As alterações à tributação do património imobiliário e o pedido de reavaliação de cinco milhões de casas para este ano colocaram as avaliações imobiliárias na ordem do dia. Saiba quem são os profissionais que fazem estas avaliações. Uma classe que foi muitas vezes maltratada pelo Estado, que se esqueceu do reverso da medalha: descredibilizar a figura do avaliador levou também a uma descredibilização dos processos de reavaliação atualmente em curso.
Quem o diz é Vítor Reis. O Diretor Pedagógico da Escola Superior de Actividades Imobiliárias (ESAI) que luta diariamente no sentido oposto, para dignificar e profissionalizar a figura do avaliador imobiliário, através de uma oferta formativa rica, em que a sua Licenciatura, o Curso de Especialização em Avaliação Imobiliária e os MBA’s em Avaliação Imobiliária e em Gestão e Promoção de Negócios Imobiliários são certificados pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
A avaliação imobiliária está na origem de grande parte das decisões financeiras das economias desenvolvidas. Falhas no valor correto das propriedades imobiliárias provocam a exposição dos diferentes agentes a riscos financeiros. Sejam eles a Banca, que financia os empréstimos imobiliários; os acionistas que investem em empresas cuja cotação não está corretamente avaliada no balanço; os compradores de habitação; os investidores em fundos imobiliários ou mesmo as economias em geral, que dependem da estabilidade do sistema bancário.
Tal facto torna a profissão do avaliador imobiliário de imperativo interesse público. Um
interesse para o qual a ESAI tem vindo a contribuir, lançando para o mercado avaliadores bem formados para o efeito e com certificação por parte da CMVM.
Formação em avaliação: uma alternativa em tempos de crise
A escola tem como curso central a licenciatura em Gestão Imobiliária, direcionada para
as várias atividades profissionais, comerciais e administrativas de todos aqueles que
prestam consultoria, avaliam, gerem, medeiam e promovem a propriedade imobiliária.
Trata-se de um leque de saídas profissionais alargado que pode, depois, ser
complementado pelos diversos cursos de especialização de que a ESAI dispõe.
“Concluída a licenciatura, temos disponíveis várias formações, desde pós-graduações, até cursos mais pequenos de especialização. Para além disso dispomos de uma formação de média duração, mais concretamente um MBA em avaliação imobiliária, com uma maior abrangência e mais completo. Enquanto o curso de especialização tem, em média, a duração de 90 horas, o MBA desenvolve-se ao longo de três trimestres e 270 horas.
Dada a carga horária, possui naturalmente um leque mais alargado e aprofundado das
matérias que leciona”, explica Vítor Reis.
Para além disso, é possível frequentar também na ESAI cursos de curta e média duração de especialização em temas muito particulares, de que é exemplo a avaliação de prédios rústicos ou a avaliação para peritos judiciais, destinada àqueles que trabalham no âmbito das expropriações, sejam eles peritos oficiais, seja quem queira trabalhar no âmbito de contestação aos processos expropriativos. Esta formação tem atualmente ganho destaque dentro da oferta formativa da escola uma vez que hoje “os avaliadores são muito solicitados ao nível dos processos de insolvência porque nestes processos, quer no caso das empresas, quer no caso dos particulares, há sempre imóveis para resolver”, refere o nosso entrevistado. E acrescenta, “principalmente ao nível dos particulares nota-se que há cada vez mais contestação ao valor atribuído ao seu imóvel e muitas vezes essa contestação é bem-sucedida, o que impulsiona bastante esta área”.
Para Vítor Reis, numa altura em que a crise se instalou no setor imobiliário, é este aumento da contestação que permite que a escola continue a manter bons níveis de desempenho e não se depare com uma quebra acentuado no número de inscrições.
“Temos muitos alunos que já trabalham no ramo imobiliário mas querem especializar-se porque hoje em dia, sendo o processo de avaliação um processo cada vez mais contestado, o avaliador que já se encontra no mercado sente necessidade de aprimorar e aprofundar os seus conhecimentos. Ainda que, como é óbvio, se note com a crise um maior cuidado das pessoas relativamente a onde vão colocar o seu investimento”, afirma.
Com a crise do setor imobiliário, a avaliação acaba por ser mesmo o complemento normal e a diversificação possível para quem hoje não tem outro tipo de projeto para desenvolver. Como tal, o diretor pedagógico da ESAI afirma que, através do próprio número de inscrições, consegue pronunciar quando está a começar uma crise do imobiliário uma vez que, segundo o mesmo, “há uma maior procura por parte de pessoas que estavam normalmente ligadas a outras áreas do imobiliário e sentem necessidade de adquirir conhecimentos sobre avaliação para terem essa alternativa. É quase um barómetro do início de crise”.
