01 dezembro 2013

Portugal com o desenvolvimento mais rápido no betão


A construção, entendida como o processo de criação dos aglomerados urbanos e infraestruturas necessários à vida social e económica, é uma atividade de primordial importância para as populações e para a economia. Os benefícios não são, no entanto, isentos de impactos negativos, pelo contrário: todos os anos são ocupados, em todo o mundo, três milhões de hectares de solos virgens com novas construções e infraestruturas; cerca de 50% das matérias-primas extraídas da natureza são destinadas à construção; os entulhos resultantes das atividades da construção e demolição constituem o maior fluxo de resíduos. 

Em consequência, o desenvolvimento sustentável não é possível se a construção não se inscrever nos limites da sustentabilidade. Este objetivo torna-se, no entanto, difícil de atingir, porque a construção tem, também, um importante "peso" junto dos agentes políticos, em particular nos países menos desenvolvidos, condicionando frequentemente as grandes decisões. 


No sentido lato em que aqui é entendida, a "construção" envolve cinco fases, desde a de "planeamento e conceção", durante a qual os políticos eleitos, decisores do Estado, consultores, promotores imobiliários e investidores decidem construir ou não, o quê, porquê, quando, onde, como e com quem, até à de "desativação e desmantelamento" da construção, durante a qual se deve dar destino compatível aos resíduos e repor os ecossistemas e a biodiversidade preexistentes, passando pelas fases mais conhecidas de projeto, execução do empreendimento e sua operação e exploração ao ciclo da vida útil. 

O ciclo da construção tem um elevado impacto negativo sobre, quase todos os grandes domínios ambientais. Em três desses domínios - "solo", "natureza" e "materiais", tal impacto diz diretamente respeito a alterações do uso do solo, com degradação ou destruição de ecossistemas. Os impactos da primeira e última fases do ciclo são, ainda, deficientemente percebidos pelos decisores políticos e pelos cidadãos, o que é grave, dado que são parcelas de grande peso no impacto global da construção.

A importância estratégica dos ecossistemas apreende-se melhor pondo em evidência os benefícios que as pessoas e as empresas deles obtêm, ou seja, os serviços por eles prestados à sociedade e à economia. 

O Millennium Ecosystem Assessment (programa de pesquisas sobre mudanças ambientais apoiado pelas Nações Unidos) classificou esses serviços em quatro categorias: serviços de aprovisionamento (de alimentos, de água, de materiais de construção, de recursos genéticos, etc.), serviços de regulação (do clima, das doenças, do ciclo da água, dos desastres naturais, etc.), serviços culturais (de natureza estética, educacional, religiosa, de lazer) e serviços de suporte (criação de solos, fotossíntese, etc.). Estes serviços perdem-se ou desvalorizam-se em resultado da destruição ou degradação de ecossistemas para a construção de aglomerados urbanos e de infraestruturas, em particular quando em zonas protegidas, zonas húmidas, leitos de rios e orlas costeiras. 

Em Portugal, o "território artificializado", isto é, o solo que foi ocupado com novas urbanizações, indústrias, vias de comunicação e outras infraestruturas, aumentou cerca de 700 km2, só entre 1985 e 2000, uma área equivalente a quase nove vezes a do concelho de Lisboa. Entre 1990 e 2000 Portugal registou o desenvolvimento mais rápido do "muro mediterrânico" (a orla costeira da Europa, dominada pelo cimento e pelo betão). Após décadas de expansão das cidades em mancha de óleo e de urbanização avulsa, a ocupação de solos vê-se, de há uns anos para cá, reforçada com uma nova onda de projetos de duvidosa sustentabilidade: os resorts turísticos. De facto, este tipo de projeto imobiliário, baseado na construção muito dispersa de habitações de elevado impacto ambiental, com infraestruturas pesadas e profusão de equipamentos de lazer, implica um substancial acréscimo da "pegada ecológica". A oferta estimada de resorts com componente imobiliária, estimulada, no passado recente, pela atribuição da classificação PIN, está a afetar uma área próxima da acima referida, a expensas, em muitos casos, dos melhores terrenos da orla costeira e da reserva ecológica nacional. Perante o grande impacto da construção e do imobiliário sobre os ecossistemas e a paisagem, a alternativa natural que se oferece ao sector é a reabilitação do edificado e da infraestrutura já existentes, de modo a permitir melhorar o seu desempenho e prolongar a sua vida útil.

Esta alternativa permite caminhar para um regime de "construção zero", capaz de assegurar o congelamento da área artificializada, salvaguardando o património natural remanescente. Idealmente, o âmbito do sector imobiliário deverá restringir-se, de acordo com esta estratégia, ao aproveitamento de áreas já anteriormente construídas. A renaturalização de solo ocupado ou afetado por edifícios e infraestruturas, poderá vir a constituir uma nova e promissora atividade, integrada num futuro mercado de "direitos de construção".

Fonte: Expresso

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