26 outubro 2013

Lei do Arrendamento Urbano: Recuperar a confiança no mercado


Os vários governos que têm assumido as rédeas do País têm encarado a habitação como uma prioridade das suas políticas e estratégias para Portugal. O Governo de Passos Coelho não é exceção.
A atual conjuntura económica, financeira e social debilitada, a crise do mercado da construção e do imobiliário, o "bloqueio" ao crédito à habitação e a fraca oferta de imóveis para arrendar a preços acessíveis a todas as camadas sociais, além de o Troika assim o exigir, ditaram que era necessário uma reforma ao nível do arrendamento urbano. 

A maior bandeira desta reforma é atualizar as rendas anteriores a 1990 que tinham sido congeladas" e que eram apenas actualizadas consoante a inflação. Como resultado desse congelamento, os proprietários afirmavam que os rendas baixas não permitiam fazer obras domésticas ou de reabilitação e os inquilinos queixavam-se de viver em prédios a Ficar degradados e a necessitar de intervenções. 

No entanto, esta situação pode ter duas leituras. Do lado dos proprietários, o presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), Luís Menezes Leitão, confirma esta situação: "os pessoas que viram as suas rendas congeladas deixaram de arrendar porque perceberam que nunca mais recuperariam o valor dos imóveis". Todo este processo de congelamento de rendas resultou numa "taxa de arrendamento que no máximo ronda os 14% quando toda a Europa anda nos 40 e tal por cento", explica.

Aliás, avança que "neste momento os proprietários estão muito descapitalizados, e mesmo as atualizações que foram fixadas com base no rendimento dos inquilinos não darão, segundo as informações que temos, para fazer obras de imediato". Admitindo que em outros casos já possa haver alguma realização de obras em consequência dessas fixações. mas o mais importante é mesmo o facto de hoje ser "possível ver casas a arrendar, há uns anos isso era impossível, por isso esperamos que não se volte para trás nesta matéria". 

Do lodo dos inquilinos, esta realidade é refutada pelo presidente da Associação de Inquilinos Lisbonense (AIL), Romão Lavadinho, que afirma que as "casas com rendas congelados estão mais do que pagas e desde o década de 80 do século passado que os proprietários embolsam o dinheiro das rendas, escudando-se nas rendas baixas para não fazer obras". 

Esta afirmação tem por base uma análise que fez à situação do arrendamento na década de 60/70 do século XX, tendo verificado que "os casais que arrendavam as casas nessa altura tinham uma taxa de esforço que representava 50% ou mais do rendimento do agregado. O salário de um dos membros do casal era paro pagar a renda, mesmo no tempo dos rendas de 

Esta afirmação tem por base uma análise que fez à situação do arrendamento na década de 60/70 do século XX, tendo verificado que "os casais que arrendavam as casas nessa altura tinham uma taxo de esforço que representava 50% ou mais do rendimento do agregado. O salário de um dos membros do casal era para pagar a renda, mesmo no tempo das rendas de 1.100 escudos o salário de um dos membros não atingia isso e se atingia era o máximo. Hoje esse valor traduz-se numa renda de cerca de cinco euros que é pouco, mas os cálculos que fiz permitiram-me chegar à conclusão que, dos anos 60 até aos anos 80, o proprietário foi ressarcido da totalidade do valor do seu investimento com juros a 6%, ou seja, desde a década de 80, há 30 anos, que o proprietário tem o prédio pago e recebeu desde então valores o mais".

Não deixa de ser curioso que atualmente a taxa de esforço de um agregado familiar seja a mesma dessa altura, ou seja, na ordem dos 50%, com a agravante de que o custo devido hoje é muito mais elevado do que era naquela época. Independentemente da realidade dos proprietários ou dos inquilinos, no dia 14 de Agosto de 2012 foi publicada a Lei nu 31/2012 que procedeu à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano, o mesmo veio trazer várias e novas medidas que têm por objectivo dinamizar o mercado do arrendamento.

Balanço positivo ou talvez não 

Para já, a associação dos proprietários foz um "balanço positivo" da Lei do Arrendamento Urbano. Aliás, o feedback que tem obtido ao nível dos profissionais do imobiliário é que "esta lei teve mais feitos no mercado de arrendamento nos poucos meses em que está em vigor do que todas os outras leis em décadas". Acrescenta mesmo que "em termos de revitalização do mercado o impacto foi positivo", uma vez que "uma grande parte das rendas já está atualizada que significa um equilíbrio bastante grande neste caso". 

Na opinião de Luís Menezes Leitão, "foi a única reforma que, em termos de balanço dos dois anos deste Governo, foi feita a sério; ainda assim, talvez não tenha ido tão longe quanto poderio ter ido, mas foi uma reforma". 

Explica ainda que grande parte da aplicação da lei já foi feita, já que há muitos inquilinos a pagar as novas rendas e com os contratos transitados para o NRAU, por isso, mesmo que se façam alterações à lei, "não vemos como se poderá pôr em causa tudo o que a lei já produziu e que foi muito positivo no mercado, caso isso não acontecesse seria o recuperar da enorme desconfiança que durante muito tempo existiu no mercado de arrendamento". 