A avaliação nos casos de insolvência
É de esperar que as solicitações de avaliações imobiliárias em processos de insolvência não parem de aumentar, fazendo desta área uma das mais importantes ao nível da avaliação imobiliária no nosso país. De acordo com um estudo da Euler Hermes, as insolvências de empresas vão aumentar 50 por cento em Portugal só este ano. No ano passado, o aumento tinha sido de 19 por cento.
Segundo os dados publicados pela empresa especializada em seguros de crédito, o continente americano será a exceção, com as insolvências a caírem nove por cento este ano. Já nos países mediterrâneos, as insolvências deverão registar um recorde, traduzido num aumento de 20 por cento. Segundo estes dados, a Europa é o principal responsável pela subida das insolvências e Portugal encontra-se na linha da frente com este estimado aumento de 50 por cento até ao final do ano, mais 20 por cento do crescimento do número de insolvência de empresas esperado na Grécia para este ano e 30 por cento mais do que a vizinha Espanha.
No primeiro trimestre deste ano, o número de empresas nacionais em situação de falência atingiu 3 283 sociedades, uma média superior a 500 por mês. Os setores mais atingidos foram a construção, as indústrias transformadoras e o retalho.
Também no que toca aos particulares, são cada vez mais as famílias a pedir insolvência. Nos últimos cinco anos os pedidos aumentaram em 500 por cento, como resultado da crescente dificuldade no pagamento dos créditos.
Para Vítor Reis, a insolvência tem um pormenor muito particular e que se traduz numa contingência: trata-se do facto de o avaliador se confrontar imediatamente com o mercado, uma situação com a qual a maior parte dos avaliadores não estava habituado a lidar. Ter de colocar quase de imediato o imóvel no mercado obriga a um cuidado acrescido por parte do avaliador que, enquanto entidade isenta, tem de defender, por um lado, a parte que quer vender o imóvel para realizar capital, seja o administrador de insolvência ou a banca, bem como os interesses do até agora detentor do imóvel. Assim, é necessário estimar um valor pelo qual seja possível transacionar o mesmo, tentado defender os interesses de ambas as partes, o que torna o processo muito complexo.
Quem é que pode ser avaliador imobiliário?
Ética e bom senso são duas características que não podem faltar a um avaliador imobiliário, principalmente nestas situações em que há interesses distintos para defender e o tempo é escasso. Para além disso, a avaliação imobiliária é uma atividade multidisciplinar, que requer um amplo leque de conhecimentos e uma grande proximidade ao mercado, compreendendo o comportamento da oferta e da procura, dos preços, das tendências e das flutuações do mercado. Para além de outros fatores que influenciam a formação do valor do imóvel como sejam: as variáveis macroeconómicas, o urbanismo, os custos de produção, entre outros.
Durante muito tempo, quem fazia avaliações imobiliárias vinha das áreas da engenharia ou da arquitetura. Ainda hoje, o perito das finanças que faz avaliações tem de ter formação numa destas duas áreas e, apenas quando não houver um número de concorrentes suficiente dessas categorias profissionais, poderão ser escolhidos profissionais de outras categorias. Para Vítor Reis, é curioso que não seja pedida formação em avaliação imobiliária.
O nosso entrevistado é crítico neste ponto. “Não só por uma questão de transparência para o mercado, mas porque o imóvel hoje já não é apenas um conjunto físico de tijolos e janelas, porque hoje a esfera jurídica do imóvel é cada vez mais complexa, já não chega saber calcular quanto ele custa a produzir. É preciso olhar para ele e saber dizer se o imóvel tem condições de continuar com a atividade que lá está instalada, se tem desenvolvimentos potenciais alternativos que possam condicionar o seu valor, fazer a própria análise do mercado… Enfim, resumindo, a avaliação é cada vez mais uma atividade ligada à economia e todo o processo de evolução desta atividade está a seguir a tendência de sair da esfera da construção, da engenharia e da arquitetura, e a passar lentamente para a área da economia, precisamente porque, hoje em dia, num imóvel, a componente física é amenas um dos, e nem sempre o mais importante, elementos a ser avaliados. Tão ou mais importante é toda a envolvência económica e jurídica que rodeia o imóvel. Dada essa crescente complexidade, é óbvio que só poderá dar uma resposta consciente alguém que tenha formação adequada”.
