes de Berlim não são proprietários mas recorrem ao arrendamento para habitação permanente, e os preços das rendas estão a atingir valores proibitivos (subiram 56% no espaço de cinco anos). Destinadas a impedir ao máximo que as casas sejam ocupadas para fins turísticos, estas medidas decretadas em Berlim não são consensuais na Alemanha. A Airbnb já reagiu, alegando que "Berlim criou uma lei de arrendamento confusa" e que os berlinenses que disponibilizam alojamento nas suas residências através desta plataforma "são pessoas normais que, para pagar as contas, partilham ocasionalmente as suas casas". Segundo a Airbnb, o seu "típico anfitrião de alojamento" em Berlim permanece em casa com os hóspedes e consegue €1.800 adicionais por ano, o equivalente a 34 noites. Frisa ainda que "quase metade deste rendimento adicional é gasto em despesas com a própria casa" e que "56% ganham abaixo do rendimento médio obtido com habitação na cidade". 

SOLUÇÕES DOS HOTÉIS PARA O ALOJAMENTO LOCAL NO PAÍS
  • Criar uma distinção na lei entre alojamento coletivo (hostels e blocos de apartamentos com serviço) e oferta isolada de quartos em casas particulares, pois o "alojamento local é um saco sem fundo onde cabe tudo". 
  • Colocar limites de 9 apartamentos por edifício a funcionar como alojamento local. 
  • Autorização do condomínio para as frações poderem ter esta utilização. 
  • Licença obrigatória para "uma atividade que é comercial, não é economia de partilha". 
  • Ajustes de permilagem para efeitos de pagamento das prestações de condomínio ou de IMI, à semelhança dos consultórios, lojas ou restaurantes que funcionem em edifícios habitacionais.
  • Criar requisitos próprios de higiene e segurança para habitações particulares poderem funcionar como alojamentos turísticos.
  • Reporte periódico da atividade ao INE e ao Turismo de Portugal.
  • Fiscalização por parte da ASAE dos apartamentos que recebem turistas e que não se encontram registados.
Fonte: Expresso

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