07 novembro 2012

Hotelaria e apartamentos turísticos com forte procura mas proprietários e operadores não se entendem


Há procura, mas os negócios não se concretizam. A hotelaria e apartamentos turísticos têm forte procura em termos de investimento imobiliário em Lisboa, mas proprietários e operadores não se entendem. Estes últimos pretendem reduzir os riscos e rendas variáveis nos espaços. Os proprietários pedem uma situação resolvida à cabeça, afirma Paulo Silva, diretor-geral da Aguirre Newman Portugal. 

Como estão a evoluir os vários segmentos do imobiliário comercial no final dos primeiros nove meses do ano?
O mercado de escritórios está, claramente, melhor que no ano passado. Quando fizemos a projeção deste ano, o que antecipámos foi um decréscimo da colocação de escritórios, e isto porque há uma correlação negativa entre a evolução do produto e a colocação de escritórios. A expectativa era, por isso, termos menos escritórios colocados. Mas levantou-se outra questão que alterou o cenário. Registámos um nível de rendas tão baixo que gerou a motivação para que as empresas mudassem, e isso acabou por acontecer. Verificámos, em agosto, que já íamos com mais 25% de escritórios colocados comparativamente com 2011. Estamos em crer que, este ano, iremos ultrapassar os 100 mil m2, tendo presente que, no ano passado, foram colocados menos de 88 mil m2, e sendo que o take-up é feito através da contabilização de áreas que são tomadas dentro da mesma localização ou de outras localizações.

O movimento é, essencialmente, feito por empresas instaladas, não por novas?
Por empresas instaladas, sendo que há uma pequena parte de organizações novas. Essas têm mais peso em número do que em metros quadrados. São geralmente empresas que tomam áreas relativamente pequenas, escritórios de até cinco pessoas, e que ocupam até aos 100 m2.

Quais são as zonas de escritórios que mais ganharam e as que mais perderam?
A Zona 6 tem sempre uma grande colocação de escritórios. A Zona 5 também está a registar um acréscimo de instalação porque, finalmente, se reduziram os valores que estavam a ser praticados naquela área. Esta foi uma situação que viemos a alertar, pois a Zona 5 ainda não representava um diferencial de preços comparativamente ao centro da cidade de Lisboa e ao Corredor Oeste que justificasse a instalação de empresas. Durante os últimos anos, temos vindo a assistir a um take-up que anda na casa dos 5 mil a 6 mil m2 por ano, excetuando as grandes colocações, como foram os CTT, a Axa e a Microsoft no ano passado. Tirando estas operações de grande dimensão, aquilo a que assistíamos era um take-up na ordem dos 5/6 mil m2.

É verdade que, a partir de 2014 e caso a economia reanime, poderá haver uma falha de oferta de escritórios de qualidade?
Poderá acontecer, mas acaba por ser uma falsa questão. Tudo estará muito ligado à evolução da economia. O mercado de escritórios de Lisboa tem produtos muito interessantes e, falando de um tema que está muito na moda - a reabilitação -, o que posso dizer é que os escritórios não estão a precisar necessariamente de uma reabilitação. Dou o exemplo da Microsoft, que saiu de edifício para onde se tinha mudado há quatro/cinco anos na zona do Taguspark, para o Parque das Nações. A área que deixou disponível não era um mau escritório, pois esteve ali com a sede, sendo uma empresa muito exigente nas suas instalações. Logo, há áreas que são libertadas. A própria Zon deixa espaços de escritórios na 5 de Outubro e nas Caravelas, que são escritórios com excelente localização. Se estamos a falar de um mercado que tem dificuldade em dar uma resposta qualitativa para grandes áreas, mas essas, como é evidenciado pela ocupação da Zon e como foi pelos CTT, começam a ser programadas com antecedência. A própria EDP, quando anuncia a deslocalização para os 40 mil m2 na 24 de Julho, está a fazer antecipadamente as suas instalações. Caso aparecesse no mercado a procurar esses espaços, não teria resposta. Para empresas com 2/3 ou 5 mil m2, diria que, desde o Parque das Nações até ao Corredor Oeste, o mercado oferece soluções de qualidade muito boas. Há, no entanto, que ter em consideração que os espaços de escritórios que têm vindo a ser disponibilizados por ano são muito poucos. Temos uma projeção para o triénio até 2014 que anda nos 60 a 70 mil m2, ou seja, não ultrapassa 30 mil m2 anuais e, se olharmos para take-up de 100 mil m2, poderá pensar-se numa eventual insuficiência de novos espaços, mas há que pensar que há mais de 500 mil m2 de escritórios disponíveis.