Enquadramento legal para a profissão é necessário
A falta de exigência relativamente à formação dos avaliadores foi algo que chamou a atenção da Troika e, por isso, recomendou que a banca apenas trabalhasse com avaliadores certificados pela CMVM, tais como os licenciados pela ESAI.
Nos tribunais, os peritos podem vir de uma série de profissões, ainda que exista uma lista que defina quais os cursos que poderão dar acesso a uma formação que, depois de concluída com aproveitamento, levará ao preenchimento de um número pré-definido de vagas nos tribunais da relação para o cargo de peritos oficiais. Durante muito tempo essas listas estiveram, no entanto, fechadas e, como tal, a maior parte das vezes os tribunais utilizavam avaliadores Ad Hoc, ou seja, pessoas da confiança dos juízes que eram nomeadas para esse fim.
Como tal, um dos principais desafio que se coloca a esta área é, segundo Vítor Reis, “produzir regulamentação que defina claramente quem pode e quem não pode fazer avaliações imobiliárias. É preciso definir quais as qualificações mínimas que um individuo deve ter para poder apresentar-se como avaliador imobiliário, como acontece noutras profissões. Eu não posso dizer que sou médico se não tiver formação na área.
Os avaliadores vieram construindo, ao longo dos anos, uma imagem credível, de um parceiro que acrescentava valor ao processo imobiliário e que, infelizmente, nos últimos tempos ficou marcado por episódios negros. Não nos podemos esquecer que estamos em Portugal e que no nosso país as profissões só ganham estatuto e notoriedade se tiverem enquadramento legal. Enquanto não tiverem, as pessoas tendem a desprezá-las.
O fato de qualquer pessoa pode aceder a elas sem ter de cumprir qualquer requisito gera desconfiança!”.
A marcar esses “episódios negros” estão os vários erros detetados pela DECO nas reavaliações do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). Nestes casos, o proprietário pode e deve pedir uma segunda reavaliação do imóvel, que terá um custo de 204 euros, só devolvido nos casos em que o fisco dá razão ao proprietário.
“Vemos avaliações completamente díspares da realidade”
Falar sobre avaliação imobiliária nesta altura, obriga a que se fale inevitavelmente no agravamento do IMI, ditado pelo Orçamento de Estado para 2013. É esperado que no próximo ano as receitas proveniente do IMI praticamente dupliquem passando de 1 160 milhões de euros cobrados em 2011, para 2 100 milhões de euros em 2013, de acordo com os dados avançados pela consultora Deloitte. Um aumento que poderá levar à falência de muitas famílias, as quais já têm atualmente dificuldade em assumir os seus compromissos.
Ainda assim, Vítor Reis assume uma posição clara, “sem discutir se o princípio do IMI é justo ou não, isso é algo que não irei discutir, havia aqui uma questão de justiça fiscal que era elementar que se repusesse. Falemos de um imóvel no centro da cidade que pertence a duas famílias distintas, numa delas o patriarca morreu e foram feitas partilhas, logo ouve uma nova reavaliação. Porque faleceu um familiar, as pessoas dessa família passaram a pagar mais IMI, enquanto a outra família continuava alegremente a pagar o mesmo. Assim sendo, é óbvio que dentro do espirito do IMI, o facto de termos de reavaliar o património que não teve transmissão, era uma questão de pura justiça fiscal, face àqueles que tiveram transmissão. O processo peca, no entanto, por não ter sido imediatamente iniciado no momento em que foi aprovada a lei e agora, em apenas um ano, queremos fazer tudo aquilo que não fizemos em dez anos”.
Por isso, o nosso entrevistado faz questão de lembrar, “a economia tem muito de psicologia e os economistas geralmente esquecem-se disso. É preciso ter muito cuidado no impacto que as medidas vão ter no público em geral e na forma como são introduzidas”. E conclui, com uma crítica, “primeiro houve uma descredibilização completa da figura do avaliador; o Estado tem feito isso ciclicamente com algumas profissões: primeiro descredibiliza-se a figura e depois baixa-se a remuneração. Mas esqueceu-se do reverso da medalha. Se descredibilizam o processo, a confiança que as pessoas vão ter nele também será mínima e, de facto, a forma como o processo se está a desenvolver não traz qualquer confiança aos contribuintes, porque as coisas estão a ser feitas com demasiada pressa, há falta de informação e, como tal, as avaliações estão a conter muitos erros.. Depois, é óbvio que vemos avaliações completamente díspares da realidade, o que traz a todo o processo um elevado nível de desconfiança por parte dos proprietários e, consequentemente, um elevado índice de contestação”.
