23 junho 2012

Bolha imobiliária ameaça banca


A pesar de ser negado por governantes e instituições financeiras, Portugal está a sofrer os efeitos do fim de uma bolha imobiliária que mina a sustentabilidade de todo o sistema bancário.

O fim da 'febre do tijolo' está diariamente a arrastar para a falência construtoras e promotoras imobiliárias, a disparar o crédito malparado para níveis históricos, e a encher os balanços dos bancos com milhares de imóveis que não serão vendidos, ou que serão vendidos a uma fracção do preço.


O ‘buraco’ da bolha imobiliária não está reflectido nas contas da banca e poderá levar a uma nova vaga de capitalização do sistema se nada for feito, afirmam especialistas ao SOL.

A diferença do caso português face a outros mais conhecidos, como o espanhol ou irlandês, é que os preços da habitação nunca subiram ao ritmo destes países, o que tornou o fenómeno menos visível. «Os preços nunca aumentaram muito em Portugal porque a explosão da oferta foi acompanhada pela subida da procura devido à abundância de crédito barato», diz Paulo Soares Pinho, professor da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

A febre do crédito
Porém, avisa o docente especializado em banca, «este efeito não torna a bolha imobiliária portuguesa menos perigosa que as outras».

Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, o número de habitações em Portugal passou de 5,019 milhões em 2001 para 5,858 milhões, em 2011. Nestes dez anos, construíram-se mais de 800 mil novas casas quando a população residente subiu apenas 200 mil. Ou seja, por cada novo habitante foram criadas quatro novas habitações.

Portugal edificou na última década cerca de um quarto de todo o parque habitacional existente. A febre imobiliária contagiou bancos, autarquias, empresas e consumidores, tornando 74% dos portugueses donos de casa própria, uma das taxas mais elevadas da Europa.

A procura era sustentada pelo crédito bancário barato, rapidamente disponível e com taxas de financiamento até 100%.

Em 2010, com a chegada crise da dívida soberana na Zona Euro, a banca iniciou um processo de forte restrição ao crédito que fez ‘evaporar’ a procura e rebentar a bolha. Sem clientes, o excesso de oferta de habitação está patente na banca, nas construtoras e nas imobiliárias. Ninguém consegue comprar.

Anos para escoar a oferta
O presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), Luís Lima, diz que o mercado português tem hoje 360 mil casas por vender, 170 mil das quais por estrear. A oferta levará muitos anos a escoar. «Se houvesses crédito escoava-se em cinco anos», acrescenta Ricardo Gomes, presidente da Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e Serviços (AECOPS).

Desde 2010, o preço médio da habitação desceu cerca de 10% em Portugal. Mas nas periferias dos grandes centros urbanos como Lisboa e Porto, as quedas foram de 20%.

Sem clientes e crédito, o sector da construção e das imobiliárias entrou num ciclo de falências que está a encher o sistema bancário de crédito malparado. Hoje, mais de 40% do total de crédito vencido em Portugal é da responsabilidade de imobiliárias e construtoras. Os dois sectores têm dívidas de 38 mil milhões de euros à banca, dos quais 4,5 mil milhões são incobráveis. E Paulo Soares Pinho alerta que nem todas as perdas imobiliárias estão reflectidas nas contas dos bancos, e que ninguém está a levantar o problema: «Está a permitir-se que se criem nebulosas sobre a saúde da banca portuguesa».

Não repetir erros
O docente universitário espera que Portugal não cometa o mesmo erro de Espanha, que perdeu a credibilidade nos mercados por ter mentido e negado a existência de um problema imobiliário na banca. «O governo diz que temos a banca mais capitalizada na Europa, dentro de um ano poderá não ser assim», remata.

A APEMIP e a AECOPS esperam um agravamento do mercado nos próximos meses, com novos encerramentos de empresas. Pedem alternativas à banca. A entrega dos imóveis para venda ao mercado de arrendamento, o uso do fundo de capitalização da troika para provisionar perdas imobiliárias, e a criação de fundos de arrendamento são algumas das propostas.

O objectivo é retomar o crédito. «A economia já fez tudo pela banca, agora é a altura de a banca fazer algo pela economia», adianta Ricardo Gomes.

Fonte: SOL

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