A nível de reabilitação de escritórios em zonas envelhecidas ou que eram maioritariamente de residencial, caso das Avenidas Novas, será que esse negócio está a evoluir?
Não está a crescer. Há um ou outro caso pontual de remodelação dos edifícios, mas não está a ter a dinâmica necessária por falta de liquidez dos investidores. Na prática, estão numa posição de stand by, à espera de encontrar o inquilino que se comprometa com o espaço, sendo que os edifícios têm hoje limitações que não são aconselháveis para grandes utilizadores. Não avançam com remodelações porque não têm o arrendatário, e aquelas entidades que olham para os espaços não ficam satisfeitas com a solução que visualizam.

As empresas querem voltar para a Grande Lisboa?
O centro da cidade de Lisboa passou a ser a um centro geográfico, o que não acontecia há 15 anos. Nessa altura, tínhamos como principal corredor de escritórios o eixo Av. da Liberdade/Marquês/Saldanha e depois os escritórios desenvolviam-se sobretudo para o Corredor Oeste. Não havia escritórios para a zona oriental da cidade. A criação do Parque das Nações veio acentuar a centralidade geográfica, sendo que houve empresas que, por falta de espaços de qualidade, se deslocaram para o Parque das Nações, e também pelas condições que o próprio espaço oferecia. E hoje há empresas que querem estar mais centrais do ponto de vista geográfico. Não diria que são grandes utilizadores de espaço.

Qual o volume colocado em escritórios?
Até setembro, a colocação foi de 63 mil m2, que é superior em 41% em termos homólogos. É seguramente possível que se ultrapasse os 100 mil m2, pois só com a Zon chegar-se-á aos 78 mil m2.

Pode ligar-se este número com a evolução da economia?
Não se liga. Estes valores estão relacionados com outras questões. No caso da Zon, relaciona-se com a necessidade de maior eficiência dos serviços e a nova sede foi projetada há dois anos. As demais têm que ver sobretudo com as condições favoráveis que os senhorios estão a criar para que inquilinos se mudem para os seus edifícios. Isto tem a ver com a agressividade dos proprietários, aplicando-se sobretudo na periferia.

O retalho vai manter-se muito concentrado no negócio de rua?
Este é um setor muito ligado à performance da economia. Há situações de insolvência e de encerramento de atividades e, para os mesmos espaços, não têm sido encontradas atividades novas que se substituam às que vão sendo extintas. Os espaços estão disponíveis, e não é só uma questão de preço. No Chiado e Av. da Liberdade, há, em contraste, muito poucos espaços e os que se encontram estão na Av. da Liberdade porque são um pouco periféricos em relação àquilo que é a centralidade da avenida. As empresas querem localizações junto das insígnias de luxo, mas há espaços com mais dificuldades em serem colocados, porque não estão próximos destas insígnias.

Estamos a assistir a uma revolução nos centros comerciais, com proprietários a assumirem mais risco, centros de periferia a fechar e outros a serem lançados ou relançados como low cost. Como irá evoluir este segmento?
Está a assistir-se a um ajustamento às novas realidades. Os senhorios têm tido, neste segmento, um grande pragmatismo. Têm tido a consciência de que é preferível colocarem-se do lado dos inquilinos, tentando auxiliá-los a manterem as lojas abertas, do que terem espaços encerrados dentro de um centro comercial. Tem havido um pragmatismo ao nível de transformar rendas fixas em rendas variáveis, o que é relevante, pois os inquilinos estão num contexto de redução dos níveis de faturação. Por outro lado, tem-se transformado os centros comerciais dentro daquilo que hoje é preferido pelas pessoas, e que é sobretudo a procura de preço. Há ainda um outro aspeto: que centros comerciais mais periféricos e em zonas onde haja uma pressão pelo lado da oferta estão condenados a encerrar. Esta é uma realidade que se irá acentuar nos próximos tempos.