As regras do código do IMI e as bases segundo as quais este imposto é calculado?
“O grande problema do IMI é basear-se em fatores de valorização e desvalorização que são iguais para todo o país. Ter aquecimento central no Algarve não é o mesmo que ter aquecimento central na Guarda. O mesmo raciocínio pode ser feito em relação às garagens, uma vez que há muitos sítios em que não faz grande diferença ter garagem ou não, mas em sítios cuja criminalidade seja maior ou em que haja maior dificuldade de estacionamento já faz. O que acontece é que, como estivemos muitos anos sem fazer avaliações de património, foi necessário criar um modelo mais ou menos expedito que permitisse ao Estado, num processo simples, reavaliar tudo. Para mim a lei está mal feita desde o princípio porque assenta de base num pressuposto que qualquer pessoa que trabalhe no mercado imobiliário sabe que é irreal, que é o custo de construção ser considerado igual em todo o país.
Fonte: Revista Pontos de Vista
Dada a carga horária, possui naturalmente um leque mais alargado e aprofundado das
matérias que leciona”, explica Vítor Reis.
Para além disso, é possível frequentar também na ESAI cursos de curta e média duração de especialização em temas muito particulares, de que é exemplo a avaliação de prédios rústicos ou a avaliação para peritos judiciais, destinada àqueles que trabalham no âmbito das expropriações, sejam eles peritos oficiais, seja quem queira trabalhar no âmbito de contestação aos processos expropriativos. Esta formação tem atualmente ganho destaque dentro da oferta formativa da escola uma vez que hoje “os avaliadores são muito solicitados ao nível dos processos de insolvência porque nestes processos, quer no caso das empresas, quer no caso dos particulares, há sempre imóveis para resolver”, refere o nosso entrevistado. E acrescenta, “principalmente ao nível dos particulares nota-se que há cada vez mais contestação ao valor atribuído ao seu imóvel e muitas vezes essa contestação é bem-sucedida, o que impulsiona bastante esta área”.
Para Vítor Reis, numa altura em que a crise se instalou no setor imobiliário, é este aumento da contestação que permite que a escola continue a manter bons níveis de desempenho e não se depare com uma quebra acentuado no número de inscrições.
“Temos muitos alunos que já trabalham no ramo imobiliário mas querem especializar-se porque hoje em dia, sendo o processo de avaliação um processo cada vez mais contestado, o avaliador que já se encontra no mercado sente necessidade de aprimorar e aprofundar os seus conhecimentos. Ainda que, como é óbvio, se note com a crise um maior cuidado das pessoas relativamente a onde vão colocar o seu investimento”, afirma.
Com a crise do setor imobiliário, a avaliação acaba por ser mesmo o complemento normal e a diversificação possível para quem hoje não tem outro tipo de projeto para desenvolver. Como tal, o diretor pedagógico da ESAI afirma que, através do próprio número de inscrições, consegue pronunciar quando está a começar uma crise do imobiliário uma vez que, segundo o mesmo, “há uma maior procura por parte de pessoas que estavam normalmente ligadas a outras áreas do imobiliário e sentem necessidade de adquirir conhecimentos sobre avaliação para terem essa alternativa. É quase um barómetro do início de crise”.
A avaliação nos casos de insolvência
É de esperar que as solicitações de avaliações imobiliárias em processos de insolvência não parem de aumentar, fazendo desta área uma das mais importantes ao nível da avaliação imobiliária no nosso país. De acordo com um estudo da Euler Hermes, as insolvências de empresas vão aumentar 50 por cento em Portugal só este ano. No ano passado, o aumento tinha sido de 19 por cento.
Segundo os dados publicados pela empresa especializada em seguros de crédito, o continente americano será a exceção, com as insolvências a caírem nove por cento este ano. Já nos países mediterrâneos, as insolvências deverão registar um recorde, traduzido num aumento de 20 por cento. Segundo estes dados, a Europa é o principal responsável pela subida das insolvências e Portugal encontra-se na linha da frente com este estimado aumento de 50 por cento até ao final do ano, mais 20 por cento do crescimento do número de insolvência de empresas esperado na Grécia para este ano e 30 por cento mais do que a vizinha Espanha.
