25 julho 2013

O sonho de ter casa própria que o crédito ajudou a criar


Habitação. Entre 1986 e 2010, o peso do crédito à habitação no rendimento disponível das famílias aumentou de 13% para 89%. As condições "generosas" oferecidas pelas instituições bancárias na concessão de empréstimos e um mercado de arrendamento incipiente explicam um crescimento que, ao longo de mais de duas décadas, impulsionou o sector da construção.

A subida foi brutal: entre 1986 e 2010, o peso do crédito à habitação no rendimento disponível das famílias portuguesas multiplicou quase sete vezes, atingindo, 27 anos depois da adesão ao País à União Europeia (UE), os 89%. "É demasiado elevado. Deveria estar abaixo dos 50%, na ordem dos 40%", avalia Ricardo Pedrosa Gomes, presidente da Associação de Empresas de Construção, Obras Públicas e Serviços (AECOPS). O valor - que consta do estudo "25 Anos de Portugal europeu", promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, não surpreende os representantes do setor, mas é "preocupante".

"É um perigo para as próprias pessoas e para a banca", sintetiza. A análise, complementa Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), é hoje "fácil de fazer", "mas à data, quando as avaliações dos imóveis sobre os quais eram pedidos empréstimos eram generosas, (...) toda a gente olhava para o setor como o grande motor de crescimento". Até porque "esse endividamento foi encorajado pelo sistema financeiro e pelos poderes políticos".

O resultado foi a existência, em 2010, de 2,45 milhões de devedores de crédito à habitação - um número que corresponde a 29% da população adulta residente no País. Mas significará isso que em Portugal, o terceiro país da UE a 15 com maior proporção de proprietários depois de Espanha e Grécia, o sonho de ter casa própria é generalizado? Não necessariamente.

Ainda que, para o dirigente da APEMIP, sempre tenha sido "um dos sonhos de quem, entre nós partiu à aventura para conseguir uma vida melhor", Ricardo Pedrosa Gomes prefere falar no "pecado original". "A AECOPS alertou no princípio da década de 1980 que não era solução que a única resposta à carência de habitação fosse aquisição de casa própria", referindo-se à insipiência do mercado de arrendamento."

"Verificou-se (desde a adesão à UE) um aumento da procura de aquisição de habitação própria por parte das famílias, que encontraram no crédito bancário a solução que o mercado de arrendamento nunca lhes proporcionou", sustenta Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas. "Portugal é o segundo país europeu com menor peso" nessa área, recorda.

Indiscutível é que a facilidade no acesso ao crédito impulsionou o setor da construção. A prová-lo o facto de. por cada cinco euros concedido ao privado, dois irem em média para a compra de casa e outro para a construção e o imobiliário. "Construiu-se mais em Portugal nesses 25 anos do que nos oito séculos anteriores da nossa história", remata Luís Lima.

Fim dos bairros de lata mudou a paisagem 

Sobrelotação e carência de instalações de higiene, luz natural ou problemas de humidade no alojamento. Era este o retrato, em 2010, da habitação de 6% dos residentes em Portugal - uma percentagem que, aquando da adesão à União Europeia, era bem mais elevada. A culpa era dos bairros de lata que, então, faziam parte da paisagem das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e que, hoje, desapareceram quase na totalidade. Ao mesmo tempo que se multiplicaram os bairros municipais.

Foi a 7 de maio de 1993 que foi criado o Programa Especial de Realojamento (PER). Duas décadas depois. segundo informações disponíveis no site governamental Portal da Habitação, foram realojadas quase 35 mil famílias, vivendo ainda em condições precárias 3300, distribuídas por oito municípios - Almada, Amadora, Loures, Odivelas e Seixal, na Grande Lisboa. e Espinho, Maia e Matosinhos, no Grande Porto. Inicialmente, eram 28 os municípios abrangidos, num total de mais de 48 mil agregados.

O realojamento foi possível graças ao investimento municipal realizado na aquisição e construção de fogos. Só em Lisboa foram construídos 9.136 fogos a juntar aos 7.496 edificados no âmbito de um programa anterior, o Plano de Intervenção a Médio Prazo (1987). Ao todo, segundo o relatório de finalização das iniciativas a provado pela câmara municipal a autarquia investiu mais de 545 milhões de euros para erradicar os bairros de lata. Em Março, a dívida era de 135 milhões.

Fonte: Negócios

0 comentários:

Enviar um comentário

Obrigado pelo seu comentário.