25 julho 2012

Vazios imobiliários e a teoria urbana dos vasos comunicantes


Por Guilherme Godinho *

Os fluidos respeitam a conservação de massa, de quantidade de movimento ou momentum linear e momentum angular, de energia e de entropia. Assim também parece ser na cidade. O meio urbano cumpre paulatinamente esta teoria. Não há espaço vazio que, mais tarde ou mais cedo, não venha a ser ocupado. Auge, declínio, abandono, deterioração, usos perversos, reabilitação, reocupação, auge, declínio...
O troço da Avenida Diagonal (em Barcelona), entre a Praça Francesc Macià e o Paseo de Gracia, é uma das localizações mais prime da cidade, sendo considerado o seu CBD (Central Business District). Percorro, várias vezes por semana, este percurso de cerca de 1200 metros sempre com a azáfama do dia a dia. Nos últimos tempos, tenho vindo a ter a sensação de que a quantidade de anúncios de "venta" y "alquiler" aumenta (muito). Há duas semanas, decidi-me (e fiz) este percurso a pé duas vezes, ida e volta; o resultado foi surpreendente: 58 anúncios. Esta intuição que tinha poderá facilmente ser extrapolada a outros centros urbanos, e facilmente contrastada com informação mais rigorosa das consultoras locais e internacionais que operam na cidade.

Imaginei-me na pele de um visitante, em turismo ou em negócios, e pensei que, ao observar tal quantidade de pequenos vazios urbanos, tal me levaria a pensar na causa e/ou na solução para esta ocorrência.

A cidade, para além da primeira linha do CBD, produz uma quantidade muito maior destes micro espaços vazios. Estes buracos imobiliários aumentam exponencialmente, multiplicando-se por milhares e milhares de metros quadrados disponíveis. Paralelamente, continuam a ser desenvolvidas novas porções de cidade, recuperando antigas localizações mais ou menos industriais, mas sempre marginais em relação ao centro urbano, consumindo recursos tão necessários neste momento económico particular; já em janeiro de 2011, alertávamos para este facto, neste mesmo espaço, num artigo a que chamámos "Implosão urbana".

Não é por acaso que, "sin prisa pero sin pausa", alguns investidores institucionais e privados - FII (fundos de investimento imobiliário) do norte da Europa, fundos soberanos e alguns family offices - estão a dar atenção a produtos imobiliários muito específicos, aproveitando as suas excecionais localizações e o atual distress imobiliário. Estes, como outros atores, colocam-se na linha da frente para um futuro e hipotético relançamento do mercado, adquirindo produtos consolidados nestas localizações "prime"que não necessitam de nenhum tipo de gestão urbanística.

Os outros atores de que vos falo - é só uma intuição ainda -, são investidores chineses. Começam a colocar-se em excecionais localizações, com cafés, bares e restaurantes (sempre estabelecimentos de esquina, regra clássica da capitalização imobiliária). Mas, estranhe-se, ao invés de os transformarem em estabelecimentos com características da cultura oriental, mantêm todo o estabelecimento, decoração, empregados, carta, preços e qualidade: o pincho de tortilha com pão com tomate continua igual, o queijo de cabrales está lá, o presunto melhor que nunca... Admirável mundo novo.

* Arquiteto

Fonte: OJE

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