No primeiro trimestre deste ano, o número de empresas nacionais em situação de falência atingiu 3 283 sociedades, uma média superior a 500 por mês. Os setores mais atingidos foram a construção, as indústrias transformadoras e o retalho.
Também no que toca aos particulares, são cada vez mais as famílias a pedir insolvência. Nos últimos cinco anos os pedidos aumentaram em 500 por cento, como resultado da crescente dificuldade no pagamento dos créditos.
Para Vítor Reis, a insolvência tem um pormenor muito particular e que se traduz numa contingência: trata-se do facto de o avaliador se confrontar imediatamente com o mercado, uma situação com a qual a maior parte dos avaliadores não estava habituado a lidar. Ter de colocar quase de imediato o imóvel no mercado obriga a um cuidado acrescido por parte do avaliador que, enquanto entidade isenta, tem de defender, por um lado, a parte que quer vender o imóvel para realizar capital, seja o administrador de insolvência ou a banca, bem como os interesses do até agora detentor do imóvel. Assim, é necessário estimar um valor pelo qual seja possível transacionar o mesmo, tentado defender os interesses de ambas as partes, o que torna o processo muito complexo.
Quem é que pode ser avaliador imobiliário?
Ética e bom senso são duas características que não podem faltar a um avaliador imobiliário, principalmente nestas situações em que há interesses distintos para defender e o tempo é escasso. Para além disso, a avaliação imobiliária é uma atividade multidisciplinar, que requer um amplo leque de conhecimentos e uma grande proximidade ao mercado, compreendendo o comportamento da oferta e da procura, dos preços, das tendências e das flutuações do mercado. Para além de outros fatores que influenciam a formação do valor do imóvel como sejam: as variáveis macroeconómicas, o urbanismo, os custos de produção, entre outros.
Durante muito tempo, quem fazia avaliações imobiliárias vinha das áreas da engenharia ou da arquitetura. Ainda hoje, o perito das finanças que faz avaliações tem de ter formação numa destas duas áreas e, apenas quando não houver um número de concorrentes suficiente dessas categorias profissionais, poderão ser escolhidos profissionais de outras categorias. Para Vítor Reis, é curioso que não seja pedida formação em avaliação imobiliária.
O nosso entrevistado é crítico neste ponto. “Não só por uma questão de transparência para o mercado, mas porque o imóvel hoje já não é apenas um conjunto físico de tijolos e janelas, porque hoje a esfera jurídica do imóvel é cada vez mais complexa, já não chega saber calcular quanto ele custa a produzir. É preciso olhar para ele e saber dizer se o imóvel tem condições de continuar com a atividade que lá está instalada, se tem desenvolvimentos potenciais alternativos que possam condicionar o seu valor, fazer a própria análise do mercado… Enfim, resumindo, a avaliação é cada vez mais uma atividade ligada à economia e todo o processo de evolução desta atividade está a seguir a tendência de sair da esfera da construção, da engenharia e da arquitetura, e a passar lentamente para a área da economia, precisamente porque, hoje em dia, num imóvel, a componente física é amenas um dos, e nem sempre o mais importante, elementos a ser avaliados. Tão ou mais importante é toda a envolvência económica e jurídica que rodeia o imóvel. Dada essa crescente complexidade, é óbvio que só poderá dar uma resposta consciente alguém que tenha formação adequada”.
Enquadramento legal para a profissão é necessário
A falta de exigência relativamente à formação dos avaliadores foi algo que chamou a atenção da Troika e, por isso, recomendou que a banca apenas trabalhasse com avaliadores certificados pela CMVM, tais como os licenciados pela ESAI.
Nos tribunais, os peritos podem vir de uma série de profissões, ainda que exista uma lista que defina quais os cursos que poderão dar acesso a uma formação que, depois de concluída com aproveitamento, levará ao preenchimento de um número pré-definido de vagas nos tribunais da relação para o cargo de peritos oficiais. Durante muito tempo essas listas estiveram, no entanto, fechadas e, como tal, a maior parte das vezes os tribunais utilizavam avaliadores Ad Hoc, ou seja, pessoas da confiança dos juízes que eram nomeadas para esse fim.
Como tal, um dos principais desafio que se coloca a esta área é, segundo Vítor Reis, “produzir regulamentação que defina claramente quem pode e quem não pode fazer avaliações imobiliárias. É preciso definir quais as qualificações mínimas que um individuo deve ter para poder apresentar-se como avaliador imobiliário, como acontece noutras profissões. Eu não posso dizer que sou médico se não tiver formação na área.