A nível de logística e industrial não há grandes alterações do perfil?
Temos uma característica dominante no mercado, que é a existência de grandes projetos que demoram muito tempo para se concretizarem. O promotor, que tem identificado a procura e quer ter o conforto de, no final do ciclo da produção, não ficar com o ativo, está a ter grande dificuldade em encontrar investidores para adquirir o produto. Estamos a falar de contratos de arrendamento muito interessantes, com prazos superiores a 20 anos, com bons arrendatários, onde a principal dificuldade está na rendibilidade oferecida aos investidores de 8/8,5% e que é pouco interessante para os dias que correm.
Temos uma característica dominante no mercado, que é a existência de grandes projetos que demoram muito tempo para se concretizarem. O promotor, que tem identificado a procura e quer ter o conforto de, no final do ciclo da produção, não ficar com o ativo, está a ter grande dificuldade em encontrar investidores para adquirir o produto. Estamos a falar de contratos de arrendamento muito interessantes, com prazos superiores a 20 anos, com bons arrendatários, onde a principal dificuldade está na rendibilidade oferecida aos investidores de 8/8,5% e que é pouco interessante para os dias que correm.

No centro da cidade está a emergir uma nova realidade, que é a mistura hotelaria com apartamentos turísticos. É um produto para crescer?
Confirmo esse cenário a partir dos indicadores que temos do lado da oferta. Há uma procura crescente por parte de operadores que, mais uma vez, só encontra travão na falta de confiança/financiamento por parte dos proprietários dos edifícios. Estes não querem ficar com os ativos, querem ter uma solução de venda. Devo frisar que a hotelaria e os apartamentos turísticos são, no investimento imobiliário, os que apresentam a maior dinâmica de procura. Mas, friso, o proprietário não quer fazer parte do risco e não há financiamento. Relativamente ao proprietário, regista-se um fenómeno em tudo idêntico ao dos centros comerciais que estão a transformar as rendas fixas em variáveis. A diferença é que, neste último caso, há uma dinâmica de exploração em que tenho de me ajustar a determinada realidade, enquanto na hotelaria - e esse facto tem constituído um travão ao investimento - logo na entrada os operadores querem ter a situação adquirida com rendas variáveis e os proprietários não querem correr esse risco. Temos grandes interesses em ir para contratos de exploração, mas esbarram no facto de os proprietários quererem, essencialmente, ter contratos de arrendamento a 10/15 anos, com garantias. E esse modelo de negócio está a ser muito difícil de encontrar nos dias que correm. Em termos internacionais, os grandes operadores de hotelaria começam a ter de refletir nos seus balanços um tipo de resultados que os leva a preferir um modelo de negócio que venha a engrossar responsabilidades. Tudo isto está a fazer com que não se concretizem os negócios em proporção com a procura que existe.

Como está a correr o ano para a Aguirre?
Bastante melhor, no que diz respeito às áreas de avaliações e consultoria, de gestão de imóveis e arquitetura, a par de um grande "sofrimento" nas áreas de transações, em termos de escritórios e de investimentos. Na área de investimento, estamos em vias de concluir dois negócios, os quais têm vindo a ser trabalhados há muitos meses.

Neste setor de atividade, poderão acontecer operações de fusão?
Faz todo o sentido. A consultoria imobiliária vai ter necessariamente de reduzir o número de efetivos, porque não há mercado para tantas pessoas, e isso pode ser feito via cada uma das empresas ou via fusão entre companhias. A dificuldade está em colocar as ideias em prática. Por exemplo, na nossa área de mercado, existem sete empresas, quase todas multinacionais ou associadas a multinacionais, e não é a este nível que se irão verificar fusões. Estas farão sentido em termos nacionais, mas num contexto de internacionalização. O que se verifica é que somos relativamente grandes para o Portugal e muito pequenos para processos de internacionalização.


Por Paulo Silva, diretor-geral da Aguirre Newman Portugal

Fonte: OJE

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