Se pela parte dos proprietários recuperaram a vontade de arrendar as suas casas, já pela parte dos inquilinos as dúvidas e os temores são muitos. Desde o entrada em vigor da lei que já passaram pela AIL mais de 40 mil pessoas, com uma média de 150 pessoas por dia, que solicitam apoio junto da associação.

A generalidade das pessoas não está informada e não sabe como a lei se aplica. Há várias questões que se colocam: umas vezes as pessoas não sabem que por terem carência económica podem reduzir o valor da renda, outras pelo facto de terem mais de 65 anos ou mais de 60% de incapacidade não se alteram os contratos de arrendamento. Para a associação dos proprietários "a lei prevê a situação das carências financeiras, embora a nosso ver, esse seja um princípio com o qual discordamos porque é colocar os proprietários o fazer segurança social". Já a associação dos inquilinos mostra-se preocupada, pois "há mais de 150 anos que não existia uma lei tão grave como esta, uma vez que o proprietário pode jogar com todas as condições que quiser e muito bem entender". Existe uma realidade que segundo Romão Lavadinho tem de ser denunciada: "dos censos de 2001 para os de 2011, em 10 anos, desapareceram cerca de 170 mil contratos de arrendamento anteriores a 1990, isto é, em 2001 existiam 420 mil contratos nestas condições, em 2011 passaram a existir 250 mil contratos. Isto significa que, dentro de 10/15 anos, estes contratos terão terminado porque essas pessoas desapareceram.

Despejo "forçado" 

Um dos pontos que tem gerado alguma polémica é o despejo. A lei prevê no caso de incumprimento no pagamento da renda o prazo de três meses para o despejo do inquilino.

Paro o presidente da associação dos proprietários o que se tem verificado "é que é muito mais difícil despejar um inquilino do que executar um imóvel a alguém que o comprou e isso, de facto, é um problema que nós temos e que tem sido uma dos grandes desconfianças do mercado de arrendamento". 

O presidente da associação dos inquilinos está de acordo em que "os incumprimentos sejam penalizados". Aliás, considera mesmo que se "o pessoa não paga a renda no caso de ser um vigarista, e existem muitos que andam de casa em casa não pagando e até destruindo o património da habitação, acho até que três meses é muito tempo para o despejo". A questão é social, referindo-se aos "arrendamentos anteriores a 1990 em que a esmagadora maioria das pessoas pago religiosamente a sua renda; aliás, segundo os dados a que tive acesso esse incumprimento cifra-se na ordem do um ou dois por cento". 

Por outros palavras, Romão Lavadinho evidencio que o "proprietário não pode ficar sem receber a sua renda, mas se a pessoa deixou de pagar a renda porque ficou desempregado ou porque as rendas são incomportáveis pelo vencimento ou reforma do agregado, então nestes casos o Estado tem de ajudar". Uma solução que avança é a do Estada ou os municípios pagarem a renda até o agregado resolver a sua situação ou então colocando-o numa propriedade pública.

Este interlocutor salienta ainda uma outra realidade compreendida na lei: o período de transição de cinco anos, data a partir da qual o mercado de arrendamento já estará em curso. Ora, "uma das mentiras da ministra Assunção Cristas é que não há despejos, daqui por cinco anos vai haver com certeza porque a partir dessa altura os proprietários vão poder pedir a renda que bem entenderem e os inquilinos não terão rendimentos para cobrir essas rendas, se já agora não têm quanto mais daqui a cinco anos". 

A ministra Assunção Cristas colocou a hipótese de daqui a cinco anos o Governo dar subsídios aos mais carenciados. "Além de se correr o risco desses subsídios não saírem do papel, a Segurança Social hoje já tem dificuldades, por isso, como é que daqui a cinco anos vai garantir ajuda a essas pessoas? Isto é uma aldrabice pegada. A senhora ministro é católica e é uma pena que esteja a cometer todos estes pecados".

Futuro incerto 

Para o presidente da associação dos proprietários é manifesto que "com as actuais verificações, estando resolvidos dois problemas essenciais - alteração das rendas antigos (embora parcialmente) e ser recuperada a confiança no funcionamento dos despejos - estamos convencidos que o mercado de arrendamento irá passar para os valores da Europa". Até porque, como Luís Meneses Leitão salienta, "o mercado de compra de casa está completamente bloqueado com as elevadíssimas taxas de juro que os bancos cobram e em que não há perspetiva de virem a baixar, se não for através do arrendamento não estamos o ver como é que vai ser assegurada a necessidade social de habitação que as pessoas têm".

Para o presidente da associação dos inquilinos esta "é uma lei dos despejos porque veio colocar em causa a estabilidade das famílias", pelo que não vê com bons olhos a aplicação desta lei. Ainda assim, Romão Lavadinho diz que "não vamos baixar os braços", pelo que "temos tido reuniões com os partidos da Assembleia da República, solicitámos um encontro com o Presidente da República e com o Primeiro-Ministro, mas ainda não obtivemos resposta, no sentido de propor alterações a esta lei". É que, na sua opinião, "senão existirem estas alterações vamos assistir a muitos agregados a ficarem na rua" e "a nossa Constituição obriga a que todas as pessoas tenham uma habitação condigna paro viver de acordo com o seu rendimento".

Fonte: Revista Magazine Imobiliário

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