Os avaliadores vieram construindo, ao longo dos anos, uma imagem credível, de um parceiro que acrescentava valor ao processo imobiliário e que, infelizmente, nos últimos tempos ficou marcado por episódios negros. Não nos podemos esquecer que estamos em Portugal e que no nosso país as profissões só ganham estatuto e notoriedade se tiverem enquadramento legal. Enquanto não tiverem, as pessoas tendem a desprezá-las.
O fato de qualquer pessoa pode aceder a elas sem ter de cumprir qualquer requisito gera desconfiança!”.
A marcar esses “episódios negros” estão os vários erros detetados pela DECO nas reavaliações do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). Nestes casos, o proprietário pode e deve pedir uma segunda reavaliação do imóvel, que terá um custo de 204 euros, só devolvido nos casos em que o fisco dá razão ao proprietário.
“Vemos avaliações completamente díspares da realidade”
Falar sobre avaliação imobiliária nesta altura, obriga a que se fale inevitavelmente no agravamento do IMI, ditado pelo Orçamento de Estado para 2013. É esperado que no próximo ano as receitas proveniente do IMI praticamente dupliquem passando de 1 160 milhões de euros cobrados em 2011, para 2 100 milhões de euros em 2013, de acordo com os dados avançados pela consultora Deloitte. Um aumento que poderá levar à falência de muitas famílias, as quais já têm atualmente dificuldade em assumir os seus compromissos.
Ainda assim, Vítor Reis assume uma posição clara, “sem discutir se o princípio do IMI é justo ou não, isso é algo que não irei discutir, havia aqui uma questão de justiça fiscal que era elementar que se repusesse. Falemos de um imóvel no centro da cidade que pertence a duas famílias distintas, numa delas o patriarca morreu e foram feitas partilhas, logo ouve uma nova reavaliação. Porque faleceu um familiar, as pessoas dessa família passaram a pagar mais IMI, enquanto a outra família continuava alegremente a pagar o mesmo. Assim sendo, é óbvio que dentro do espirito do IMI, o facto de termos de reavaliar o património que não teve transmissão, era uma questão de pura justiça fiscal, face àqueles que tiveram transmissão. O processo peca, no entanto, por não ter sido imediatamente iniciado no momento em que foi aprovada a lei e agora, em apenas um ano, queremos fazer tudo aquilo que não fizemos em dez anos”.
Por isso, o nosso entrevistado faz questão de lembrar, “a economia tem muito de psicologia e os economistas geralmente esquecem-se disso. É preciso ter muito cuidado no impacto que as medidas vão ter no público em geral e na forma como são introduzidas”. E conclui, com uma crítica, “primeiro houve uma descredibilização completa da figura do avaliador; o Estado tem feito isso ciclicamente com algumas profissões: primeiro descredibiliza-se a figura e depois baixa-se a remuneração. Mas esqueceu-se do reverso da medalha. Se descredibilizam o processo, a confiança que as pessoas vão ter nele também será mínima e, de facto, a forma como o processo se está a desenvolver não traz qualquer confiança aos contribuintes, porque as coisas estão a ser feitas com demasiada pressa, há falta de informação e, como tal, as avaliações estão a conter muitos erros.. Depois, é óbvio que vemos avaliações completamente díspares da realidade, o que traz a todo o processo um elevado nível de desconfiança por parte dos proprietários e, consequentemente, um elevado índice de contestação”.
As regras do código do IMI e as bases segundo as quais este imposto é calculado?
“O grande problema do IMI é basear-se em fatores de valorização e desvalorização que são iguais para todo o país. Ter aquecimento central no Algarve não é o mesmo que ter aquecimento central na Guarda. O mesmo raciocínio pode ser feito em relação às garagens, uma vez que há muitos sítios em que não faz grande diferença ter garagem ou não, mas em sítios cuja criminalidade seja maior ou em que haja maior dificuldade de estacionamento já faz. O que acontece é que, como estivemos muitos anos sem fazer avaliações de património, foi necessário criar um modelo mais ou menos expedito que permitisse ao Estado, num processo simples, reavaliar tudo. Para mim a lei está mal feita desde o princípio porque assenta de base num pressuposto que qualquer pessoa que trabalhe no mercado imobiliário sabe que é irreal, que é o custo de construção ser considerado igual em todo o país.
Fonte: Revista Pontos de Vista
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